Ao apresentar a proposta de reforma da Previdência, o governo federal pretende tirar do vermelho um sistema corroído por déficits bilionários no setor público e privado. No funcionalismo, o desequilíbrio ocorre tanto entre civis e militares. Na iniciativa privada, o rombo é causado pelas aposentadorias rurais.
Mas a proposta não inclui parte significativa do problema: os déficits da União na área militar e de Estados e municípios. Enquanto acena um ajuste nas Forças Armadas para 2017, o Planalto cobra ação semelhante de governadores e prefeitos.
No total, as contas da Previdência (sem Estados e municípios) tiveram resultado negativo de R$ 161,7 bilhões no ano passado – cerca de 13% da arrecadação federal. Do total do déficit, 45% vieram do pagamento aos servidores federais (R$ 72,5 bilhões), que representam 3,6% dos aposentados e pensionistas remunerados pela União.
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No setor privado, enquanto os trabalhadores urbanos tiveram superávit de R$ 5,5 bilhões em 2015, o campo registrou déficit de R$ 94,7 bilhões. Se nenhuma medida for tomada, projeções conservadoras do Tesouro Nacional apontam para, ao final de 2017, rombo de R$ 260 bilhões.
Esse desequilíbrio é causado principalmente pelas regras dos servidores públicos e dos trabalhadores rurais. No campo, a soma das contribuições totaliza 2% da arrecadação. Em contrapartida, o setor responde por 22,5% das despesas e concentra um terço dos beneficiários.
O desajuste também é expressivo entre os militares. Os 359 mil servidores das Forças Armadas contribuíram com R$ 2,6 bilhões no ano passado. Essa receita ficou longe dos R$ 35 bilhões necessários para pagar aposentadorias e pensões de 296 mil beneficiários. A diferença corresponde a 44% do déficit da Previdência do funcionalismo federal, embora os militares correspondam a 30% dos beneficiários.
Além disso, o governo alterou a proposta de reforma para agradar militares e permitir que eles acumulem aposentadorias e pensões. O texto original proibia o acúmulo a todos os regimes. Na versão entregue ao Congresso, militares, bombeiros e policiais militares ficaram de fora.
A categoria ostenta o maior déficit per capita (por pessoa) de todo o sistema. Para quitar as aposentadorias militares, faltou R$ 109 mil por servidor no ano passado. Entre os servidores civis, a diferença é de R$ 58 mil e, na iniciativa privada (urbano e rural), de R$ 3,4 mil.
– Estranhei a ausência das Forças Armadas na reforma. Não tem sentido algum alterar as regras de todos os outros setores e não mexer na Previdência mais cara de todas – diz o ex-secretário de políticas de previdência social e consultor de orçamento da Câmara, Leonardo Rolim.
Incomodado com as críticas, o ministro da Defesa, Raul Jungmann, negou que há privilégios.
– Teria se os militares ficassem fora, mas não vão ficar. Estão prontos para dar a sua contribuição de acordo com as suas singularidades – reagiu Jungmann.
No setor privado, até o ano passado os trabalhadores urbanos vinham ajudando a diminuir o déficit (tinham superávit). Contudo, com a crise e o desemprego, a estimativa é de que 2016 feche R$ 40 bilhões no negativo.