
A Polícia Federal intimou o atual diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Luiz Fernando Corrêa, para depor na próxima quinta-feira (17) sobre supostas espionagens irregulares feitas pelo órgão. Alessandro Moretti, ex-número 2 da Abin, também deve falar no mesmo dia. As informações são do jornal Folha de S. Paulo.
As investigações sobre o caso que ficou conhecido como "Abin paralela" revelaram que um grupo de policiais, servidores e funcionários da agência de inteligência constituiu uma organização criminosa para monitorar pessoas e autoridades públicas (veja quem abaixo), invadindo celulares e computadores.
A estrutura também atuaria para blindar os filhos do ex-presidente Jair Bolsonaro em processos judiciais, atacar a credibilidade do sistema eleitoral e produzir desinformação. Os principais investigados são o vereador Carlos Bolsonaro e o ex-diretor da Abin Alexandre Ramagem.
Em meio à repercussão do caso, Moretti, então número dois da Abin, foi exonerado do cargo pelo presidente Lula.
Supeita sobre a atual gestão
Em 2024, a Procuradoria-Geral da República (PGR) e o ministro Alexandre de Moraes, do STF, mantiveram sob suspeita a atual gestão da Abin nesta fase da operação. Moraes negou o compartilhamento das investigações da PF com a corregedoria da agência, alegando possível resistência interna.
A decisão gerou desconfiança entre servidores da Abin sobre uma possível investigação da cúpula por obstrução de Justiça. A PF destacou que o atual diretor-geral, Luiz Fernando Corrêa, participou de reunião onde se afirmou que a apuração teria "fundo político", antes de assumir o cargo oficialmente.
A corporação também não encontrou norma que autorizasse o compartilhamento de informações sigilosas com pessoas externas. A atual direção da Abin nega irregularidades e afirma colaborar com as investigações. Em nota, disse que Corrêa está à disposição das autoridades.
A PF também abriu inquérito para apurar vazamento de informações da operação, após reportagem revelar possível espionagem da Abin contra autoridades paraguaias, relacionada à disputa sobre a usina de Itaipu. O governo Lula afirmou que a ação foi autorizada na gestão Bolsonaro e cancelada em março de 2023 pela nova direção.
Entenda
A Abin é o órgão principal do Sistema Brasileiro de Inteligência (Sisbin) e tem como função conceder informações estratégicas e confiáveis ao Palácio do Planalto. Os informes são enviados ao Executivo por meio de relatórios, com a finalidade de evitar possíveis ameaças ao Estado democrático de direito e à soberania nacional.
De acordo com investigadores da PF, no governo passado, foi instalada uma "Abin paralela" para monitorar pessoas consideradas adversárias de Bolsonaro e atuar por interesses políticos e pessoais do ex-presidente e de seus filhos.
O grupo instalado na Abin teria usado um "software intrusivo na infraestrutura crítica de telefonia brasileira" para rastrear celulares "reiteradas vezes". Os crimes teriam sido praticados sob o governo Bolsonaro. À época, o órgão era comandado por Alexandre Ramagem.
O sistema de monitoramento é capaz de detectar um indivíduo com base na localização de aparelhos que usam as redes 2G, 3G e 4G. Para encontrar o alvo, basta digitar o número do seu contato telefônico no programa e acompanhar em um mapa a última posição.
Desenvolvido pela empresa israelense Cognyte (ex-Verint), o FirstMile se baseia em torres de telecomunicações instaladas em diferentes regiões para captar os dados de cada aparelho telefônico e, então, devolver o histórico de deslocamento do dono do celular.
Durante os três primeiros anos do governo Bolsonaro, a Abin teria usado, sem qualquer protocolo oficial, a ferramenta FirstMile para monitorar os passos de até 10 mil proprietários de celulares a cada 12 meses.
Segundo a PF, foram monitorados:
- Poder Judiciário: ministros Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Luís Roberto Barroso e Luiz Fux, todos do STF.
- Poder Legislativo: deputados Arthur Lira, presidente da Câmara, Rodrigo Maia (então presidente da Câmara), Kim Kataguiri e Joice Hasselmann; senadores Alessandro Vieira, Omar Aziz, Renan Calheiros e Randolfe Rodrigues.
- Poder Executivo: ex-governador de São Paulo, João Dória, servidores do Ibama Hugo Ferreira Netto Loss e Roberto Cabral Borges, auditores da Receita Christiano José Paes Leme Botelho, Cleber Homen da Silva e José Pereira de Barros Neto.
- Jornalistas: Mônica Bergamo, Vera Magalhães, Luiza Alves Bandeira e Pedro Cesar Batista.