Os ônibus intermunicipais que chegam ou saem de Porto Alegre têm circulado semiocupados. É a crise do coronavírus, que afetou em cheio o transporte coletivo. O problema maior é que muitos dos usuários que tomam ônibus não usam qualquer Equipamento de Proteção Individual (EPI), recomendado pelos sanitaristas para toda atividade em espaços confinados – como é o caso de viagens no transporte coletivo.
GaúchaZH percorreu as plataformas de desembarque da Estação Rodoviária de Porto Alegre, irreconhecível de tão vazia. Constatou a indiferença como muitos passageiros encaram os apelos de cautela por parte das autoridades sanitárias.
Num ônibus da Viação Bento, que chegou de Bento Gonçalves às 10h45min desta quarta-feira (22), menos da metade dos 23 passageiros desembarcou usando máscaras. A lotação usual do veículo é de 46 passageiros, mas a ocupação não se completa desde meados de março, quando começaram os casos de coronavírus no Rio Grande do Sul, resume o motorista. Esse, sim, de máscara e luvas.
A reportagem tentou falar com uma policial militar que estava sem máscara e luvas, ela apenas fez sinal de não com os dedos e não respondeu à pergunta sobre falta de EPIs. Um agricultor admitiu o erro e prometeu, ao descer do ônibus:
— Vou comprar, não encontrei antes de viajar.
Uma mulher deu um sorriso acanhado e argumentou ao ser questionada se não acha arriscado viajar num espaço fechado sem máscara, em companhia de desconhecidos que podem ter o vírus:
— Não faço questão, me desculpa.
De um ônibus da Citral, vindo de Taquara, desceram oito passageiros. Quatro não usavam qualquer tipo de proteção contra o vírus. Uma moça com várias bagagens e um violão nas costas, questionada sobre a falta de máscara, admitiu:
— Acho arriscado, sim. Mas não estou a fim de conversar sobre isso.
GaúchaZH conversou com três motoristas, que preferem não ter seus nomes publicados. Todos usam máscara e luvas. Um deles disse que teve de comprar, porque a empresa não tinha para fornecer. Eles se mostram espantados com a falta de cuidado dos passageiros.
— A gente abre janelinha dos lados, a janela de teto solar, tudo para ventilar. Os passageiros, porém, viajam sem qualquer preocupação. Inclusive muita gente da área da saúde, que tem vindo a Porto Alegre por obrigação. Acho o cúmulo da falta de responsabilidade — pondera um dos motoristas.
Outro condutor ressalta que “o único consolo — se é que pode se usar essa palavra — é que o fato da ocupação nos coletivos ser diminuta dificulta o contágio”. Em contrapartida, lembra ele, causa um baque econômico nas empresas e a perspectiva de desemprego assusta.
Nos aviões, também há resistência aos EPIs
O uso de máscaras dentro de aviões, embora mais frequentes do que nos ônibus, ainda enfrenta resistências. É o que constatou GaúchaZH em visita ao Aeroporto Salgado Filho na tarde desta quarta-feira (22). Num voo da Azul proveniente de Campinas (SP), a maioria dos passageiros desembarcou no saguão sem máscara. A reportagem ouviu vários deles, que disseram ter retirado o Equipamento de Proteção Individual apenas ao sair da aeronave.
Mas não é o que relata a engenheira química Dayenne Alves, da Paraíba, que está trabalhando numa indústria do Vale do Paranhana (RS). Ela chegou de seu Estado natal apavorada: assegura que dezenas de pessoas não usavam máscara no avião, nem no trajeto rumo a Campinas, nem de Campinas a Porto Alegre. Ela tirou fotos, que cedeu à reportagem, para comprovar.
—E mais, as pessoas sentavam lado a lado, quando o recomendado é sentar em poltronas intercaladas, para dificultar a propagação do vírus. Estou louca de medo — resume Dayenne.
De fato, a Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata, na sigla em inglês) recomenda que os assentos do meio – na fileira de três, da maioria das aeronaves - não sejam ocupados. Um representante de companhia aérea falou à reportagem que não há necessidade das pessoas sentarem lado a lado, porque os aviões têm voado com 30% da capacidade ocupada.
Sobre o uso de máscara, um dos passageiros entrevistados, um executivo do Rio de Janeiro, usou da sinceridade e disse:
— Sei que é errado, mas não uso máscara e não vou usar. Me incomoda — resumiu.
Procuradas, a Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear) e com a companhia Azul (que não faz parte dessa associação) informam que a cada dia os aviões sofrem higienização completa e, a cada parada, são aplicados desinfetantes de uso profissional. Na parte traseira e dianteira foram instalados suportes com álcool gel, para uso de tripulantes e passageiros. Luvas descartáveis também são disponibilizadas a quem quiser. As tripulações são submetidas a exames médicos periódicos.
As empresas dizem que indicam o uso de máscaras pelos clientes, mas isso não é obrigatório.
O impacto da covid-19 repercutiu em cheio nas companhias aéreas. A Azul admite redução de 90% na capacidade de voos, tendo sido atingidos tanto a ocupação de aeronaves quanto os destinos. A Abear não informou os números do prejuízo causado pela pandemia. O Aeroporto Salgado Filho é um dos mais atingidos pela queda na procura por passagens. A média diária variava de 60 a 70 voos, antes da pandemia. Agora está em seis por dia.