
A Polícia Federal (PF) aponta o empresário Antônio Carlos Camilo Antunes, 61 anos, conhecido como o “careca do INSS”, como a figura central do esquema de fraudes em aposentadorias e pensões investigado na Operação Sem Desconto.
Segundo relatório da PF, ele teria movimentado R$ 12,2 milhões em apenas 129 dias. Ao todo, ele teria recebido R$ 53,88 milhões de entidades associativas suspeitas de fazerem descontos irregulares nos benefícios de segurados do Instituto Nacional do Seguro Social.
As investigações mostram que Antunes era responsável por intermediar valores entre essas entidades e servidores públicos.
A PF diz que os repasses ocorriam no mesmo dia do recebimento, enquanto o empresário mantinha saldo baixo nas contas para evitar rastreamento.
Os recursos eram transferidos para ex-diretores e procuradores do INSS, como Virgílio Filho, André Fidelis e Alexandre Guimarães, que, juntos, teriam recebido mais de R$ 9 milhões em pagamentos diretos e indiretos, segundo O Globo.
Entenda o caso
Ao menos 22 empresas estão ligadas a Antunes, segundo a PF. Elas atuavam em áreas diversas — de consultoria e call center a locação de veículos e comércio varejista — e, segundo os investigadores, eram utilizadas para receber valores das associações e redistribuí-los entre servidores suspeitos.
Algumas dessas empresas são Sociedades de Propósito Específico (SPE), todas registradas no mesmo endereço em Brasília, com o mesmo telefone e atividade de compra e venda de imóveis.
Entre os bens ligados ao empresário estão 12 carros de luxo — incluindo modelos da Porsche, BMW, Jaguar e Audi — e imóveis em São Paulo e Brasília, como uma casa no Lago Sul comprada à vista por R$ 3,3 milhões. A PF também identificou movimentações imobiliárias sucessivas, em menos de seis meses, que somaram R$ 353 milhões.
Além disso, o nome de Antunes aparece como representante legal de uma empresa sediada nas Ilhas Virgens Britânicas, o que levanta suspeitas sobre a criação de uma offshore para blindagem patrimonial.
Atuação como lobista
De acordo com a PF, o empresário recebia valores de entidades como CPBA, AP Brasil, Cebap, Unaspub e Asabasp — muitas delas beneficiadas com os acordos de cooperação técnica junto ao INSS.
Ele possuía procurações que lhe davam poderes para firmar ou manter esses convênios com o órgão federal em nome das associações, que então descontavam mensalidades diretamente das aposentadorias dos beneficiários.
Quem é o "careca do INSS"?
Apesar do nome, Antunes nunca foi servidor do INSS, mas é apontado como lobista e operador financeiro das entidades envolvidas.
No LinkedIn, ele se apresenta como executivo do setor de saúde, com passagens por laboratórios e planos de saúde, segundo informações do jornal O Globo.
Ainda, aponta ter sido superintendente de marketing e comercial, além de diretor de uma empresa de consultoria ligada à indústria farmacêutica.
Em 2022, chegou a doar R$ 1 para a campanha de Jair Bolsonaro (PL), conforme registros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O CPF usado na doação é o mesmo citado nas decisões da Justiça Federal sobre a investigação.
Movimentações acima da renda declarada
A renda declarada de Antunes é de R$ 24,5 mil mensais e o patrimônio estimado fica entre R$ 1 milhão e R$ 5 milhões.
No entanto, as movimentações em contas bancárias apontadas pela PF são significativamente superiores.
“As participações societárias e a capacidade financeira declarada são desproporcionais às quantias movimentadas”, diz trecho do relatório policial.
Uma das empresas controladas por ele, por exemplo, recebeu sozinha R$ 11,9 milhões de uma das associações entre agosto de 2023 e abril de 2024.
Os investigadores suspeitam que ele tenha usado nomes de terceiros, incluindo familiares de servidores, para movimentar os valores e dificultar a identificação da origem e do destino final dos recursos desviados.
O que diz a defesa?
A defesa de Antunes nega todas as acusações e afirma que ele é inocente.
“A defesa confia plenamente na apuração dos elementos constantes nos autos e na atuação das instituições do Estado Democrático de Direito. Ao longo do processo, a inocência de Antonio será devidamente comprovada", diz um trecho da nota enviada ao O Globo.
"Operação Sem Desconto"
Deflagrada pela Polícia Federal (PF) e pela Controladoria-Geral da União (CGU), a operação Sem Desconto revelou um esquema fraudulento no Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), que descontou cerca de R$ 7,99 bilhões em benefícios de aposentados e pensionistas entre 2019 e 2024.
A fraude envolveu funcionários, diretores e ao menos 11 entidades associativas.
O inquérito aponta que ex-diretores do INSS e pessoas próximas a eles receberam mais de R$ 17 milhões em transferências oriundas de suspeitos de intermediar o contato com as associações, apurou o jornal O Globo.
Um dos beneficiados pelo esquema seria Virgílio Oliveira Filho, procurador do INSS, que teria recebido R$ 11.997.602,70. O então diretor, afastado do cargo pela Justiça no dia da operação, recebeu um carro de luxo avaliado em R$ 500 mil, que foi transferido para a esposa dele.
Como funcionava o esquema
Segurados tinham mensalidade descontada por entidades que representam aposentados e pensionistas conveniados com o INSS em troca de benefícios, como auxílios funerários, odontológicos e psicológicos, além de colônias de férias, academia e consultoria jurídica.
Isso ocorria de forma regular, desde que o beneficiário estivesse de acordo e a conveniada agisse conforme a lei. No entanto, alguns aposentados e pensionistas do INSS tinham descontos mensais indevidos.
O valor seria cobrado como se eles fossem membros regulares de associações de aposentados e estivessem cientes dessas retiradas de valores. No entanto, eles não haviam se associado e sequer autorizado esses descontos.
O esquema era amplo e envolvia corretores, associações de aposentados e o vazamento de informações pessoais de segurados. A prática fraudulenta foi detalhada em série de reportagens do Grupo de Investigação da RBS (GDI).
Durante a operação, o presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, foi afastado e posteriormente demitido do cargo. Além dele, outros cinco servidores públicos — a maioria com vínculos diretos com o instituto — também foram afastados de suas funções.
Servidores afastados
Stefanutto, ex-presidente do INSS, é servidor de carreira desde 2000. Ele foi filiado ao PSB até recentemente, estando atualmente no PDT — partido de Carlos Lupi, responsável por sua indicação ao cargo.
Os outros cinco afastados cautelarmente por decisão judicial são:
- Virgílio Antônio Ribeiro de Oliveira Filho, procurador-geral do INSS
- Giovani Batista Fassarella Spiecker, coordenador-geral de Suporte ao Atendimento ao Cliente
- Vanderlei Barbosa dos Santos, diretor de Benefícios e Relacionamento com o Cidadão
- Jacimar Fonseca da Silva, coordenador-geral de Pagamentos e Benefícios
Um sexto servidor, que colaborava com as fraudes, não teve o nome divulgado.