É a partir do município de Barracão, na divisa com Santa Catarina, que o trecho gaúcho da BR-470 inicia o traçado pelo Estado. São cerca de 470 quilômetros até chegar à cidade de Camaquã, na região sul. Ao passar pela Serra, a rodovia possibilita a interligação de municípios responsáveis por grande parte da produção industrial e agrícola da região. E é justamente este segmento que concentra o maior número de problemas. No trecho de 97 quilômetros entre Nova Prata e Carlos Barbosa, o mais movimentado da BR-470, o motorista precisa enfrentar buracos, falta de sinalização, pista simples, sinuosa e sem acostamentos, além do alto fluxo de caminhões.
A Serra das Antas é um dos trechos que mais exige cuidados. No ponto há curvas fechadas e onde há terceira faixa, ela está quase intransitável devido aos buracos. A sinalização, que seria fundamental para a segurança dos motoristas, praticamente não existe. Faltam até placas informando o quilômetro na maior parte do trecho. Uma proposta de usar uma estrada secundária para um sentido e o atual traçado para outro já foi apresentada, mas até agora não foi avaliada.
Segundo a professora Magda Medianeira Reginato Bassanesi, que há 15 anos estuda logística e processos produtivos, condições assim não permitem um escoamento adequado da produção e ainda aumentam o risco de acidentes.
"Há perdas de produtividade, tanto logística quanto de preços, custos mais elevados. Existem também algumas perdas que impactam as empresas mas muitas vezes não são contabilizadas, que são as próprias vidas de funcionários, em risco numa situação dessas, de estrada mal conservada", avalia.
Na localidade de Barreto, em Lagoa Vermelha, o asfalto que começa em Barracão e segue para o sul do Estado dá lugar a uma viela sem pavimentação. A situação se mantém por cerca de 50 quilômetros, até André da Rocha.
Segundo o prefeito, Idair Bedin, o trecho costuma ter condições tão ruins que até o transporte escolar ficou prejudicado. A situação só melhorou após os municípios cortados por esse segmento se unirem para realizar melhorias, como roçada e acascalhamento. Ainda assim, em dias de chuva, a alternativa para caminhões é percorrer estradas municipais de cidades vizinhas, percurso que aumenta a distância em 90 quilômetros.
Quem consegue ir adiante, ainda encontra outros problemas até chegar em Nova Prata. O principal fica no limite dos dois municípios. Depois de percorrer uma estrada pavimentada, mas praticamente sem sinalização, o motorista depara com o Rio da Prata cruzando a rodovia. A placa indica a existência de uma ponte, mas ela nunca saiu do papel, apesar do projeto pronto. A travessia ocorre em uma estrada de chão ao lado, por meio de uma ponte de ferro e madeira. Quem costuma trafegar com frequência pelo trecho, como o mecânico Sérgio Fernando Popic, alerta:
"Se vem um carro aqui, oca ra que não conhece, sem sinalização, sem nada, vai direto aí para o meio. Não tem saída. O cara que não conhece é perigoso, se não andar cauteloso, prestar atenção, passa direto", avisa.
Para criar as condições ideais de desenvolvimento, seria necessário resolver ainda outros pontos críticos. O principal deles é a duplicação entre Bento Gonçalves e Carlos Carlos Barbosa, por onde passam cerca de 23 mil veículos por dia, boa parte caminhões. É neste trecho que fica o Trevo da Telasul, no entroncamento com a RS-453.
Os congestionamentos em horários de pico comprovam que a desenho antigo do cruzamento atualmente só contribuem para aumentar o prejuízo e o risco de acidentes. Por enquanto, a única esperança é a da construção de uma rotatória, que não resolveria o problema definitivamente. Não bastasse isso, a ponte sobre o Rio das Antas, apresenta problemas devido à ação do tempo. Engenheiros dizem que não há necessidade de interdição, mas são necessários reparos.
Para o presidente da Associação dos Municípios da Encosta Superior do Nordeste (Amesne) e prefeito de Carlos Barbosa, Fernando Xavier da Silva, a BR-470 não é uma estrada destinada apenas ao desenvolvimento local.
"A BR-470 deixa de ser uma questão meramente da nossa Encosta Superior do Nordeste, da Amesne, da região ligada à Bento Gonçalves, e interfere também na região de Caxias, de Farroupilha. Tudo isso usa a BR-470 para escoamento", destaca.
A BR-470 não se concentra apenas no Rio Grande do Sul. No trecho catarinense, a rodovia sai de Barracão em direção ao Litoral, terminando no município de Navegantes. Caso a estrada estivesse concluída, permitiria o acesso quase direto da Serra com dois importantes portos do país: o de Rio Grande e o de Itajaí. Mas além do segmento de André da Rocha, há outros trechos inconclusos, entre a BR-290 e Camaquã. A falta de uma ponte sobre o Rio Jacuí, por exemplo, é um dos gargalos que impedem a ligação.
Para escoar a produção tanto para o norte, quanto para o sul, a alternativa acaba sendo estradas também já saturadas e em trechos urbanizados, como Caxias do Sul e a Região Metropolitana de Porto Alegre. Para o presidente da Associação das Entidades Representativas da Classe Empresarial da Serra, o CICS Serra, Edson Morello, os municípios que dependem da BR-470 estão ilhados, já que nenhuma estrada que poderia ser alternativa é totalmente pavimentada.
"Uma empresa de Bento Gonçalves que precisa da BR-470 para ir em direção ao centro do país, ou ela faz pela BR-116, com todas as dificuldades que tem, mais da ligação da RS-453 até Caxias do Sul, a RS-122, ou faz por Nova Prata utilizando a BR-470 de Bento a Veranópolis nas piores condições que uma rodovia pode apresentar, hoje extremamente desfavoráveis a qualquer tipo de tráfego, e fazer 200 quilômetros a mais para chegar a Curitiba. É inadmissível uma situação dessas", reclama.
*Colaboraram Cristiane Barcelos (Jornal Pioneiro) e Jean Prado (RBSTV)
Gaúcha
BR-470: Falta de estrutura impede ligações logísticas estratégicas
Última série de reportagens do projeto Serra Imobilizada mostra como as condições da BR-470 prejudicam o desenvolvimento. Veja a primeira reportagem
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