A mais turbulenta e aventureira das vidas também pode terminar com a impressão de que não levou a lugar nenhum. Como a de Aimé Bompland, botânico e explorador francês, retratada pelo escritor Luiz Antônio Assis Brasil em seu novo romance, Figura na Sombra (L&PM, 264 páginas, R$ 39), que tem sessão de autógrafos na Feira do Livro de Porto Alegre no dia 10/11 às 19h.
Assis Brasil, escritor e secretário de Estado da Cultura, encerra com Figura na Sombra uma série de quatro livros denominada Visitantes ao Sul, todos centrados em estrangeiros ou brasileiros de outras localidades que, em determinado momento de uma trajetória invariavelmente de conflito consigo mesmo, passaram pelo Rio Grande do Sul do século 19 e início do século 20. Os outros romances do ciclo são O Pintor de Retratos (2001), A Margem Imóvel do Rio (2003) e A Música Perdida (2006).
Os livros da série Visitantes ao Sul são atravessados não apenas por uma identidade temática, mas por uma reinvenção voluntária do próprio Assis Brasil como escritor. Depois de uma carreira marcada pela prosa flaubertiana e suntuosa de romances como Cães da Província ou a trilogia Um Castelo no Pampa, Assis embarcou em uma prosa concisa e contida, buscando uma concentração de termos e recursos capazes de expressar mais com menos. A frase rica e torneada deu lugar a descrições mais secas e áridas, um espelho da psique conturbada de seus protagonistas, todos homens que se descobrem aquém das expectativas de uma missão pessoal,oficial ou artística.
Em Figura na Sombra esse protagonista é uma figura real, o botânico francês Aimé Bonpland (1773 - 1858), companheiro de viagem do lendário explorador alemão Alexander von Humboldt em uma expedição que cruzou as Américas por cinco anos.Os dois naturalistas percorreram, de 1799 a 1804, localidades de Venezuela, Colômbia, Peru, Equador, Brasil, Cuba México e Estados Unidos, coletando amostras da vegetação e enviando caixas inteiras de coleções para a Europa. Na volta ao Velho Continente, Bompland descobre que seu talento é deixar-se ir, não a disciplina que Humboldt exige para a sistematização e publicação de seus relatos de viagem - uma tarefa fadada a durar ainda mais que a viagem em si.
O Bompland romantizado por Assis Brasil, sem a fome e o rigor de seu parceiro de empreitada, logo desvia-se, em uma inesperada paixão por Josefina, a esposa de Napoleão, que o convence a assumir a administração do jardim e da estufa da Malmaison, a residência da Imperatriz. Cada vez mais apático à medida que envelhece, Bompland renuncia progressivamente à ciência, retorna à América do Sul obcecado com a ideia de fazer fortuna com a erva-mate, empreendimento em que encontrará obstáculos que, assim como a glória, podem estar além de suas forças.