Após marcar um encontro por um aplicativo de relacionamento, um homem de Porto Alegre relata ter sido brutalmente agredido por dois homens dentro de casa. Conforme a vítima, que tem 32 anos, logo após chegar ao apartamento, a dupla anunciou o roubo e começou as agressões. Os criminosos levaram mais de R$ 11 mil da vítima, desferiram socos, fizeram ameaças e amarraram o homem, durante os 40 minutos de terror da ação, na última quinta-feira (6).
O caso ocorreu após troca de mensagens em um aplicativo direcionado à comunidade LGBT+, por meio do qual o encontro foi marcado. Por volta das 20h, a dupla chegou à casa do homem. Segundo a vítima, os criminosos conversaram brevemente, tomaram cerveja e logo depois pediram para irem para o quarto. No caminho, a vítima recebeu coronhada na nuca.
Na sequência, um dos homens sacou uma arma e o outro passou a amarrar a vítima, que também foi amordaçada com uma fita isolante e teve um travesseiro colocado sobre a cabeça, para abafar possíveis gritos.
— Eu estava completamente imobilizado, com um travesseiro na cabeça. Achei que iriam me asfixiar. Eles começaram a tentar me apagar, fechando meu nariz. Eu sangrava muito. Um deles estava mais calmo, mas o outro era mais agressivo, frio, totalmente fora de si. Subiu em cima de mim, me deu soco, joelhada, mordia minha orelha. Dizia que eu tinha irritado ele, falou até o último minuto que queria atirar em mim — relata a vítima. — Uma hora, pegaram um suco que estava na geladeira e jogaram em mim, achei que era álcool, que iriam colocar fogo. Nunca passei por nada tão violento e tão traumático na vida. Achei que seria morto durante todo o tempo — lembra.
O homem também conta que foi xingado pelos criminosos com falas homofóbicas e que a dupla ainda revirou a casa, onde encontrou cerca de R$ 1 mil em espécie. Depois, eles obrigaram o homem a informar a senha do aplicativo do banco e fizeram um pix do valor que estava na conta — R$ 10,4 mil. Uma caixa de som também foi levada.
Após o roubo, os criminosos deixaram uma tesoura na mão da vítima, ainda amarrada, para que pudesse se soltar, pegaram as chaves da casa e fugiram.
Depois de se soltar, o homem pediu ajuda a vizinhos e amigos. Ele foi ao hospital, onde recebeu atendimento, mas não precisou ser internado.
Eu estava completamente imobilizado, com um travesseiro na cabeça. Achei que iriam me asfixiar. Eles começaram a tentar me apagar, fechando meu nariz. Eu sangrava muito. Um deles estava mais calmo, mas o outro era mais agressivo, frio, totalmente fora de si. Nunca passei por nada tão violento e tão traumático na vida.
VÍTIMA DE 32 ANOS
Agredido e roubado durante encontro marcado por app
Abalo emocional
A vítima relata que vem recebendo apoio de amigos e familiares, mas que ainda não voltou a dormir no apartamento onde o roubo ocorreu. Diz que irá começar a fazer acompanhamento psicológico e que, como todo o dinheiro que tinha foi levado, está recebendo também ajuda financeira de pessoas próximas, até o próximo pagamento. Ele afirma que tentará recuperar o dinheiro levado na ação, mas não sabe se o banco irá devolver a quantia:
— Agora, estou me sentindo acolhido, venho recebendo muita força. Mas em algum momento vou ter de voltar para casa, encarar a rotina de novo, e aí acho que o baque vai ser maior, não sei como vão ser as coisas. Esse apartamento era o meu lar e agora é um local que me remete a um terror total. Graças a Deus, eu sobrevivi, era o que eu mais pedia naquela hora. E depois que você sai daquele momento, vem a preocupação financeira. Aquele dinheiro era do meu trabalho, tudo que tinha, e não sei se vou conseguir algum tipo de reparação.
Naquele dia, conta a vítima, por precaução, chegou a avisar um amigo que receberia os homens em casa. Na conversa, pediu que o amigo buscasse ajuda caso os dois não trocassem mais mais mensagens dentro de uma hora. A ação, no entanto, foi mais rápida.
Ele lembra também que não conseguiu reconhecer com precisão os rostos dos homens quando eles chegaram ao prédio, já que estavam de máscara — as usadas durante a pandemia — e boné.
— Mas a altura que tinham me passado batia. De qualquer forma, muitas pessoas colocam fotos antigas, de alguns anos atrás, nesses aplicativos. Então, achei que eram eles mesmo. Pareciam um pouco nervosos, mas isso também é normal durante um encontro. A gente nunca imagina que algo assim vá acontecer — pondera, ressaltando esperar que o caso sirva de alerta, especialmente para pessoas que utilizam o aplicativo.
Já temos a confirmação de outros casos com o mesmo "modus operandi" e estamos trabalhando para localizar essas vítimas, para que promovam a denúncia ou pelo mesmo busquem auxílio especializado para orientações e até mesmo proteção.
DIEGO MACHADO CANDIDO
Advogado da vítima e especialista em direito LGBT
Advogado da vítima e especialista em direito LGBT+, Diego Machado Candido reforça a importância de mais pessoas que passaram pela ação procurarem a polícia:
— Já temos a confirmação de outros casos com o mesmo modus operandi e estamos trabalhando para localizar essas vítimas, para que promovam a denúncia ou pelo mesmo busquem auxílio especializado para orientações e até mesmo proteção. Precisamos, com a maior urgência possível, conter esses casos de violência perpetrados por meio do aplicativo contra a população LGBT+ — diz Candido.
Polícia investiga ocorrências com mesmo "modus operandi"
De acordo com a titular da delegacia de Combate à Intolerância da Capital, delegada Andrea Mattos, outros dois casos são investigados pelas equipes.
Os três relatos que já são de conhecimento da polícia são semelhantes: todas as vítimas são homens, as ações são sempre marcadas pelo aplicativo e realizadas em dupla, e ocorreram neste mês em Porto Alegre. Conforme Andrea, os criminosos levaram valores semelhantes de cada vítima, deixando um prejuízo total de cerca de R$ 30 mil, além de eletrônicos levados das casas.
A delegada acredita que os criminosos tenham como foco cometer ações contra a comunidade LGBT+:
— Esse tipo de aplicativo, independente de ser voltado ao público LGBT+ ou não, já traz uma facilidade de encontrar pessoas desconhecidas. Mas também identificamos que há uma questão de intolerância, porque a vítima (da última quinta-feira) relata ter sido xingada por sua orientação sexual. Então, a questão do roubo está aliada, possivelmente, à do preconceito.
A delegada acredita que a dupla tenha feito mais vítimas, que ainda não procuraram a polícia. Andrea pede que pessoas que passaram pela mesma ação ou que tenham informações sobre o caso entrem em contato com as equipes.
Denúncias podem ser feitas, de forma anônima, por meio do WhatsApp da delegacia, pelo (51) 98595-5034.