Fundada em 1903, a Santa Casa de Misericórdia de Santana do Livramento, um dos maiores hospitais da fronteira gaúcha, definha. Os 360 servidores decidiram entrar em greve a partir das 7 horas de segunda-feira (25), porque estão sem receber salários e com outros benefícios, como vale-refeição e transporte, também atrasados.
A notícia é péssima para os habitantes de Santana do Livramento, porque a Santa Casa é o único hospital do município que atende pelo SUS. A paralisação anunciada não chega a surpreender, é a terceira em dois anos. A falta de pagamento de salários se tornou crônica, em decorrência do endividamento da instituição e sucessivas trocas de gestão.
Os servidores fizeram uma manifestação em frente ao prédio centenário na última quinta-feira e revelaram que estão sem vale-transporte há 60 dias, assim como sem o vale-refeição. Muitos vão a pé trabalhar, desde bairros distantes. Eles dizem que há 20 anos estão sem depósitos do FGTS.
A crise da Santa Casa se arrasta pelo menos desde o início da década passada e, em 2015, ela sofreu intervenção da prefeitura, que perdura até hoje. Gestores nomeados pelo município tentam recuperar as finanças, mas isso nem sempre dá certo. Em setembro de 2020 a Polícia Federal realizou operação que teve como alvo uma organização social, o Instituto Salva Saúde, que tinha sido contratada pela prefeitura santanense para gerir o hospital.
A suspeita é que essa entidade tenha desviado R$ 2,5 milhões, o que ajuda a explicar porque os servidores do hospital ficaram sem receber. Os recursos teriam sido transferidos para empresas de fachada. Os diretores do Salva Saúde negaram os desvios, mas foram indiciados pelo crime.
O contrato com o Salva Saúde foi rompido pela prefeitura, que desde então coloca gestores no hospital, oriundos dos quadros municipais. Recém-nomeada pela prefeita Ana Tarouco, a gestora Leda Marisa disse que tem apenas cerca de R$ 1 milhão para pagar vencimentos, embora a folha de pagamento dos servidores do hospital gire em torno de R$ 1,6 milhão mensal.
Os funcionários se queixam de jornadas exaustivas. Os cirurgiões dizem que não têm recebido os valores acordados e estão submetidos a escalas extenuantes, por não terem substitutos. Os servidores prometem manter 30% dos serviços para casos emergenciais, para não deixar a comunidade desamparada.
A população é que mostra grande preocupação. Afinal, dos 27 leitos da Santa Casa, 20 estão reservados aos SUS. Caso o hospital pare, a cidade fica sem local de internação para os mais pobres.
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Saúde de Santana do Livramento, Sílvio Madruga, disse ao anunciar a greve temer que a prefeitura transforme o hospital num “postão” do SUS, sem leitos. A prefeita Ana Tarouco (DEM), recém-eleita, garante que isso não está nos planos:
— Estamos em negociação para uma gestão hospitalar profissional na Santa Casa. Um dos propósitos da minha eleição é abrir a caixa-preta do hospital. Hoje o gasto lá supera a arrecadação e isso não pode continuar — resume Ana.