Caçapava do Sul — principalmente seu distrito mais famoso, Minas do Camaquã — é conhecida como ponto de observação de fenômenos ufológicos: os entusiastas do tema se reúnem no município para vigílias e palestras em busca de provas da existência de vida fora da Terra. Até hoje, o único objeto que realmente veio do espaço na cidade é um meteorito. Apesar de não ser uma nave ou um ser intergaláctico, a pedra tem muita história para contar.
Foi encontrada há mais de cem anos, na zona rural de Caçapava do Sul, dentro das terras da família de João Alfredo Rosa Lopes — hoje, nonagenário. Por lá, o objeto era utilizado como brincadeira.
Por conta da grande densidade da pedra, o proprietário da fazenda desafiava os amigos a levantá-la do chão. Como o tamanho relativamente reduzido não condizia com o peso — originalmente, 27 quilos —, era uma diversão ver a dificuldade dos desavisados. Claro, ninguém sabia que se tratava de um meteorito raro.
A busca termina
Depois de um tempo, o objeto ficou abandonado em uma tapera. Foi aí que entrou na história o professor Elver Ubirajara Teixeira, 71 anos, geólogo e morador de Caçapava do Sul, que ouvia as histórias sobre a tal pedra e desconfiava que fosse um meteorito. Em um encontro do destino com Lopes, acabou comentando sobre o objeto espacial e descobriu que o novo amigo era o dono da pedra. Teixeira conta:
— Seu João esteve doente e, como sou um dos fundadores da Casa Espírita Fraternidade, fui lá dar um passe nele. A gente fez uma amizade. Ele, então, recuperou-se do ataque cardíaco que teve. Conversando, ele disse que tinha o meteorito. Pela nossa amizade e pelo trato espiritual, depois de um tempo de convencimento ele cedeu o meteorito para exame e, depois, doou para a universidade.
O geólogo finalmente colocou as mãos no meteorito em 2016, depois de anos de busca, e fez uma primeira análise. Em sua visão, era, sim, um meteorito. Porém, precisava de uma comprovação.
Tipo raro de meteorito
Assim, Teixeira pediu para um serralheiro local tirar um pedaço da rocha para enviá-lo à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Lá, foi avaliado pela especialista em astrofísica Maria Elisabeth Zucolotto. Mas, para confirmar, ela precisava ver a pedra de perto.
Maria Elisabeth viajou até Caçapava do Sul e pôde comprovar que, sim, era um meteorito. E mais do que isso: por conta de sua composição, de ferro-níquel, o corpo extraterreno foi classificado como um siderito, um dos tipos mais raros.
De acordo com a The Meteoritical Society, só existem 27 pedras desse tipo catalogadas no mundo — apenas uma no Brasil. O objeto é composto por 89% de ferro; 9,43% de níquel e 0,66% de cobalto, além de traços de outros elementos.

Há 4,5 bilhões de anos
Mas, afinal, o que é um siderito? De acordo com o professor de geologia da Unipampa de Caçapava do Sul Vinicius Matté, 39, esse objeto em específico é oriundo do cinturão de asteroides que existe entre Marte e Júpiter. Este cinturão quase foi um planeta no passado, mas, antes de se consolidar, acabou sendo fragmentado, provavelmente por conta da atração gravitacional de Júpiter. Todo esse movimento data dos primórdios do sistema solar, há 4,5 bilhões de anos.
— É um tipo de meteorito muito importante para nós, muito raro. Essa composição metálica é mais ou menos como esperamos que seja o núcleo da Terra. É uma das poucas formas de acesso a algo muito parecido com o interior do nosso planeta, já que não temos acesso direto a ele — explica Matté.
Em breve, à vista do público
Na Unipampa, o meteorito, que recebeu o nome de Caçapava do Sul, é uma peça que serve para estudos geológicos aprofundados — e para dar fama internacional à universidade. Afinal, é ali que repousa um dos raros sideritos existentes na Terra.
Falta, porém, um espaço para que a rocha fique aos olhos de todos os visitantes, logo na entrada da instituição de ensino — no momento, fica guardada em uma sala, escondida.
— Em breve, ele terá um espaço para exposição. O projeto já existe, com uma base de metal e a parte superior de acrílico, para que todos possam ver o meteorito — promete Matté.
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