Havia motivos dentro e fora de campo para que os colorados tivessem uma expectativa alta para o "match" de 8 de julho de 1913, quando ocorreria a primeira rodada do Campeonato da Cidade. Até o ano anterior, o Inter não tinha um local para chamar de casa: dividia espaço com o time do Colégio Militar, em um campo improvisado onde hoje está situado o Hospital de Pronto Socorro. Mas em 1912 o Inter se mudou para a agradável e bucólica Chácara dos Eucaliptos, entre os bairros Menino Deus e Azenha.
A mudança do clube para lá acompanhava o desenvolvimento da região sul da cidade. Oito anos antes, começara o trabalho de calçamento do antigo caminho, que se tornava Rua da Azenha. Era nela que ficava o pórtico registrado em uma das raras fotos do Inter em sua primeira casa, com os dizeres "Sport Club Internacional" ladeado por colunas de alvenaria. O espaço pertencia ao Asilo da Providência e era alugado ao Inter.
Perto do campo do Militar, que precisava ser delimitado com cal a cada jogo, a Chácara era um luxo: havia vestiário com chuveiros para as duas equipes. As arquibancadas ficavam escoradas nos eucaliptos, que faziam sombra e exalavam um cheiro agradável da planta sobre a torcida e o gramado. E na fatídica data de 1913 seria a primeira vez que o Inter receberia na nova casa o Grêmio, sob um novo clima.
Nos primeiros quatro Gre-Nais, o Inter sofrera derrotas indiscutíveis: foram 31 gols sofridos e apenas um marcado. Mas algo havia mudado no quinto jogo: em setembro de 1912, em partida equilibrada, o Inter perdeu apenas por 2 a 1 no Fortim da Baixada, estádio do rival, no Moinhos de Vento.
O placar se repetiria no primeiro Gre-Nal da Chácara dos Eucaliptos em um jogo atípico. A começar pelo juiz, que não compareceu e teve de ser substituído por um voluntário de outro clube, o S.C. Colombo. Mas a rivalidade Gre-Nal, enfim estava instaurada. Mais uma vez dentro e fora de campo: depois do confronto, novamente equilibrado, o Grêmio se desentendeu com a liga municipal e os times passaram mais de dois anos sem se enfrentar, ambos se declarando campeões de ligas independentes ao final do ano.
Quando vermelhos e azuis voltaram a se encontrar, a gangorra havia se invertido: o Inter venceu por 4 a 1 na Baixada, em 1915. Quando voltou às sombras dos eucaliptos da Chácara, em 1916, o Grêmio perdeu por 6 a 1 em um das atuações mais endiabradas de todos em tempos em Gre-Nal, a do ponteiro colorado Vares, que marcou os seis gols colorados.
— O Inter foi muito feliz na Chácara. Em um espaço de oito anos, foi pentacampeão da cidade — conta Kenny Braga, autor de Inter, Orgulho do Brasil (Já Editores, 2009).
Em 1928, os gestores do Providência anunciaram a venda do terreno onde estava a Chácara e botou preço: 40 mil contos de réis, uma pequena fortuna que o Inter não tinha. Após dois anos de incertezas, uma vigorosa campanha de arrecadação de fundos foi mobilizada para a construção do Estádio dos Eucaliptos, na Rua Silveiro. Da primeira casa, ficou a homenagem no batismo e nas mudas plantadas em torno do campo. O terreno da antiga Chácara hoje forma as quadras entre as ruas Germano Hasslocher, Botafogo e Azenha, por coincidência a metros de onde o Grêmio ergueria no futuro o Estádio Olímpico.
Fontes: Célia Ferraz de Souza (UFRGS), Heinrich Hasenack (UFRGS), Ariel Engster (Museu do Inter), Sandro Pasinato (Museu do Grêmio), Eduardo Bueno, Kenny Braga e livro A História dos Gre-Nais (L&PM, 2009).