Criticada por educadores e por alguns vereadores de Porto Alegre, a declaração do secretário municipal de Educação, Adriano Naves de Brito, sobre a repetição da merenda nas escolas da rede pública também é contestada por especialistas. Durante um evento na Câmara Municipal, na segunda-feira (19), o titular da Educação disse considerar "inadequado" que os alunos repetissem refeições. Embora não haja proibição formal de repetição da merenda nas escolas do município, segundo a secretaria, Naves de Brito argumentou que a alimentação precisa ser controlada para prevenir a "obesidade" entre as crianças.
Nutricionistas ouvidos por GaúchaZH, no entanto, discordam da associação entre a repetição de merenda e problemas de sobrepeso. Na avaliação desses profissionais, questões relacionadas ao sobrepeso têm mais a ver com a qualidade dos alimentos do que com o fato de a criança repetir ou não refeições.
— Do ponto de vista nutricional, não seria essa a orientação, de não repetir. A gente sabe que o problema do sobrepeso não vem da merenda escolar. É do contexto onde as crianças estão inseridas, da sua rotina, do consumo de alimentos industrializados e ultraprocessados. O alimento oferecido na escola segue uma diretriz nacional (do Programa Nacional de Alimentação Escolar), é comida de verdade. O que se deve controlar são calorias vazias — avalia a especialista em nutrição infantil Carolina Prates.
Conforme a profissional, que atua em escolas, crianças que se alimentam normalmente e realizam atividades físicas não devem ser privadas de repetir uma refeição quando a comida é saudável, como os alimentos normalmente oferecidos na merenda. Nesses casos, merecem atenção aqueles que precisam de mais de uma repetição para ficarem satisfeitos — o que pode ser um sinal de problemas nutricionais ou psicológicos.
Para a nutricionista Poliana Espíndola, no caso da alimentação escolar, também é preciso observar o contexto social em que os alunos estão inseridos. Crianças que não se alimentam de modo adequado em casa, por exemplo, podem sentir necessidade de compensar a falta de nutrientes nessas refeições. Além disso, a fase do desenvolvimento também pode alterar o grau de apetite dos alunos — pré-adolescentes ativos podem precisar de mais calorias do que crianças mais novas, por exemplo.
— A questão da refeição na escola é uma coisa social. Não dá para dizer que a criança vai ganhar peso ou que está comendo mais porque é gulosa. Muitas vezes, ela não tem o que comer em casa e faz a refeição do dia ali. As crianças que vão querer repetir são as que estão com fome — diz a nutricionista.
Em entrevista ao Gaúcha+, nesta quinta-feira (22), o secretário voltou a afirmar que não há uma proibição para repetir as refeições, mas sim uma restrição para que só alunos que tenham justificativa o façam. A avaliação, conforme Naves de Brito, fica a cargo das equipes que cuidam da alimentação nas escolas.
— É uma orientação de saúde, do Programa Nacional de Alimentação Escolar. Uma em cada três crianças do Brasil são obesas — ressalta.
Naves de Brito definiu a polêmica como "falsa discussão", acrescentando que nenhum dado corrobora a ideia de que os alunos da rede municipal são carentes a ponto de irem a escola por causa da merenda.