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Os veículos que passam na Rua Nossa Senhora Aparecida, na Ilha Grande dos Marinheiros, em Porto Alegre, desaceleram ao deparar com a Borracharia do Paraíba. Em meio ao chão batido e ao cenário tipicamente masculino, é a desenvoltura da Maria Eliete Filirmino dos Santos, 56 anos, que chama atenção de quem cruza a via pela primeira vez.
Sem nenhuma cerimônia, conserta aros, calibra pneus, passa graxa e carrega peso sem cara de esforço. Unha pintada de vermelho e corpo mignon, ela pesa 59kg e maneja pneus de 30kg para carro e até 70kg quando se trata de caminhões. Nunca teve problemas de coluna.
- O que chegar aqui, eu faço - diz.
Orgulhosa do ofício, conta que abriu a borracharia com o marido José Maurício de Souza, 46 anos, há 13 anos, logo depois de chegarem a Porto Alegre. O casal é da Paraíba, viveu dez anos em São Paulo quando decidiu apostar no Sul. Ela chegou à Capital apenas com a experiência de doméstica.
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O casal paraibano aprendeu junto
Engana-se quem pensa que o marido ensinou todos os truques. Aprenderam juntos os segredos da função e conquistaram a clientela da Ilha. José chegou a Porto Alegre com a ideia de abrir um negócio em que o casal pudesse trabalhar junto, de preferência ao lado de casa, para que não se afastassem dos filhos.
Deu tão certo que hoje a habilidade de Eliete deixa muitos de boca aberta, especialmente, a mulherada. Já teve quem ligou e não acreditou que o marido estava na borracharia ao ouvir a voz de Maria ao fundo.
- Percebo que quando estou ali fora alguns passam com o carro bem devagarinho para ficar me olhando. É engraçado porque, para mim, é totalmente normal - justifica.
Além de tudo, cuida da casa!
Na família, todos aprenderam a ajudar na borracharia mas cada um dos filhos seguiu um caminho distinto. Maria e José têm quatro: o professor de informática Sidnei, 25 anos, o soldador Bento, 24, a operadora de caixa Fernanda, 23, e a dona de casa Tatianne, 21 - única que ainda mora com o casal.
A borracharia, que já ficou aberta 24h por dia, atualmente, atende das 8h às 18h, de segunda a sábado, mas Maria só atua a partir do meio-dia. Antes, cuida das atividades da casa e faz o almoço. Evangélica, conta que vai à missa três vezes por semana, em Porto Alegre. Sobre viver e trabalhar ao lado do marido, ela dispara:
- Sabendo controlar o estresse, tem como manter sim.
Marido diz: é pau para toda obra
O marido brinca com o desempenho da esposa no negócio da família. Segundo ele, não nega serviço de jeito nenhum. Só não trabalha com solda para não danificar a lente dos óculos.
- Ela faz ligação elétrica, corta azulejo, faz qualquer coisa. Ela era para ter sido homem, deu errado e nasceu fêmea - diverte-se o marido.
Conta que se o pneu do caminhão for muito pesado, raramente pede ajuda ao marido para movimentá-lo, mas frisa que não é sempre. No caso das bicicletas, monta e desmonta magrelas para consertá-las com facilidade.
Enquanto conversava com a reportagem, mexia em uma equipamento que retira e aplica o aro do pneu. Em seguida, aplicou produtos nos sulcos da roda. O esmalte vermelho, segundo ela, é para evitar que as unhas fiquem encardidas com a graxa.
- Estão sempre pintadas com esmalte escuro - diz.
Embora tenha desenvoltura de sobra, conta, dando gargalhadas, que já perdeu a unha do dedão do pé direito duas vezes devido a acidentes.
- Uma vez, passei o Natal sem unha. Se cai um pneu no pé, o estrago é feio.