O vaivém de carros na movimentada Avenida Wenceslau Escobar divide um polo de gastronomia que está se formando na zona sul de Porto Alegre. Moradores da região não precisam ir muito longe para encontrar opções de bares e restaurantes dos mais variados tipos de culinária. Tem pizza, cerveja, hambúrguer, cachorro-quente e sushi. Se quiser experimentar outra coisa, basta atravessar a via e escolher outro local para consumir.
A recente abertura do Céu Zona Sul, que agrega três marcas, impulsionou essa percepção de quem passa pela região. Em pouco tempo, o espaço conquistou moradores e até trouxe frequentadores de bairros mais distantes. A marca já possuía uma operação no bairro Cidade Baixa, em Porto Alegre, e outra no Litoral Norte. A nova unidade serve petiscos e bebidas em mesas na rua. Quando não há mais lugar para sentar, os clientes comem e bebem de pé na calçada.
O investimento para abrir o negócio foi de R$ 400 mil. Cabem 50 pessoas sentadas e cerca de 200 em pé. O atendimento é feito através de totens. O espaço, cujo nome ainda está sendo definido, agrega três marcas: o Céu, com foco em cervejas; o Mayô, de drinques; e o Atrakando, de culinária, com bolinhos fritos, sanduíches, hambúrgueres e pastéis no cardápio.
— É um bar de rua. O pessoal está dizendo "vamos lá na esquina". Esse "esquina" pegou. Estamos tendo um bom movimento de quarta-feira a sábado, e mais ainda em dias de jogo de futebol — diz o sócio Guilherme Grassotti, 31 anos, morador da Zona Sul e dono de outros restaurantes na região.
O imóvel onde o Céu se instalou fica em uma esquina icônica na Zona Sul, entre a Avenida Wenceslau Escobar e a Rua Dr. Barcelos. O prédio foi erguido originalmente para ser um cinema popular na década de 1960. O local também já abrigou a casa de festas Discoate, e mais tarde, um restaurante, que foi atingido por um incêndio, em 2016.
O prédio é alugado e tem 1,7 mil metros quadrados, mas apenas 300 metros quadrados estão sendo usados. Nos planos para o futuro está ampliar a operação com um espaço coberto que terá DJ. O estabelecimento funciona todos os dias, das 17h à meia-noite.
— Esperamos que mais negócios assim venham para cá. Quanto mais movimentar aqui, melhor para todos nós — diz Grassotti, que toca o negócio junto de Frederico Lincoln, Laís Montagner, Matheus Stringhini e Diogo Saicosque.
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A estudante Valentina Schifino, 22 anos, estava no Céu para uma festa de aniversário. Moradora da Zona Sul, a jovem celebra a chegada de novos negócios perto de casa.
— Os rolês sempre acontecem em outros bairros. Tenho que me deslocar, gastar com Uber ou dormir na casa de alguém. Eu já ia no Céu da Cidade Baixa e fiquei muito feliz quando soube que abriria aqui também — diz Valentina.
Amiga dela, Bruna Mattos, 21, veio da zona norte de Porto Alegre para a mesma festa.
— Confesso que fica longe para mim vir aqui, mas vendo tanta coisa legal, dá vontade de vir mais vezes — diz.
Mais opções ao lado
Na parte de cima do imóvel, funciona uma academia. Em outra sala, no térreo, a pizzaria Naples se instalou em abril de 2019. O empresário Ricardo Loose Júnior, 37 anos, já tinha uma hamburgueria na região, mas a fechou para focar no segmento de pizzas. Foi o primeiro a ocupar parte do complexo onde fica o Céu e outros restaurantes após o incêndio que atingiu o espaço anos antes. De uns meses para cá, sente que o movimento na região aumentou.
— O fluxo de pessoas na rua está muito maior, mas não é o nosso público. Não podemos reclamar do movimento. São cerca de 50 pessoas nos dias de semana e 180 nos finais de semana. Atendemos mais os moradores da Zona Sul e alguns poucos que vêm de outros bairros por indicação — diz o empresário.
Com 100 metros quadrados, contando um deque externo, a Naples tem capacidade para atender até 55 clientes sentados. O cardápio mistura pizzas napolitanas, nova-iorquinas e brasileiras.
Além da loja, a Naples possui uma indústria na mesma rua, onde fabrica pizzas que vende em 30 pontos de Porto Alegre, como empórios e minimercados.
Descendo mais um pouco a rua, o Barcelos Beer & Food já é um espaço conhecido pelos moradores do bairro Tristeza. Criada há oito anos, a casa é dividida em dois ambientes: restaurante na parte de cima e uma pista de dança com espaço para shows no andar de baixo. No local, se apresentam músicos da cena gaúcha, como Serginho Moah e a dupla Claus e Vanessa. A capacidade é para até 480 pessoas.
— Quando a gente veio para cá não tinha nada. Sou morador da Zona Sul desde sempre. Eu e meus amigos tínhamos que ir para a Goethe e o Menino Deus. O bar surgiu com a ideia de juntar nossos amigos aqui da região. É muito boa essa recente vinda de novos negócios para cá — diz o sócio Ilton Machado, 43 anos.
O Barcelos é mais frequentado por pessoas com mais de 30 anos. A marca chegou a ter operações na Sarmento Leite, no bairro Cidade Baixa, e na Rua Padre Chagas, no Moinhos de Vento, mas estas foram fechadas. Agora, trabalha apenas com a loja da Rua Dr. Barcelos e com outra unidade na Zona Sul, próxima ao clube AABB. A Barcelos tinha ainda uma fábrica de cervejas artesanais, que foi encerrada após ser atingida pela enchente de maio de 2024.
Ao lado do Barcelos, há uma loja em reformas, deixada pela hamburgueria Bendizê, que se mudou recentemente para outra quadra no bairro. Em seu lugar, ficará o Dori Sushi, de culinária japonesa, do empresário Israel Ramires. Com investimento de R$ 250 mil, os sócios aproveitarão parte da estrutura deixada pelo antigo inquilino.
— Os clientes poderão ver o sushi sendo feito na hora. Estamos com uma boa expectativa vendo os nossos vizinhos. Aqui virou um novo point da Zona Sul. Em dias de semana tem muito movimento, mas nos finais de semana é muito mais — diz Ramires.
O salão terá 70 metros quadrados. Caberão até 50 clientes, contando os lugares da rua. A expetativa é de inaugurar no começo de março, com 16 funcionários.
Na outra quadra
No ano passado, a hamburgueria Bendizê trocou o complexo de lojas junto ao Céu por um espaço na mesma rua, mas em uma quadra do outro lado da Avenida Wenceslau Escobar. O ponto é menor pois o público que faz pedidos de telentrega aumentou, explica a proprietária do negócio, Patrícia Rotermund, 36 anos.
— O comportamento de consumo muito depois da pandemia. As pessoas passaram a pedir muito mais delivery. Não fazia mais sentido estar com um ponto tão grande, gerando mais custos com aluguel e com uma equipe de funcionários maior. Hoje, 50% do meu faturamento vem da telentrega — diz a empresária, que também tem uma loja na Zona Norte que faz apenas pedidos para levar.
A Bendizê foi criada em 2015. Hoje, ocupa um espaço de 40 metros quadrados que comporta até 30 clientes. São apenas dois funcionários na equipe. A hamburgueria ganhou fama devido aos alimentos com apresentações criativas, como o hambúrguer John Lennon, com uma camada generosa de queijo raclette servida na mesa, e o Nadia, que vem com uma seringa de queijo cheddar para injetar no hambúrguer, além de uma "roda gigante" de molhos para acompanhar a porção de batatas fritas.
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Ao lado da hamburgueria, o Espaço Maestro completa 10 anos em agosto de 2025. O lugar reúne gastronomia e shows ao vivo. O gerente Lucas da Silva Santos, 35, diz que recebe cerca de cem clientes por dia. O local, de 400 metros quadrados, costuma ser usado para festas de aniversário, happy hours e até casamentos.
— Muitas pessoas vêm aqui para fazer "dates". Esses dias, um casal disse que se conheceu aqui e hoje estão casados. Esse é o clima — diz Lucas. — Recebemos gente de toda a cidade.
Dos mesmos donos do Espaço Maestro, o restaurante Baguan, especializado em xis, fechou recentemente. Ficava em uma loja ao lado. O ponto agora está à venda. No mesmo local, há um complexo de operações gastronômicas formado pela pizzaria Comfy, aberta há três anos, e o Ryori Sushi, que inaugurou em 2023.
— O pessoal mais velho vem para beber e o mais jovem para comer. Temos clientes fixos. Atendemos muitos clientes de fora da Zona Sul, até de outras cidades, que vêm por causa das nossas promoções — diz o sócio do Ryori Davi Hijazin, 24 anos, que administra o negócio com seu irmão.
— Tem muito mais gente ficando na Zona Sul. O pessoal daqui vai para a Zona Norte e para o Centro, mas o contrário não costuma acontecer. Rola um preconceito, então acabamos ficando mais com o público daqui mesmo — completa o dono da pizzaria Comfy, Felipe Sandrini.
Essa parte da rua é bastante tranquila. Quem chega de carro, consegue encontrar vagas para estacionar com facilidade. Foi o que fez o casal de noivos Airton Lima, 33 anos, e Luiza de Castro, 35, que costuma ir a pizzarias pelo menos uma vez na semana. Vieram do bairro Menino Deus para conhecer a Comfy devido a uma promoção, mas prometem voltar mais vezes.
— Está com bastante opção aqui. A gente veio apenas uma outra vez para jogar boliche em um restaurante aqui perto, mas a região estava diferente — diz Luiza.
— Nos restaurantes da Zona Norte tu nunca acha uma vaga para estacionar. Precisa pagar uma garagem. Aqui, vou usar esse dinheiro para pedir uma pizza doce de sobremesa — completa o noivo.
Dobrando a esquina
Dobrando à direita na próxima esquina, o frequentador encontra mais uma pizzaria. Com mais tempo de casa, a Pizza Pizza tornou-se referência no segmento em Porto Alegre. A aposta é em pizzas tradicionais, como calabresa e 5 queijos. A inauguração ocorreu em 2007, quando a região carecia de estabelecimentos desse tipo. O proprietário, Rafael Coral, 45 anos, diz que, após a pandemia, o movimento ficou mais baixo.
— Atendemos todos os perfis de clientes, de todas as classes, mas principalmente A e B. Basicamente clientes que moram nas proximidades. Porém, pela fama da pizzaria na cidade, temos clientes frequentes que vêm de regiões distantes para comer a nossa pizza — diz Rafael.
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Mais adiante, o Janela aposta em drinques de R$ 18 e cerveja a partir de R$ 12 para atrair o público jovem. A maior parte do espaço para os clientes fica na rua, com cadeiras de praia e tonéis para apoiar os copos. A rede pertence ao Grupo Rua, com sede em Curitiba (PR), e também tem lojas em Santa Catarina, em Minas Gerais e em São Paulo. Na capital gaúcha, possui outra unidade no bairro Cidade Baixa. O gerente da operação da Zona Sul, Jeferson Santos, 27, diz que o público tem entre 18 e 30 anos.
— Para nós, o movimento cresceu muito de um ano para cá. Em finais de semana, a partir das 20h, não temos mais lugar. O pessoal só consegue ficar de pé na rua. Nos últimos anos, o foco sempre foi Cidade Baixa e Gasômetro, mas isso está mudando — diz Jeferson.
Próximo dali, o 4Beer também serve seus clientes com cerveja, mas de marca própria. No cardápio, há carnes assadas, hambúrgueres e petiscos. Com 300 metros quadrados, a loja da Zona Sul tem espaço para 120 clientes.
— Depois da pandemia, notamos que mudou o perfil do público da Zona Sul. Agora, está vindo um pessoal um pouco mais jovem. Sinto que famílias mais jovens estão se estabelecendo na região — diz o sócio Caio de Santi.
O 4Beer tornou-se uma rede com lojas próprias e franquias. Além da Zona Sul, possui unidades no 4º Distrito e nos bairros Menino Deus, Três Figueiras, Bela Vista, Moinhos de Vento e Auxiliadora. Recentemente, fechou lojas no Centro Histórico e no Bom Fim.
"Quando era tudo mato"
Em frente ao Céu, o empresário Luciano Oliveira, 43 anos, estaciona todos os dias da semana sua carrocinha de cachorro-quente. Há 34 anos no mesmo ponto, o Ricardog é um clássico entre os moradores do bairro Tristeza. São vendidos mais de cem cachorros-quentes por dia. O empresário chegou a ter operações nos bairros Menino Deus e Teresópolis, mas fechou para focar na operação da Zona Sul.
— Comecei a trabalhar aqui quando "era tudo mato". Na pandemia, deu uma segurada. Agora, abriu um monte de bar na volta e isso acabou respingando em nós. Movimento melhorou muito. Tem dias que temos que ficar abertos por mais tempo para atender todo mundo — diz Luciano, que começou como funcionário e hoje é sócio do negócio.
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