Um dos trabalhadores paraguaios detidos na operação contra uma fábrica clandestina de cigarros em Agudo, na Região Central, disse não saber onde está. O homem de 23 anos contou a Zero Hora que chegou no local há duas semanas, atraído por uma oferta de trabalho que pagaria melhor do que ele ganhava como pedreiro em Hernandárias, distrito paraguaio próximo à fronteira com o Brasil.
— Não sei onde estou. Encontrei uma oportunidade de ganhar mais. Ele (o empregador) falou outra coisa, mas chegamos aqui e era isso — disse.
Ao todo, nove pessoas foram presas em flagrante. São dois brasileiros, apontados como donos da fábrica, e sete trabalhadores paraguaios, suspeitos de crime contra as relações de consumo – entre eles, o que conversou com Zero Hora.
O homem disse que o veículo que trouxe os trabalhadores do Paraguai para o Brasil era fechado, impedindo que eles enxergassem o lado de fora. Conforme o relato do paraguaio, o grupo dormia no local e recebia comida e cerveja. A promessa era de ficar um mês na fábrica, recebendo um pagamento diário.
– R$ 200 por dia, mas não pagaram - se queixa o paraguaio.
Ele e os conterrâneos falam também que estavam proibidos de deixar a fábrica e de fazer ligações telefônicas.
Segundo o delegado regional de Santa Maria, Sandro Meinerz, outros cinco paraguaios trabalhariam no local. A polícia busca identificá-los.
— É uma facção criminosa que está por trás deste esquema. Facção essa que usa essas pessoas que estão aqui, mão de obra barata trazida do Paraguai, porque eles já têm expertise, já trabalham em fábricas clandestinas de cigarro no país vizinho. Nós vamos analisar se havia alguma situação referente a trabalho escravo – comentou Meinerz.
Um dos brasileiros, preso em flagrante por porte ilegal de arma de fogo, atuaria como segurança da fábrica. Questionado pela reportagem sobre como os paraguaios foram parar na propriedade, o suspeito ficou em silêncio.
Operação
A descoberta é resultado de três meses de investigações. O que mais surpreende os policiais é que as máquinas encontradas na indústria são capazes de produzir até 150 mil maços por dia, o equivalente a 3 milhões de cigarros.
A fábrica clandestina funcionava de forma disfarçada dentro de uma antiga empresa de beneficiamento de arroz, montada numa área rural situada a cerca de 10 quilômetros da RS-287, que liga Santa Maria a Porto Alegre. É próxima ao Rio Jacuí, por onde a mercadoria ilegal pode também ser escoada para a Capital, por meio de barcos. A polícia afirma que os cigarros clandestinos eram comercializados nas regiões Central, Sul e na fronteira.
Os cigarros paraguaios produzidos ali são das marcas 51 e Egipt. A estimativa é que possam ter rendido R$ 300 mil por dia aos criminosos. A máquina funcionava dia e noite, ao longo de 24 horas, sete dias por semana, ressalta o delegado Alencar Carraro, do Departamento Estadual de Investigações do Narcotráfico (Denarc).
Os policiais concluíram que se tratava de uma fábrica de cigarros porque veículos que chegavam na suposta arrozeira estavam em nome de pessoas com vínculos com contrabando e tráfico de drogas. A suspeita dos policiais é de que os fabricantes de cigarro ilegal tenham feito consórcio com um grande traficante da fronteira, na região de São Borja. Uniram o útil ao agradável, já que a facção se beneficiava da rede de distribuição de cigarros para também vender drogas. Eles também estariam trocando cigarro por armas e droga na Argentina.
Os envolvidos devem responder por organização criminosa e fabricar e vender produto impróprio para consumo.