
A inteligência artificial (IA) vem evoluindo a passos largos: a todo momento, as empresas de tecnologia anunciam novas ferramentas para superar a concorrência.
Somente em 2025, foram lançadas novidades como a plataforma chinesa DeepSeek, o Grok 3 (da xAI, de Elon Musk) e atualizações no ChatGPT (da OpenAI), que ganhou recursos para facilitar edição de imagens e gerar gráficos.
Por trás dessa crescente competição, estão big techs que investem em centros de dados robustos para alimentar modelos de IA sofisticados. Pesquisadores da área destacam que as mudanças estão ocorrendo cada vez mais rápido, a ponto de todas as principais ferramentas terem se tornado igualmente poderosas.
— Todos os modelos têm um desempenho semelhante. Por isso, falamos em uma espécie de "commoditização" da IA. Todas as plataformas estão no mesmo patamar, em termos de eficiência, como se fossem commodities (bens ou serviços padronizados) — explica Diogo Cortiz, professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), especialista em IA.
Quatro bilhões de acessos mensais em site de IA
Os serviços de tecnologia vêm ganhando mais adeptos a cada dia. O ChatGPT contabiliza cerca de 4 bilhões de acessos mensais, enquanto o Gemini, da Google, registra 275 milhões.

Conforme o professor do Insper e consultor em IA Pedro Burgos, o ChatGPT segue sendo a ferramenta mais popular, mas outras vêm ganhando destaque na corrida.
— Em termos de concorrência, o mais bem posicionado é o Gemini, em parte porque a Google investe muito nisso. Tecnicamente, o Gemini tem bons modelos funcionando. O último lançamento, o Gemini 2.5 Pro, é mais avançado que o melhor modelo da OpenAI — avalia o professor.
De acordo com Burgos, o sistema da Google tem maior capacidade de raciocínio. Com isso, é mais eficiente para resolver problemas matemáticos, por exemplo. No entanto, ele ressalta que as mudanças acontecem semanalmente, e outro programa pode ultrapassar esse modelo em breve.
As plataformas também estão apostando em funcionalidades gratuitas para conquistar mais usuários. O Grok era exclusivo para assinantes do X (antigo Twitter), mas agora qualquer um pode utilizar a ferramenta. Todas possuem funções mais sofisticadas que são exclusivas para usuários pagantes, mas há outras disponíveis gratuitamente.
Testando as ferramentas de inteligência artificial
Para avaliar os aplicativos de IA, a reportagem aplicou dois testes nas quatro principais ferramentas: ChatGPT, Gemini, Grok e DeepSeek.
Geração de imagens
Primeiro, foi solicitado o seguinte prompt: "Gere uma imagem de uma família de gaúchos tomando chimarrão na orla do Guaíba, em Porto Alegre (Rio Grande do Sul)".
Os resultados estão nesta galeria de imagens:
- ChatGPT: foi a ferramenta mais demorada, levando cerca de três minutos para gerar o resultado. A imagem mostra um homem, uma mulher e duas crianças usando trajes tradicionais e tomando chimarrão
- Gemini: gerou a imagem em poucos segundos. Mostra dois homens, uma mulher e duas crianças usando trajes tradicionais e tomando chimarrão
- Grok: a plataforma gerou duas imagens em poucos segundos. Em uma delas, aparece um grupo de pessoas com quatro adultos e três crianças sentadas em uma roda. Por baixo dos ponchos, usam camisas sociais. A outra imagem mostra quatro homens de poncho tomando chimarrão
- DeepSeek: na primeira tentativa, apresentou uma imagem com erro, que não foi exibida. Em outras duas tentativas, o app informou que não pode gerar imagens diretamente, somente descrições
Criação de roteiro de viagem
No segundo teste das IAs, foi submetido o seguinte prompt: "Crie um roteiro de viagem de fim de semana na serra do Rio Grande do Sul para um casal, saindo de carro de Porto Alegre na manhã de sábado e retornando a Porto Alegre na tarde de domingo. Inclua informações sobre estradas, hospedagens e programas para fazer". Os resultados foram os seguintes:
- ChatGPT: traz resultados completos, com sugestões de passeios, horários de chegada/saída, indicações de restaurante e pontos turísticos. Não traz detalhes sobre valores
- Gemini: foi o resultado mais sintético, com pouco detalhamento. O roteiro traz sugestões de atividades, horários de chegada/saída, indicações de restaurante e pontos turísticos. Não traz detalhes sobre valores
- Grok: trouxe os resultados mais detalhados, com riqueza de informações. O roteiro inclui valores de pedágios, alimentação e hospedagens, dicas de restaurantes e passeios, bem como informações sobre as estradas para garantir a segurança na viagem
- DeepSeek: trouxe um roteiro sintético, mas completo. Apresenta uma estimativa de orçamento total da viagem, dicas de pontos turísticos e restaurantes e um itinerário organizado
Corrida pela inovação
Para superar as adversárias, as empresas estão incrementando suas plataformas com mais funcionalidades, buscando o primeiro lugar em todas as frentes.
Até pouco tempo atrás, o ChatGPT não era a melhor ferramenta para gerar imagens, por exemplo, e essa função era exclusiva para pagantes até a semana passada. Com a última atualização do GPT-4 em março, a plataforma ganhou recursos que fortaleceram essa funcionalidade, e passou a estar disponível de forma gratuita.
Na nova versão, o chatbot consegue gerar imagens mais fidedignas e criar artes com diferentes traços, como demonstrou a brincadeira inspirada no universo do Studio Ghibli que mobilizou milhares de pessoas.
Isso foi possível por meio de um modelo multimodal nativo, conforme anunciou a OpenAI. Um sistema multimodal consegue processar informações em diferentes formatos, incluindo textos, imagens, vídeos e áudios. Com essas diferentes fontes de informação, a IA é capaz de analisar cenários mais complexos, oferecendo soluções mais ricas.
Segundo o consultor em IA Pedro Burgos, os modelos multimodais estão garantindo avanços consideráveis na IA, bem como modelos reflexivos. Os modelos reflexivos não somente geram respostas, mas também criticam e refinam suas saídas, identificando falhas e buscando melhorias até alcançar um resultado melhor. Isso possibilita que as plataformas se tornem mais autônomas, sem depender de feedback externo.
Busca profunda
Outra novidade marcante em 2025 foi o lançamento da modalidade "busca profunda" em apps como ChatGPT e Gemini, que batizaram a função de Deep Research. O recurso é semelhante ao DeepThink do DeepSeek, que gerou repercussão quando lançado. Trata-se de uma funcionalidade com raciocínio aprofundado, permitindo pesquisas mais extensas. O processo é mais demorado, mas promete resultados mais assertivos.
— O Deep Research representa um novo paradigma para buscas e respostas mais complexas — explica Burgos.
As big techs estão investindo em pesquisa para desenvolver modelos mais complexos, buscando novas arquiteturas de redes neurais, destaca Cortiz:
— As empresas estão tentando entender qual é o próximo passo. Com certeza, nesse contexto, podem surgir outros players no mercado. Mas, nesse momento, estamos em uma fase de pesquisa muito embrionária.
A questão da regulação
Em meio às transformações aceleradas, o processo de regulamentação do uso dessas ferramentas anda a passos lentos no Brasil. O projeto de Lei 2.338/2023, que ficou popularmente conhecido como Marco da Inteligência Artificial, foi aprovado no Senado no dia 10 de dezembro de 2024. Quase dois meses depois do retorno das atividades do plenário, o texto ainda não entrou na pauta das sessões.
O projeto depende de aprovação na Câmara de Deputados e, posteriormente, de sanção presidencial, caso não passe por alterações. Burgos avalia:
— Assim como todas as regulações que estão sendo feitas no mundo, essas decisões ainda não afetam muito o uso da IA na prática. É difícil regular nesse nível as ferramentas e prever qual será a reação das grandes empresas.
No caso da legislação brasileira, por exemplo, as medidas dizem respeito à forma como as tecnologias são desenvolvidas, mas há poucos detalhes sobre como será feita a fiscalização.
O professor do Mestrado Profissional em Direito da Empresa e dos Negócios da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) Manoel Gustavo Neubarth Trindade explica:
— São observados princípios como transparência, explicabilidade, inteligibilidade e auditabilidade. Isso dá a possibilidade de se verificar como se dá o funcionamento dos algoritmos, por exemplo.
Dados pessoais e direitos autorais
Para Daniela Copetti Cravo, procuradora do município de Porto Alegre, a regulação deve contemplar dois pontos importantes: dados pessoais e direitos autorais.
O uso da IA para gerar animações, ilustrações e outros elementos de obras, sejam audiovisuais ou não, tem sido uma das principais discussões da indústria cinematográfica. Uma das dúvidas é como responsabilizar as empresas por casos de uso indevido de materiais, uma vez que as imagens são reproduzidas pelos próprios usuários nas redes sociais.
— Várias condutas terão de ser desenvolvidas, documentadas e implementadas por diversos atores. Não somente pelos desenvolvedores, mas também por empresas, fornecedores de serviços de IA e instituições que utilizam esses sistemas. Todos estarão sujeitos a essa legislação — afirma Daniela.