No epicentro do mais recente terremoto político que chacoalha o Brasil, o Grupo JBS teve na última década um crescimento meteórico impulsionado pela proximidade com o poder. O negócio de carnes, que nasceu como um pequeno açougue em Anápolis (GO), em 1953, criado pelo pai dos irmãos hoje à frente do conglomerado, até o início da década de 1990 se resumia a um frigorífico de 60 funcionários. Alimentado a dinheiro farto do BNDES, tornou-se a maior processadora de proteína animal do mundo e dona do maior faturamento entre as empresas privadas brasileiras – R$ 170 bilhões ano passado.
O negócio comandado pelos irmãos Wesley e Joesley Batista começou a ganhar corpo há cerca de 20 anos. À época ainda chamada Friboi, adquiriu concorrentes menores e, a partir de 2007, passa a chamar atenção, na gestão Lula, quando o grupo foi um dos escolhidos da chamada política de campeãs nacionais, empresas que teriam a ajuda do governo para serem competidoras internacionalmente.
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Depois de 2007, quando abriram o capital na bolsa, não faltou dinheiro para o apetite do grupo. Nos dois anos seguintes, o BNDES engordou com R$ 8,3 bilhões, por meio da compra de ações, e outros R$ 2 bilhões em crédito o cofre do JBS – sigla que faz alusão às iniciais do patriarca, José Batista Sobrinho. Com o caixa robusto, partiu para uma série de aquisições no Brasil e no Exterior. Nos Estados Unidos, arrematou ícones como o Swift, fundado em 1885, e a Pilgrim's Pride, maior produtora americana de frango fresco e processado. Ao mesmo tempo, passavam a controlar o Bertin, um dos maiores frigoríficos brasileiros da época, e começaram a entrar em outros negócios ligados ou não a carnes, se espalhando pela América do Sul, do Norte, Europa e Oceania.
Para um conhecedor do setor que pede para não identificado, a estratégia do BNDES de aumentar a concentração dos frigoríficos começou certa, para organizar melhor e dar musculatura ao setor, mas virou o fio ao escolher poucas empresas para serem as vencedoras.
– Não foi mantido um sistema de concorrência saudável, e o fato é que se criou um grupo que não ficou apenas voltado para a alimentação. Então, isso gera dúvidas sobre como foi financiado. E, para viabilizar isso, é preciso criar caminhos especiais – diz o especialista, referindo-se a relações pouco republicanas.
Junto ao crescimento rápido, vieram os rumores e o nariz torcido de concorrentes que se consideravam preteridos. Um dos boatos mais recorrentes era de que o filho do ex-presidente Lula, o Lulinha, seria sócio oculto da empresa. Cada vez mais ousado, o conglomerado liderado pelos irmãos Batista partiu para a aquisição e criação de empresas em outros setores, também com negócios polêmicos. Um deles é produtora de Celulose Eldorado, instalada em Mato Grosso do Sul, que também recebeu generosos R$ 4 bilhões do BNDES e aportes de fundos de pensão de estatais federais, como o Petros. O grupo também criou o Banco Original, que foi presidido pelo atual ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, posto que deixou para se juntar ao governo Temer. Em 2015, quando a Lava-Jato já provocava estragos na saúde financeira das empreiteiras, comprou a Alpargatas, dona da marca de sandálias Havaianas, da Camargo Corrêa. Coincidência ou não, o grupo se consolidou como um dos maiores doadores para campanhas eleitorais no país.
Além de fazer Temer balançar, Joesley e Wesley tiveram de enfrentar outras crises nos últimos meses desencadeadas pelas operações da Polícia Federal Carne Fraca e Bullish. A primeira investigou irregularidades na qualidade dos alimentos e corrupção e a segunda, fraudes em empréstimos do BNDES. Se o grupo balançar, pode causar problemas ao setor onde se originou. Fruto da concentração que beneficiou o grupo.
– Se, por um acaso, chegarem a um patamar de recuperação judicial ou algo mais grave, muitas regiões (em que os pecuaristas) que dependem basicamente deles vão ter problemas – diz a consultora de pecuária Lygia Pimentel, diretora da Agrifatto.
Uma turbulência na JBS não tem o mesmo poder avassalador da paralisia da Petrobras, mas o escândalo que deixou embretado o presidente Temer faz, pela via política, o país mergulhar em mais incertezas que tendem a recrudescer a crise econômica.
Negócios no Rio Grande do Sul
Foi o segmento de frango e suínos que fez a JBS entrar no Rio Grande do Sul. O ingresso ocorreu em 2012, quando grupo começou a assumir os negócios da Doux Frangosul, sediada em Montenegro, à época em crise. Hoje, as unidades da marca Seara estão espalhadas por outras nove cidades. Há ainda um centro de distribuição em Nova Santa Rita e uma planta de couros em Montenegro.
Uma década atrás, a empresa teve plano de construir abatedouro de bovinos em São Borja. A empresa desistiu do negócio após a troca de governo no Estado. Também havia resistência dos frigoríficos gaúchos. A unidade teria capacidade para 1,2 mil animais por dia, com investimento de até US$ 80 milhões.
– Toda a negociação foi feita pelo Júnior – lembra o ex-prefeito de São Borja, Mariovane Weiss, referindo-se a José Bastista Júnior, o mais velho dos irmãos, que se desligou do frigorífico.
Outro negócio que envolveu uma empresa gaúcha foi a compra do Banco Matone. A fusão com o braço financeiro do grupo deu origem ao Banco Original.
PERFIL DA GIGANTE
– Maior processadora de carne do mundo
– Maior faturamento entre as empresas privadas brasileiras. No ano passado, receita chegou a R$ 170 bilhões
– Tem mais de 220 unidades no mundo e capacidade para processar, por dia, 80 mil bovinos, 14 milhões de aves, 110 mil suínos e 100 mil peças de couro
– Conta com mais de 230 mil colaboradores
– É dona de marcas como Seara, Swift, Friboi, Doriana, LeBon, Frangosul, Moy Park, Cabana LasLilas, Pilgrim's, Primo, Gold KistFarms, Pierce e 1855, entre outras
– Os produtos chegam à mesa de 300 mil clientes em mais de 150 países
DIVISÃO NAS CARNES
JBS Mercosul
– Produção de carne bovina, confinamentos, couros e negócios relacionados (biodiesel, colágeno, produtos para higiene, entre outros
Onde atua: Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai. A operação de Couros da JBS Mercosul ainda conta com operações em Vietnã, China, México e Alemanha
Seara
– Produção de carne de frango, suína e alimentos preparados
Onde atua: Brasil.
JBS Europa
– Produção de carne de frango, produtos preparados, incluindo carne curada
Onde atua: Reino Unido, Irlanda, Itália, França e Holanda
Bovinos JBS USA
– Produção de carne bovina e de cordeiro, confinamentos, couros e logística
Onde atua: Austrália, Canadá e Estados Unidos
Aves JBS USA (Pilgrim's Pride)
– Produção de carne de frango e de produtos preparados a base de aves.
Onde atua: Estados Unidos, México e Porto Rico.
Suínos JBS USA
– Produção de carne suína e de pratos prontos
Onde atua: Estados Unidos
COMPOSIÇÃO ACIONÁRIA
– FB Participações SA e Banco Original: 44,35%
– BNDESPar: 21,32%
– Caixa Econômica Federal: 4,92%
– Minoritários: 29,41%
O GUARDA-CHUVA
A holding da família, a J&F, detém ainda uma séria de negócios
– Vigor (laticínios)
– Flora (higiene pessoal e limpeza doméstica)
– Eldorado Brasil (celulose)
– Banco Original (banco)
– Floresta Agropecuária (criação de gado)
– J&F Oklahoma (pecuária nos EUA)
– Canal Rural (emissora dedicada ao agronegócio)
– Alpargatas S.A. (dona da marca de sandálias Havaianas)