A jornalista Bruna Oliveira colabora com a colunista Gisele Loeblein, titular deste espaço.

A sucessão de eventos climáticos cada mais severos expõe a agricultura a um risco que vai muito além da perda de produção e da infraestrutura rural, mas de uma desvalorização sem precedentes do valor da terra. A devastação dos solos pela enchente, já estimada em R$ 6 bilhões em estudos, representa também a perda do principal ativo da atividade agrícola.
Numa analogia à indústria, o pesquisador do Departamento de Economia e Estatística da Secretaria de Planejamento, Governança e Gestão (DEE/SPGG), Rodrigo Feix, lembra que, na agricultura, é a partir do solo que se faz a reprodução de capital. Quando "se perde" essas terras, perde-se também a capacidade de investimento e a garantia de produtividade.
As terras onde há recorrência de catástrofes são as mais suscetíveis à desvalorização. Neste sentido, a região dos Vales, afetada por mais de um episódio climático em menos de um ano, acaba sendo uma das mais penalizadas. O impacto disso é na cadeia como um todo, já que parte importante da base econômica urbana da região também está atrelada à agropecuária e para além da produção de grãos.
Para o pesquisador, os eventos recentes reforçam uma característica já presente na agricultura gaúcha, que é uma alta exposição ao risco. O preço da terra no Rio Grande do Sul é historicamente mais elevado do que em áreas de novas fronteiras agrícolas ainda não consolidadas, onde os solos são menos maduros para a produção. Em contrapartida, há uma exposição ao risco muito maior, que já estava associada às estiagens, e que agora se intensifica com as enchentes.
— Quando a produção está mais suscetível a riscos climáticos, isso afeta a rentabilidade esperada nesta área. E a incerteza afeta as decisões de investimentos. Numa equação, isso precisa ser ajustado, e um dos reflexos é o custo da terra — diz Feix.
O risco da atividade, somado à descapitalização dos produtores, tende a acelerar um processo já em curso na agricultura e demonstrado nos censos agropecuários. Muitos segmentos que já vinham trabalhando com taxas muito baixas de retorno tendem a acentuar o abandono das atividades. O cenário, reforça Feix, é extremamente desafiador para produção rural:
— As grandes oscilações dificultam a gestão e a sustentabilidade dos negócios. Agora, temos uma destruição de capital que abala a capacidade de produção para os ciclos seguintes. Mesmo tomando a decisão de se recompor ao longo do tempo, o produtor permanece suscetível à repetição destes eventos.