Em março do ano passado, o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, ordenou a abertura de um inquérito para investigar notícias falsas que reverberavam ameaças contra ministros da Corte. Passados 14 meses, o inquérito avançou com poucas reações contrárias.
A ex-procuradora-geral da República, Raquel Dodge, se opôs por questões técnicas. Setores políticos ficaram sobressaltados. O meio jurídico debateu o papel do STF. E pronto.
Eis que nessa semana o relator, ministro Alexandre de Moraes, autoriza a busca e apreensão contra 29 alvos suspeitos de produzir, divulgar e financiar uma rede de fakenews usada para difamar, caluniar e ameaçar de morte ministros da STF e familiares. Entre os alvos, blogueiros amigos do Planalto, empresários e até um descendente da família real portuguesa - todos amigos do rei.
É curiosa a linha de defesa da turma: evocam a liberdade de expressão para justificar suas atividades. Curioso porque, entre eles, estão ardosos defensores do AI-5 e da ditadura militar, que solaparam a liberdade de expressão no Brasil.
Esse filme é conhecido, vivemos coisa semelhante com a Lava-Jato. No início, a operação era um exemplo de combate à corrupção. Quando chegou no MDB de Eduardo Cunha e no PT de Lula, tudo mudou. O inquérito sobre fake news só virou uma "aberração jurídica contra a liberdade de expressão" porque chegou em figuras que gravitam em torno do poder.
É preciso olhar o resultado das investigações para entender a importância delas. Até agora, o STF enviou à primeira instância do Judiciário 72 investigações que vão avançar sobre os responsáveis. Entre elas, estão ameaças de morte diretas a um ministro e ao irmão dele. O mesmo suspeito foi apontado como responsável por promover postagem sugerindo que o plenário do STF fosse incendiado. Há outros indícios de ameaças de emboscadas a ministros.
Isso nada tem a ver com liberdade de expressão. Isso é, sim, crime!
Cabe uma discussão sobre a origem do inquérito. A instauração de ofício pelo presidente do STF encontra pouco respaldo na doutrina jurídica posterior à Constituição de 88, que entende que a investigação deve partir da polícia ou do Ministério Público. O tema divide até mesmo o meio jurídico mais qualificado. Mas se valer deste debate para acusar o STF de atentar contra a liberdade de expressão é uma aberração.