Não encontrar o parceiro ideal para compartilhar o grande sonho da maternidade não impediu que Denise Dias se tornasse mãe. Depois de anos considerando uma produção independente, a terapeuta infantil se submeteu a uma fertilização in vitro. Aos 37 anos, a brasiliense radicada em Ribeirão Preto, no interior paulista, é mãe de Rafael, de quase oito meses. A experiência está narrada no livro Produção Independente — Diário de uma Terapeuta Infantil em Busca da Maternidade, lançamento da Matrix Editora.
Nesta entrevista, Denise fala sobre os motivos que a levaram a recorrer à reprodução assistida (ela utilizou o esperma de um doador desconhecido, obtido junto a um banco de sêmen), a reação de pessoas a sua volta, as adaptações na rotina para priorizar a convivência com o menino e o futuro.
Relacionamentos
"Sempre fui muito centrada, pé no chão. Jamais me casaria com alguém já sabendo que o namoro não está indo bem, como muitas mulheres fazem _ elas se acomodam, empurram com a barriga e, depois de anos de casamento, se separam por aqueles motivos pelos quais poderiam ter terminado o namoro. Aí o pessoal tem a ilusão de que o filho pode segurar o homem... pode segurar, mas não quer dizer que (o casamento) tenha qualidade. Acho que a mulherada dos 35 aos 40 anos está sofrendo para ter um cara legal. Muitos homens que namoramos fazem as palhaçadas que fazem porque estão vendo os próprios pais fazendo isso com as próprias mães, e as mães aceitando. Até condenam o pai, mas, quando você vê, o sujeito vai lá e faz igual.
Então sempre pensei que a produção independente poderia acontecer comigo. Sou muito romântica, acho que por isso também nunca me casei com os namorados que tive até agora. Eu já sabia que aqueles namoros não me dariam um bom casamento. Há homens bons? Lógico. Conheço vários. Tive namorados que são homens bons, mas, por outros motivos, o namoro não deu certo."
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Fertilização in vitro
"Desde os 28 anos, (sabia que) isso poderia acontecer. Com 33, fui à clínica de fertilização conversar sobre congelamento de óvulos. Pensei: 'Ok, deixa a vida me levar um pouco mais'. Com 34, congelei. O médico falou: 'Quem sabe você utiliza seus óvulos com banco de sêmen?'. Eu disse: 'Tá ficando louco? Nunca! Sou moderna, cabeça aberta, mas não vou fazer'. Um ano depois, pensei: 'Que maravilha que existe banco de sêmen!'. Fiz fertilização in vitro aos 36 anos. Não foi difícil tomar essa decisão. Tudo que sempre quis fazer na vida, eu fiz. Comuniquei minha família, meus melhores amigos. É muito fácil falar 'eu não preciso da aprovação dos outros', mas a gente quer. Os mais próximos aprovaram 100% porque me conhecem, não era um ato de loucura, tenho estrutura emocional para isso. Sobre a possibilidade de múltiplos, eu pensava: 'Deus, me prepare'. Sou de Brasília mas moro em Ribeirão Preto (SP), minha família inteira mora em Brasília, sou filha única, não tenho irmã para me ajudar. Aqui sou eu e eu."
Rotina com o bebê
"Eu trabalhava das 8h às 18h, de segunda a sexta-feira, até duas semanas antes de o Rafael nascer. Fiquei em casa o tempo que a obstetra mandou. Quando ele estava com 40 dias, voltei ao trabalho. Tenho que pagar minhas contas. Consegui uma babá. Pus câmera em casa, na sala e no quarto dele, e vejo pelo celular. Recomendo! Hoje em dia, olho bem pouco, é esporádico, porque a babá já é de confiança. Olho por curiosidade. Agora trabalho meio período. Sou autônoma, minha clínica fica a dois minutos do meu prédio. Ainda amamento."
Um novo parceiro
"Não descarto, lógico que não. Há um mês, mais ou menos, fui num aniversário, aí um amigo de um amigo falou que queria meu telefone e queria me conhecer. Tive um ataque de gargalhada quando isso chegou a mim. O cara é louco! Eu estou com um nenê! Hoje estou fechada, não quero. Não vou pagar babá para sair com alguém. Para quê? Não quero. O funil já era difícil, garanto que agora ficou pior."
A opinião dos outros
"'Como você é corajosa!' é o que mais ouço. Mas não vejo isso como um ato de coragem. Apenas segui o meu sonho de ser mãe, independentemente de ter um companheiro bom ao meu lado. Coragem eu acho que têm essas mulheres que ficam nesses casamentos medíocres. Às vezes, posto coisas nas redes sociais com a hashtag 'não tenho sogra', de brincadeira. Minhas amigas que têm altos problemas com as sogras mandam mensagem dizendo que adoraram. Quando eu estava grávida, nenhum paciente meu perguntou 'tia Denise, você é casada?', 'você tem namorado?', porque não importa."
O melhor até aqui
"É essa coisa fofa aqui do meu lado! A maternidade não tem descrição. O prazer que eu tenho com ele, o sonho realizado da maternidade, isso é até difícil de falar. A hora em que mais chorei até hoje não foi quando eu estava indo para o parto, não foi quando ele nasceu, não foi quando a médica colocou ele no meu braço, não foi no primeiro mamá _ foi no cartório. Não aceitaria jamais se ficasse, na certidão de nascimento, 'pai desconhecido'. Sabia que isso já tinha mudado, hoje não se coloca mais 'mãe' e 'pai', se coloca 'filiação'. Foi um dos momentos mais emocionantes."
Preocupações
"O que mais me preocupa é o financeiro. Estou pagando minhas contas, sou muito organizada, planejo muito as coisas. Pensando para a frente, o financeiro é uma preocupação. Escola custa caro. Como eu vou estar daqui a 15 anos? Não se sabe. Já abri previdência privada para o Rafael, pensando em pagar a melhor escola de Ensino Médio para que ele tenha mais chances de entrar numa universidade pública."
O futuro
"Vou falar a verdade para o Rafael. Ele vai perguntar. Não sei se esse grande questionamento vai ser com três anos, com cinco, sete, oito. O questionamento profundo em si, de querer entender. Vou responder sempre a verdade. No álbum do bebê, tem uma página que fala 'tudo sobre a minha mãe'. Escrevi algumas coisas sobre mim e coloquei umas fotos lindas, eu grávida. Na página ao lado, 'tudo sobre o meu pai'. Escrevi tudo que eu sei. Comecei assim, 'com certeza, um homem de bom coração', e escrevi as características: "branco, cabelo castanho liso, olhos castanhos, gosta de macarrão, de salada, de cachorro, caminha na rua, não é fumante e é fã de Legião Urbana, igual à mamãe!'."
O LIVRO
Produção Independente – Diário de uma Terapeuta Infantil em Busca da Maternidade
Matrix Editora
152 páginas
R$ 29,90