
Vexame não é uma palavra qualquer. É aquela que a gente guarda pra quando a vergonha já não cabe no protocolo.
Depois de duas semanas em cima do muro, o deputado Pedro Lucas, do União Brasil, rejeitou oficialmente o convite do presidente Lula para assumir o Ministério das Comunicações. Não por convicção ou por incompatibilidade de ideias, mas porque os caciques do seu partido decidiram que, neste momento, é mais vantajoso manter o deputado na liderança da bancada. Em outras palavras: o governo ofereceu o ministério e levou um não.
Seria só mais um capítulo da dança democrática se não deixasse exposto o óbvio ululante que muitos fingem não ver: o União Brasil já não faz parte do governo. Continua ocupando cargos, sim, mas por inércia e por interesse. A prova disso veio escancarada na votação da urgência do projeto da anistia, apoiada pela imensa maioria dos deputados do partido, entregando o governo à própria sorte. Quando nem Davi Alcolumbre consegue segurar a tropa, é sinal de que o castelo está ruindo por dentro.
Ontem eu disse, aqui mesmo neste espaço, que a reforma ministerial de Lula era feita na base do desespero. Hoje, é possível dizer que ela fracassou antes de começar. Nem a saída de um ministro atolado em denúncias de corrupção conseguiu melhorar a relação com a base. Porque não há base, há um balcão. E nele, cada voto tem preço, validade e método de pagamento.
A moeda da vez são as emendas parlamentares — o único elo de fidelidade que ainda se sustenta em Brasília. De acordo com as projeções do próprio governo, em 2027 elas devem consumir quase 50% de todo o orçamento discricionário da União. Cinquenta e seis bilhões de reais. E se o ritmo continuar, em 2028, esse número deve chegar a 58 bilhões, comprometendo todo o espaço fiscal do Estado brasileiro. A falência, nesse caso, é dupla: econômica e moral.
É claro que vão dizer que é exagero, que o sistema funciona, que faz parte do jogo. Mas o que o brasileiro está vendo, em tempo real, é a corrosão da democracia — aquela que usam como recurso para justificar absurdos. A Câmara virou um leilão. O Senado, uma federação de feudos. E o Executivo, um mero gerente de repasses. O povo que se lasque.
No fim das contas, o vexame não foi de Pedro Lucas, nem do União Brasi, nem do governo. Foi da política como ela tem sido feita. Quando tudo vira moeda, até a democracia pode ser negociada e se tornar só mais uma moeda no caixa dois da governabilidade.