Gaúcho de Erechim, 67 anos, Paulo César Carpegiani fez história no Inter como jogador, nos anos 1970, quando dividia com Falcão e Figueroa o estrelato de um time lendário. Pela Seleção, foi titular na Copa de 1974 em um meio-campo que tinha ainda Rivellino e Paulo César Caju.
No Flamengo, logo na estreia como treinador, após se aposentar na Gávea, mexeu peças do time herdado de Dino Sani. Tirou Andrade da reserva, reabilitou Adílio, que treinava em separado, trocou Baroninho por Lico, acomodou Tita e Zico juntos e, assim, pariu uma equipe que, nos anos 80, ganhou a América e o mundo jogando o fino da Bossa, como diriam os antigos. Comandou o Paraguai na Copa da França, em 1998. De volta ao Brasil, passou por muitos clubes.
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À certa altura, sua carreira perdeu fôlego. Deu um tempo em 2013, na Ponte Preta. Quando todos supunham aposentadoria, ele volta para retirar o Coritiba do Z-4 após seis jogos sem derrota no Brasileirão e passar à fase internacional da Sul-Americana, onde enfrentará o vencedor de Estudiantes e Belgrano. Falamos por telefone, após o jogo da Seleção.
Qual a sua opinião sobre a estreia de Tite, contra o Equador?
Gostei muito. Vi a Seleção bem posicionada, com o Casemiro entre as linhas preenchendo espaços. Futebol é recomposição de linhas. É nessa hora, a de recompor, que você percebe se um time é bem treinado.
Não é cedo demais para ver a mão do técnico?
Não. E te provo. Em Eliminatórias, não há tempo para nada. Lidei com essa realidade durante três anos, na seleção do Paraguai. Os prazos são curtos. Os jogadores chegam cansados da viagem, nunca ao mesmo tempo, pois quase todos atuam na Europa. Trazem esta ou aquela questão a resolver, pelo acúmulo de jogos. É raro dar um treino forte, como fazemos no clube. Resta se comunicar. Orientar. Posicionar, deixando bem claro o que cada um tem de fazer e como isso resultará em um coletivo forte. Dá para fazer, desde que você tenha clareza e convicção no que pretende. Essas qualidades o Tite têm de sobra. O diferencial, no Equador, foi o Tite.
Você concorda que a nossa geração é fraca?
Onde estão nossos jogadores? Nos maiores clubes do mundo. Tem uma garotada incrível. A velocidade do Gabriel Jesus é espantosa. Não foi à toa que Guardiola foi atrás dele. Philippe Coutinho é craque. Deste, sou fã. Digo com todas as letras: craque. Nem falo de Neymar, mas tem Marcelo, Miranda, Marquinhos. São todos excelentes. Temos apenas de colocar este material humano numa ideia coletiva.
Por que tanto tempo fora de circulação?
Tive convites, mas nenhum que me seduzisse. Quase fui para a China. E a seleção paraguaia, de novo. Fiquei em Capão da Canoa, com minha mulher querendo que eu nunca mais treinasse e os filhos dizendo o contrário (risos). Tem um episódio engraçado sobre isso. Uma vez, lá atrás, eu estava fechado com o Catar. Quando minha mulher soube, ameaçou com separação. Liguei para o empresário e disse: "Dá um jeito de desfazer tudo senão perco a mulher!". Depois de levar 2 a 0 do Cruzeiro em Campinas, com a Ponte, um diretor foi ao vestiário e disse que não tinha problema perder para um clube grande, que estava tudo certo, normal. Um pensamento pequeno, sabe? Aí resolvi dar um tempo. Voltei quando a vontade de trabalhar falou mais alto.
Há quem o veja como temperamental. Verdade ou lenda?
Tenho de admitir: sim, sou temperamental. Se eu não gosto, não gosto. Acho até que isso, às vezes, me atrapalha. Mas é o meu jeito. Agora você está mais calmo, então, depois de tanto tempo em casa? Digamos que a saudade do campo me acalmou (risos).
E o Inter? A Série B é uma chance real?
Grandes clubes têm fases boas e ruins, isso é normal. O elenco tem qualidade de sobra para escapar. O Celso é experiente e competente. O Inter não cai. Não será rebaixado.Você ainda se sente colorado? Quando o menino aquele que morreu (Maicon Librelato) fez o segundo gol no Paysandu, em 2002, eu chorei. Meus filhos tiram onda até hoje: "Pô, pai, tanto tempo no futebol, chorar?" Mas é uma vida. Tudo o que aconteceu comigo tem a ver com o Inter.
Você passou décadas nem ser cogitado no Beira-Rio apesar do sucesso como técnico. Por que?
Tive um problema com Dallegrave (Arthur Dallegrave, ex-dirigente, que morreu em 2008), um homem importante no clube. Quando fui para o Flamengo como jogador, em 1977, o Inter me devia. Falaram que eu estava bichado, pelo problema de menisco do ano anterior. Tive de cobrar na Justiça e ganhei. Na minha primeira passagem como técnico (em 1985; a outra foi em 1989), o presidente era Roberto Borba. Certo dia, dormi no cargo e acordei desempregado. Dallegrave assumiu como diretor e me demitiu. Mas isso já passou. Coisas do futebol.
O que o decepciona no futebol?
O jogador brasileiro ainda é mimado. Segue achando que pode decidir sozinho quando quiser. Vem da base assim, com estafe de empresários ao redor. Você vê jogos da Europa e parece outro esporte. Lá, velocidade. Aqui, lentidão. Lá, ocupação. Aqui, espaço vazio. Mas estamos melhorando nisso. Sobre dirigentes: a maioria dos clubes contrata sem critério. Não tem uma pessoa estável, profissional, que possa ser responsabilizada por acertos e erros, capaz de discutir e até dizer não a uma indicação do treinador.
E o jogo de quarta, com o Grêmio?
Duro, pois o Roger deu um padrão ao Grêmio. O clube teve o mérito de lhe dar tempo para atingir este estágio. Tenho jogadores voltando. Desde minha estreia no Coritiba, será a vez na qual poderei escalar a equipe que imagino como a mais segura e equilibrada. Em casa, estamos cada vez mais fortes.
Qual é o melhor time brasileiro?
O Santos. Disse isso ao Dorival Júnior quando fui abraçá-lo depois de vencê-lo no Couto Pereira. Ele estava ''p'' da vida e disse: "Não é, não!" (risos). Mas eu voto no Santos.
Pretende levar a vida de técnico até quando?
Nunca fiz planos. Assinei até o fim do ano. Já fui procurado para renovar, mas vamos ver mais adiante.
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