O número de casos de malária voltou a crescer de forma preocupante no País, depois de anos de queda. Os dados são do Ministério da Saúde. Segundo a pasta, até julho deste ano, 88.757 pacientes foram contabilizados com a doença, 28% a mais do que o registrado no mesmo período de 2016.
Especialistas atribuem o aumento a uma piora na organização do sistema de prevenção e combate à doença. No último ano, a área do Ministério da Saúde que atuava nesse sentido sofreu profundas alterações - entre elas, a fusão do departamento de malária com o de dengue e a substituição de técnicos.
A pasta atribui a expansão da malária às condições climáticas e ao próprio ciclo da doença. O professor da Universidade de Brasília (UnB), Pedro Tauil, no entanto, discorda desse argumento.
– Não houve uma mudança significativa do clima no último ano que explicasse esse avanço – disse ele, que acompanha há anos as estratégias de prevenção à doença.
– Além disso, o País assistiu nos últimos anos a uma queda constante de casos da malária", completou.
Para o professor, a redução de casos identificada até 2016 afasta a hipótese de que o aumento atual esteja associado a um eventual ciclo da doença.
– O que ocorreu foi uma perda do prestígio político desse tema.
Avanço
O Pará foi o Estado que assistiu ao maior avanço da malária no último ano. O número de casos mais do que dobrou em relação ao ano passado. Até julho, foram contabilizados 14.904 pacientes com a infecção. No Amazonas, a expansão também foi muito expressiva. Até julho, foram 39.558 casos, 43% a mais do que no mesmo período do ano anterior.
– O fato preocupa bastante. A malária estava em constante declínio, o sistema estava relativamente organizado, os municípios trabalhavam de forma adequada – afirmou o professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), Marcos Boulos.
Para o professor da FMUSP, um dos sinais da perda de espaço do combate à malária no Ministério da Saúde é a desativação do comitê assessor, um grupo de especialistas que tradicionalmente é convocado para discutir a situação da doença no País. Neste ano, o grupo completo não se reuniu nenhuma vez. Apenas o subcomitê, se reuniu uma vez para discutir tratamentos.
– O assunto não faz mais parte da rotina – disse.
Ele citou ainda algumas mudanças da equipe "não técnicas, mas políticas", que acabaram influenciando negativamente as ações de combate à malária.
A meta do ministério era eliminar a transmissão de uma das formas da doença, provocada pelo protozoário Plasmodium falciparum, o mais rapidamente possível. A corrida contra o relógio se explica. Na àsia, o plasmódio já desenvolveu resistência ao medicamento usado para tratar a doença.
- É uma questão de tempo. Isso também vai chegar ao Brasil, o que vai dificultar o tratamento de pacientes – observou Tauil.
– O que desejávamos era evitar que isso ocorresse, eliminar a transmissão no Brasil antes da chegada do protozoário resistente."
Controle
Boulos avaliou que a retomada do avanço da doença no País torna ainda mais distante o controle.
– É pior do que apenas recuperar o que foi perdido. A retomada de casos traz um desânimo para população, o que tornam a implementação de medidas de prevenção mais difíceis do que nas primeiras tentativas.
O professor da FMUSP afirmou que a melhor forma de se evitar o avanço da doença é diagnosticar e ofertar tratamento para o paciente o mais rapidamente possível.
A malária é transmitida pela picada do mosquito anopheles infectado pelo plasmódio. "Se o mosquito não está infectado, o ciclo se rompe. Daí a importância de se diagnosticar e tratar de forma rápida", completou Tauil, da UnB.
Tauil também afirma ser importante o uso de mosquiteiros impregnados com inseticida, além da aplicação de inseticida nas paredes das casas.
Em nota, o Ministério da Saúde informou haver 3.700 postos de notificação para diagnóstico e tratamento da malária. De acordo com a pasta, 64% dos pacientes recebem o diagnóstico e o tratamento em até 48 horas do início do sintomas, o que evita a gravidade dos casos.
A pasta informou ainda que, desde 2012, mantém uma equipe de profissionais especialistas da área da saúde em municípios prioritários para a malária, para auxiliar as ações locais. Em cinco anos, foram 43 municípios da Amazônia apoiados. Eles tiveram uma redução de quase 50% dos casos de malária em seus territórios.