Painel está exposto na fachada do Centro Cultural CEEE Erico Verissimo
Foto: Jéssica Rebeca Weber/ Agência RBS
O painel de LED exposto na fachada do Centro Cultural CEEE Erico Verissimo, no Centro de Porto Alegre, atrai o olhar dos pedestres por um curto instante, mas eles não diminuem o passo apressado para captar a mensagem. Uma mulher que passava pela Rua das Andradas até verbalizou a palavra-chave exibida infinitas vezes na obra do chileno Alfredo Jaar: "América". Mas a informação se dissipa ali mesmo, sem parecer importante.
O ZH Pelas Ruas convidou pedestres a parar um pouco, analisar e relatar o que acham que significa o painel A Logo For America, que, junto a interações acústicas de Marcelo Armani, é a única obra externa da 10ª Bienal do Mercosul. Alguns preferiram nem arriscar, mas a cabeleireira Katia Blini, 45 anos, não se acanhou. Depois de ler frases como "This is not America" (isso não é América, em inglês) dentro do mapa dos Estados Unidos, disparou:
- Quando qualquer pessoa fala América, é Estados Unidos e pronto, terminou. Eu acho que ele quer dizer que a América não é só os Estados Unidos: todos nós somos América.
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Ela admite que, se não fosse o pedido da repórter, não repararia na obra, mas ficou feliz em interromper a caminhada para refletir.
- Dá pra pensar um pouquinho.
A escritora e jornalista Cintia Moscovich, 57 anos, seguiu pela mesma linha de raciocínio e, depois de assistir na íntegra a sequência de imagens de pouco mais de 40 segundos, foi um pouco além:
- Ele faz com que o mapa das Américas se inverta. É mesmo uma arbitrariedade tu considerar que a América do Norte é em cima e a do Sul, embaixo - diz ela, que achou o painel "um barato".
De acordo com o esclarecimento do curador-chefe desta edição da Bienal, Gaudêncio Fidelis, as interpretações feitas por Katia e Cintia estão corretas. Ele explica que o artista chileno, hoje radicado em Nova York, criou a obra em 1987 para expor na Times Square, "símbolo financeiro do capital internacional e tudo o que isso representa".
- Um pouco dessa obra diz respeito ao seu caráter fortemente político e ao fato de que foi concebida para discutir essa noção de que a América é uma construção estritamente ficcional, e não diz respeito exclusivamente aos Estados Unidos e à América do Norte - diz ele.
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Fidelis lembra ainda que o "giro das Américas" se associa ao desenho do uruguaio Torres García, intitulado América Invertida, de 1943, a primeira obra que questionou que haja um Norte e um Sul determinados em uma hierarquia de superior e inferior a partir da cartografia do mapa mundial, segundo Fidelis.
Recentemente a obra foi remontada na Times Square, depois que foi adquirida pelo museu Guggenheim de Nova York. Ela está sendo exposta fora da cidade norte-americana pela primeira vez, e o local para instalá-la durante a Bienal foi escolhido a dedo:
- A obra é concebida a partir da luz, e nós instalamos ela justamente no antigo prédio da Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE). Na parede logo acima do painel, a gente vê a frase "Força e Luz", que adiciona um aspecto simbólico muito forte à própria obra, na medida em que explora esse caráter da obra de questionar os limites da política, da ideologia e de uma determinada concepção de América que a gente considera bastante atrasada.
A Bienal segue até 6 de dezembro. As mostras estão no Centro Histórico (Usina do Gasômetro, Museu de Arte do Rio Grande do Sul Ado Malagoli, Memorial do Rio Grande do Sul, Santander Cultural e Centro Cultural CEEE Erico Verissimo) e no Instituto Ling, na Zona Norte. Mais informações no site www.fundacaobienal.art.br.
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