Usada para tratar parte dos pacientes com coronavírus, a hidroxicloroquina, defendida pelo presidente Jair Bolsonaro, ainda não é consenso entre pesquisadores da área da saúde. A chefe do Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Marilda Siqueira, defende que o medicamento ainda precisa de mais estudos antes de ser usado definitivamente contra a covid-19:
– Virou o centro do debate nacional. É uma pressão muito grande na comunidade científica por resultados. A gente sabe que precisa de muita responsabilidade quando vai aplicar um novo medicamento ou droga usada para outra questão. Tem que ter tempo de análise para que isso seja feito com muita responsabilidade – disse, em entrevista ao Gaúcha Atualidade nesta quinta-feira (16).
A pesquisadora explicou que a comunidade científica ainda não entende exatamente todos os mecanismos do coronavírus. Não foram respondidas, por exemplo, questões sobre por que o vírus ataca alguns órgãos e exatamente que partes do corpo são atingidas.
– Ainda precisa de muitos estudos e esclarecimentos. Independentemente de opiniões, essas pesquisas têm de continuar. Mas é difícil precisar quando vamos ter esses dados, até porque precisamos ter um número de pacientes testados em diferentes grupos. Precisamos saber como a droga age em diferentes grupos populacionais. Isso tem que ser feito com muita calma e critério, evitando expor pacientes a risco de vida.
Apesar de a Fiocruz não trabalhar diretamente com pesquisas para uma vacina, Marilda acredita que esse recurso não estará disponível antes de um ano.
– Existem atualmente, no mundo, mais de 30 grupos de pesquisa trabalhando neste tema, mas não teremos a vacina dentro de um ano, pelo menos no atual horizonte. Nós fazemos um trabalho que dá base para a questão da vacina. Vamos trabalhar com outros países na questão do sequenciamento do genoma do vírus.
Referência nas Américas
Recentemente, a Fiocruz foi nomeada referência para coronavírus nas Américas pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A partir da formalização do acordo, o Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo passa a realizar testes de confirmação da doença, além de integrar a rede de especialistas em laboratório da entidade para covid-19.
– É algo muito grande para a Fiocruz, fruto de décadas de trabalho e investimento. Também significa que temos vários deveres, várias obrigações em relação à Organização Pan-Americana de Saúde e em relação a outros países da América Latina – explica Marilda.
Como laboratório de referência para covid-19 nas Américas, a unidade deverá apoiar os laboratórios da região, especialmente de países de média e baixa renda; realizar o sequenciamento genético de amostras para referência global; acompanhar a evolução do vírus e identificar mutações que possam ser relevantes para testes de diagnóstico, desenvolvimento de vacina e tratamentos; e desenvolver e implementar métodos de ponta para ensaios.
O Laboratório para Diagnóstico de Vírus Respiratórios do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), dos Estados Unidos, também atua como referência no continente.
Ouça, na íntegra, a entrevista com Marilda Siqueira