
Na última semana de 2015, a prefeitura de Porto Alegre e a Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) assinaram o aguardado contrato que permitirá a realização de um novo censo dos moradores de rua da Capital, uma velha promessa da administração do município.
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O último levantamento, também feito pela UFRGS, ocorreu em 2011 e identificou 1.347 pessoas. Especialistas consideram que o dado pode estar bastante defasado, com consequente prejuízo ao acerto das políticas que atendem a essa população.
Em janeiro do ano passado, a Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc) havia anunciado a realização do recenseamento ainda em 2015, com divulgação dos dados no segundo semestre. Conforme Marta Borba, diretora técnica da fundação, o indicado é que a pesquisa seja refeita a cada três ou quatro anos.
Com o atraso do cronograma, a coleta de dados deve ocorrer apenas depois do término deste veraneio. Fasc e UFRGS afirmam que o relatório final deve estar disponível ainda neste ano. Marta atribui a demora à paralisação de servidores da universidade ocorrida no ano passado.
- A greve gerou um atraso significativo. A universidade só ficou pronta para assinar o contrato em dezembro. Depois da ordem de início, ocorrerá uma tramitação. Imagino que o trabalho de campo vá ocorrer em março - diz.
Estudo no período de férias não seria adequado
O sociólogo Ivaldo Gehlen, um dos dois professores da UFRGS que vão cuidar da coordenação do censo, reconhece a responsabilidade da instituição na demora, mas acredita que a paralisação não foi o fator principal.
- A greve pode ter influenciado em parte, mas eu não diria que foi propriamente isso. Na UFRGS, um procedimento desse tipo leva alguns meses. Quando entregamos o pré-projeto, ainda não tínhamos uma aprovação interna. Depois de o projeto ser escolhido, ele tem de passar por várias instâncias da universidade para aprovação. Do meu ponto de vista, esse atraso burocrático pode até ser favorável, ou íamos passar os meses de dezembro, janeiro e fevereiro realizando - afirma.
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O entendimento é de que o período de férias não é adequado porque muitos moradores de rua deixam a cidade, o que poderia produzir resultados enganosos. Marta afirma que, em uma ocasião, fez-se a coleta de dados durante esse período e depois foi necessário repetir o trabalho. Para driblar o problema, a Fasc marcou a ordem de início dos trabalhos apenas para 26 de janeiro. As primeiras semanas serão para montagem da equipe, cursos de qualificação, treinamento de pesquisadores, calibragem da metodologia e definição do conteúdo dos questionários.
Abrangidos pela pesquisa terão representantes
A equipe de Gehlen realizou os últimos três levantamentos da população de rua da Capital. Conforme ele, uma novidade e um avanço do próximo censo é a participação no processo de representantes dos próprios abrangidos pela pesquisa. Esses representantes estarão envolvidos na etapa inicial (que inclui curso de qualificação e construção dos questionários) e no mapeamento dos locais que serão pesquisados. Também atuarão como facilitadores no contato entre os entrevistadores e os moradores de rua e, mais tarde, ajudarão na análise dos dados.
- Além de colaborar para a melhoria dos instrumentos de pesquisa e do mapeamento, isso demonstra uma mudança do ponto de vista da evolução e da mobilização dessas pessoas. Mostra que elas têm demandas. É excelente que reivindiquem participar. Da perspectiva delas, que sempre tiveram muita desconfiança, é algo que legitima mais o estudo - observa Gehlen.
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Marta destaca que o recenseamento será não apenas quantitativo, mas também qualitativo. Além de contabilizar e traçar um perfil de todos os moradores de rua, incluirá entrevistas mais aprofundadas com uma amostra deles.
- Esse estudo atualiza os anteriores e também atenderá a um processo de escuta aos trabalhadores dos serviços de assistência social, podendo dar à pesquisa o olhar de quem usufrui dos serviços, bem como de quem executa as ações - descreve.