Muros altos, porta trancada por fora, câmeras de segurança dentro de casa. Essa foi a estrutura encontrada pela Polícia Civil ao acabar com um cárcere privado de sete anos em Santana do Livramento, na Fronteira Oeste, na segunda-feira (6).
A ação resultou na prisão em flagrante de um homem de 47 anos, suspeito de manter confinados a própria família: a esposa, de 43, e os filhos de oito e 12 anos.
— Ninguém conseguiria sair da casa se acontecesse alguma situação, e ele (o suspeito) não pudesse abrir a porta — resumiu Giovana Müller, delegada responsável pela investigação.
A prisão ocorreu no centro de Santana do Livramento, em uma propriedade utilizada como um estabelecimento comercial e casa do suspeito e das vítimas.
O comércio – a polícia não detalha de qual tipo – fica na frente e existe um pátio atrás, onde está localizada a moradia. Ali a mulher ficava presa enquanto o homem trabalhava.
— As janelas tinham grades. O único caminho para a casa é um corredor, cujo acesso é por uma porta que tem uma tranca que se abre só pelo lado de fora. Mesmo que fosse para o pátio, a mulher não teria como sair porque o lugar é todo murado. Ela vivia em uma situação absurda — acrescentou Giovana.
Conforme a delegada, a violência tem origem em um desentendimento familiar ocorrido em 2018, no qual a mãe da companheira teria sido impedida de ter contato com a filha e os netos; a avó iniciou ação civil para ver as crianças.
A mulher tinha acesso ao WhatsApp, mas não recebia autorização do marido para usar as redes sociais. O uso era controlado por câmeras de segurança localizadas na casa e acessadas pelo suspeito no estabelecimento comercial.
Se ela precisasse de algo, o contato era feito apenas pelo aplicativo de mensagem; eram raros os momentos em que a vítima podia sair – levar filhos à escola e ir ao mercado, sob supervisão dele, estão entre as exceções.
— Ela sofria violência física e psicológica, era humilhada, menosprezada. Há três anos foi para o hospital por causa de uma agressão, mas omitiu o problema. Ele dizia que tiraria a guarda dos filhos e que ela ficaria sem nada. A mulher entrou em um ciclo de violência — pontua Giovana.
O suspeito não prestou depoimento à polícia. Segundo a delegada, de maneira informal, ele justificou que, por questão de segurança, mantinha a casa fechada por conta de o filho caçula ser autista.
A polícia descobriu a situação após a vítima pedir socorro pelo Kwai, um aplicativo de compartilhamento de vídeos curtos. Na mídia social, ela encontrou uma irmã com quem não falava havia 10 anos e pediu ajuda. Uma advogada foi contatada e fez o registro na polícia.
O suspeito também responderá por posse ilegal de arma de fogo de uso restrito, já que oito armas de diferentes calibres e 500 munições foram localizadas na chácara da família no interior do município. Ele não tinha antecedentes criminais e a polícia diz que os filhos não sofriam agressões físicas.
Na tarde desta quarta-feira (8), a Justiça converteu a prisão em preventiva, segundo a delegada Giovana. Zero Hora contatou o Tribunal de Justiça, que até a publicação desta reportagem não respondeu sobre a situação do suspeito.
Com a conversão da prisão, o homem continuará detido na Penitenciária Estadual de Santana do Livramento. As vítimas estão na casa de familiares.