O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) formou maioria (oito votos) para arquivar uma reclamação contra o procurador Deltan Dallagnol por ter divulgado nas redes sociais, em junho, uma notícia que continha informações sigilosas de uma delação que atingia a senadora Kátia Abreu (PDT-TO).
A senadora levou ao conselho uma reclamação disciplinar por causa do episódio. O corregedor, Orlando Rochadel, já havia decidido sozinho pelo arquivamento. Kátia recorreu, e o plenário do CNMP formou maioria, nesta terça-feira (27), para encerrar o procedimento.
A decisão, no entanto, acabou sendo suspensa porque um dos conselheiros, Erick Venâncio, pediu vista (mais tempo para analisar o caso).
Três membros do CNMP, então, quiseram adiantar seus votos para, desde já, formar a maioria pelo arquivamento. Entre os que adiantaram seus votos estava a procuradora-geral, Raquel Dodge. O placar parcial está em 8 a 3— no total são 14 votos.
No entendimento da maioria dos conselheiros, Deltan não cometeu falta disciplinar ao ter compartilhado um link de uma reportagem de jornal e reproduzido um trecho dela.
O relator da reclamação, Luiz Fernando Bandeira de Mello Filho, havia apontado indícios de que Deltan descumpriu os deveres de guardar segredo sobre assunto sigiloso, de desempenhar com zelo suas funções e de guardar o decoro pessoal. A sanção prevista para essas faltas era a de censura.
Bandeira considerou, em seu voto, que o simples ato de compartilhar a matéria não significa que Deltan foi o responsável pelo vazamento da delação.
No entanto, afirmou, "ao compartilhar a notícia, notadamente pela condição de coordenador da força-tarefa da Lava-Jato, o requerido (Deltan) atestou perante a opinião pública a veracidade da matéria, reforçando e difundindo informação que deveria ser sigilosa".
A divergência foi aberta pelo corregedor Rochadel, que afirmou que Deltan se limitou a compartilhar um link e a transcrever, na postagem, um trecho da própria notícia.
— A mera reprodução não configura em si violação do dever de guardar decoro pessoal —disse o corregedor.
A defesa de Deltan, feita pelo advogado Alexandre Vitorino Silva e pelo presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Fábio George Cruz da Nóbrega, sustentou que a liberdade de expressão existe para promover um "livre mercado de ideias" e que o procurador se limitou a compartilhar um link.
A defesa também refutou que Deltan tenham ampliado o alcance da notícia, publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, porque o periódico já é de grande circulação.
A reportagem em questão era sobre um suposto caixa dois de R$ 500 mil pago a Kátia Abreu, conforme delatado pelos ex-executivos da Odebrecht Cláudio Melo, Fernando Reis e Mário Amaro.
Nenhum dos casos que estavam na pauta do CNMP desta terça tinha relação com as mensagens vazadas pelo site The Intercept Brasil, mas há pressão para que o órgão, desde já, passe a punir eventuais abusos.
Dois outros procedimentos tiveram sua análise adiada.
O primeiro, em estágio avançado, resultou de uma entrevista concedida à rádio CBN em que o procurador fez críticas a membros do Supremo Tribunal Federal. No domingo (25), Deltan obteve uma liminar na Justiça Federal em Curitiba para adiar esse julgamento.
O segundo é uma reclamação apresentada pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL) que acusa Deltan de ter tido atuação político-partidária que interferiu nas eleições de 2018 e na escolha do presidente do Senado, em fevereiro deste ano.
Ainda não há data para que esses casos sejam julgados pelo conselho.