Num resquício do chame de outrora, a bandeira da operação Lava-Jato (maior ação anticorrupção já feita no país) levou à eleição de dois de seus protagonistas, o ex-juiz Sergio Moro e o ex-procurador da República Deltan Dallagnol. O ex-magistrado foi eleito senador no Paraná, pelo União Brasil. O ex-integrante célebre do Ministério Público Federal se consagrou como mais votado para deputado federal em território paranaense, pelo Podemos.
É bom lembrar que a Lava-Jato nasceu no Paraná e teve como estrelas justamente Moro e Dallagnol. Natural que fossem lembrados pelos paranaenses. Feita a ressalva, é importante notar que o lava-jatismo não chegou nem perto do apelo de quatro anos atrás. Ilustres representantes desta corrente ideológica, que chegou a ser chamada de "novo udenismo" (em referência à bandeira moralista e contra a corrupção do extinto partido UDN), não foram eleitos em 2022.
É o caso de Álvaro Dias, um dos fundadores do Podemos, ex-governador do Paraná. Ardoroso defensor da Lava-Jato, ele foi um dos impulsionadores do ingresso de Sergio Moro na política. Tanto no apoio a que ele se tornasse ministro de Bolsonaro, como no estímulo a que tentasse um cargo eleitoral. Pois Moro gostou da ideia e decidiu concorrer ao Senado. Como teve a candidatura barrada em São Paulo por não residir naquele Estado, apostou na memória dos paranaenses a respeito dos seus feitos contra a corrupção. Acabou por enfrentar e derrotar o padrinho, Álvaro Dias.
No Rio Grande do Sul, outro prócer do Podemos e propagandista da Lava-Jato, o senador Lasier Martins, não conseguiu se eleger em 2022. A ideia inicial era continuar no Senado, mas o congestionamento de candidaturas para este cargo (Mourão, Ana Amélia, Olívio Dutra) levou Lasier a optar pela candidatura a deputado federal. Não se elegeu.
Em São Paulo, a deputada federal Joice Hasselmann perdeu o apelo e a cadeira que ocupava na Câmara Federal. Em 2018 ela se elegeu na esteira da Lava-Jato, com 1,07 milhão de votos. Em 2022 recebeu apenas 13 mil votos, perda de 99% da votação.
A deputada estadual paulista Janaína Paschoal (PRTB-SP), fã de carteirinha da Lava-Jato e uma das responsáveis pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT), saiu de 2 milhões de votos quatro anos atrás para apenas 447 mil votos agora. E também ficará sem mandato parlamentar.
Por que isso aconteceu? Três são os principais fatores. Um deles é a onda de denúncias contra a parcialidade de juízes na Lava-Jato, que combinariam com procuradores e policiais as ações e até o melhor momento para as prisões serem feitas. Isso foi revelado pelo site The Intercept a partir de conversas por aplicativos de mensagens de Moro, Dallagnol e outros integrantes da força-tarefa contra a corrupção, interceptadas e vazadas por um hacker.
Outro fator é que não apenas os votos na Lava-Jato diminuíram de intensidade: é a própria operação que definha, mesmo tendo recuperado R$ 8 bilhões em acordos de ressarcimento e multas a envolvidos em corrupção. Incomodada com o que considerou hipertrofia dos procuradores da operação, a Procuradoria-Geral da República optou por incorporar as forças-tarefas lava-jatistas aos Grupos de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) nos Estados. Com isso, apagou a marca Lava-Jato.
Em terceiro lugar, alguns defensores da Lava-Jato romperam com o bolsonarismo, especialmente após a demissão de Sergio Moro do Ministério da Justiça e sua ruptura com Jair Bolsonaro. É o caso de Joice Hasselmann e, de certa forma, de Janaína (que não rompeu com o presidente, mas sempre foi crítica do que chamava "fanatismo bolsonarista"). Ambas acabaram abandonadas pelos eleitores, muitos dos quais preferiram o bolsonarismo ortodoxo. O curioso é que isso não se aplica a Moro. Talvez porque o Paraná foi o bastião do lava-jatismo e o efeito residual da operação perdure por lá.