Despedida é o "ato de concluir, de finalizar algo”, segundo o Dicionário Michaelis. E esta quinta-feira (26) marca o término da carreira de um dos maiores nomes da história do esporte brasileiro e da maior atleta, entre homens e mulheres, nascida no Rio Grande do Sul. Aos 33 anos, com três títulos mundiais e três bronzes olímpicos, a judoca Mayra Aguiar decidiu pendurar o quimono.
Quase imbatível nos tatames, Mayra foi vencida pelo corpo. As dores, as oito cirurgias realizadas ao longo da carreira de mais de duas décadas dedicadas ao esporte e o cansaço mental foram decisivos nesta decisão.
Particularmente, tenho um carinho por Mayra e pelo judô gaúcho. De quimono, ela, João Derly e tantos outros carregaram e carregam nossas cores mundo afora e nos enchem de orgulho. Depois do futebol, não há dúvida que o esporte que mais levou o nome do nosso Estado além fronteiras, foi o criado em 1882, por Jigoro Kano.
Judô e Rio Grande do Sul se confundem. E pude sentir isso nos últimos 17 anos, quando tive a felicidade de acompanhar de perto cinco edições de Jogos Olímpicos e Pan-Americanos. Logo na minha estreia, no Rio em 2007, que fui apresentado a uma adolescente que ainda não tinha completado seus 16 anos.
Ao me apresentar à atleta de talento e precocidade enormes, fui alertado pelo técnico Antônio Carlos Pereira de que “estava diante de uma futura campeã mundial e medalhista olímpica”. As palavras de Kiko ficaram guardadas e sempre lembro delas ao falar de Mayra.
Curiosamente a trajetória daquela menina que se transformou em uma mulher admirada e temida nos tatames se confunde com a minha. Tive o privilégio de narrar seus três pódios olímpicos pelo microfone da Rádio Gaúcha, o que a fez declarar que era “seu amuleto”, após a conquista nos Jogos de Tóquio.
Claro que não tive sequer 0,001% de participação nessas conquistas e tantas outras. Mas Jigoro Kano ao criar o judô desenvolveu oito princípios básicos relacionados com boas ações dos indivíduos: cortesia, coragem, honestidade, honra, modéstia, respeito, autocontrole e amizade. E foram eles que pude ver em Mayra ao longo desses 17 anos de carreira na seleção brasileira.
"É trilegal, né?"
Na Olimpíada de Tóquio, pude presenciar Mayra ser aplaudida de pé pelas três outras medalhistas de sua categoria, dando a noção de seu gigantismo na história da modalidade.
Em 2022, ao conquistar seu terceiro título mundial, a gaúcha participou da cerimônia de medalhas e da entrevista oficial do evento e mais uma vez deu mostras das razões que a fizeram ser uma campeã admirada. Sem obrigação alguma concedeu sua primeira entrevista exclusiva, por telefone para a Rádio Gaúcha. E ao ouvir minha voz disse: “É trilegal né?”. Sim, foi e é trilegal saber que um dos maiores nomes do esporte olímpico nasceu aqui e sempre esteve entre nós durante todos esses anos.
As lesões, as incertezas, as dores são fatores que precisam ser superados pelo atleta de alto rendimento a cada segundo de suas vidas. É um preço alto e que poucos estão dispostos a pagar. Apenas os verdadeiros campeões conseguem.
Foi dessa forma que Mayra Aguiar esteve em sua última Olimpíada em Paris. O resultado não foi o desejado, mas quem sabe o esperado. Mas nada disso apaga a trajetória da atleta que sempre defendeu as cores da Sogipa.
Lembro que foi uma zona mista emotiva e que as suas palavras saíram em meio a lágrimas, assim como o abraço antes da primeira pergunta e depois a conversa com a equipe da RBS, já do lado de fora da Arena do Campo de Marte, com a Torre Eiffel ao fundo. Era uma despedida da atleta, da Dama de Ferro do esporte brasileiro.
Muito obrigado por tudo que você fez pelo esporte e pelo Rio Grande do Sul, Mayra. E saiba que a nossa torcida por você seguirá.