
A propagação de hábitos saudáveis deixou de ser pauta limitada a séries especiais para transbordar pelas grades de programação na forma de reality shows e consultorias médicas, nos mais variados turnos e em todos os tipos de canais. Dos educativos aos comerciais, na TV aberta ou por assinatura, falar de saúde é uma aposta das emissoras.
Doutor Drauzio Varella e seus quadros no Fantástico talvez seja um dos marcos inaugurais na TV Globo, que desde fevereiro de 2011 conta com o programa Bem Estar entre suas atrações matutinas, de segunda a sexta-feira. O programa aposta no bom-humor e no carisma dos apresentadores que dividem o estúdio com consultores para abordar temas relacionados a saúde, bons hábitos e qualidade de vida.
- Programas do tipo do Bem Estar são muito bem-vindos. Sempre acreditei que me comunicar com o público leigo era a melhor forma de transmitir o tipo de informação que eu acho importante - diz o endocrinologista Alfredo Halpern, um dos médicos que participa da atração.
Halpern admite que as aparições semanais num programa de abrangência nacional exigem um pouco de estudo, para não falhar com a informação diante dos telespectadores. Por outro lado, a popularidade serve como recompensa:
- As pessoas dizem que gostam do que a gente falou, que mudou as coisas em casa. É bonito - resume o médico.
No ar desde o início de outubro em Até quando você quer viver?, no GNT, a clínica-geral Márcia Franckevicius tem missão um pouco diferente na telinha. Ela comanda um reality show no qual calcula o tempo de vida dos participantes com os hábitos atuais e acompanha a mudança de atitudes para recalcular os anos que restam a cada um.
- A partir do exemplo deles podemos tratar de pontos cruciais que a maioria das pessoas acaba enfrentando em casa, como sobrepeso, álcool e fumo - comenta Márcia.
Para ela, os programas de saúde se multiplicam pelas emissoras na mesma proporção que a "tendência prevencionista" se dissemina no campo da medicina.
- Cada vez mais, as pessoas estão buscando longevidade, mas com qualidade de vida. Não adianta viver mais se tiver Alzheimer, Parkinson e outros males, e os avanços da medicina contribuem nesse sentido - conclui a médica.
Todos querem viver mais
O desejo de longevidade sadia justifica a multiplicação de programas de saúde na televisão brasileira, na opinião do gerente de conteúdo e programação da TV Unisinos, Daniel Pedroso.
- Todos querem viver mais e melhor, é nosso papel embalar a produção de conhecimento nessa área para o público - diz Pedroso, que também é professor universitário no curso de Realização Audiovisual.
Com ênfase no caráter educativo da produção universitária, a TV Unisinos produz uma série para a TV Brasil chamada Ser Saudável, fruto de uma complexa dinâmica estabelecida entre o Programa de Pós-Graduação em Saúde da Família e a equipe de comunicadores e estudantes, que viaja pelo Brasil em busca de personagens.
O programa é todo gravado em externa, não tem estúdio, e quem faz a entrevista é o médico. Na visão do diretor, entrevistar não chega a ser um mistério para os profissionais da saúde, já que no consultório eles fazem o que chamam de anamnese para levantar o histórico do paciente. A única diferença é a presença da câmera.
- Pode até ter alguma perda em termos de apresentação, mas o médico dá mais credibilidade, porque ele consegue aprofundar mais os assuntos na hora da entrevista - afirma Pedroso.
Ele concorda que programas com essa proposta reproduzem um discurso disciplinador, como sinalizam alguns críticos da temática, mas não vê problema nisso. Para o professor, trata-se da transmissão de um saber para mudar todo um sistema social que contribui para um estilo de vida pouco saudável, gerando um nicho de mercado na televisão.
Conselho assiste com cautela
O presidente do Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers), Rogério Aguiar, vê com ressalvas a participação de médicos em programas de televisão. Segundo ele, há uma série de recomendações do Conselho Federal de Medicina que devem ser respeitadas, desde a não exposição do paciente até a propaganda de procedimentos e técnicas.
A orientação ao telespectador é buscar informação sobre o médico no próprio site do Conselho ou junto à associação médica local. No caso de procedimentos "mágicos", vale verificar se há comprovação científica de sua eficácia. Em se tratando de informação preventiva, há mais flexibilidade.
- Os aconselhamentos que alcançam o terreno da qualidade de vida são uma parte mais flexível e nem sempre entram na especificidade médica - observa Aguiar.
O Cremers tem um comitê para acompanhar a divulgação médica e alertar a população em caso de informação indevida.