Garantir o acesso, a descentralização de atividades e o fomento da produção cultural local é, historicamente, um dos desafios que todo prefeito recebe ao se eleger. Em Caxias do Sul não é diferente. Em 2008, a cidade foi considerada Capital Brasileira da Cultura, alcançando projeção nacional. Contudo, o setor tem atravessado períodos de menor investimento.
Em 2016, por exemplo, a prefeitura destinou R$ 2 milhões para o fomento de projetos via Financiamento da Arte e Cultura Caxiense (Financiarte), uma das leis que viabiliza projetos em Caxias. No ano seguinte, porém, o orçamento caiu 70%, sendo destinados R$ 600 mil ao Financiarte.
Em junho deste ano a lei recebeu alterações, com a novidade de um valor mínimo: 17,9 mil Valores de Referência Municipal (VRM). Neste ano, o valor corresponde a R$ 799.593,00.
Das necessidades do setor, apontadas por produtores locais, está a identificação de quem faz, o que produz, quantas pessoas estão envolvidas e quanto movimenta financeiramente o setor cultural para que políticas públicas sejam implementadas de forma mais assertiva.
Para entender quais devem ser as prioridades na área nos próximos anos em Caxias do Sul, o Pioneiro entrevistou dois especialistas. A reportagem também buscou as diretrizes e prioridades dos quatro candidatos à prefeitura, que você pode ler a seguir.
O que dizem os especialistas
Para Dani Ribas, diretora da Sonar Cultural Consultoria e Doutora em Sociologia pela Unicamp, a cultura precisa ser encarada como uma prioridade para tornar-se importante no contexto de cidade.
— Se a rua está desocupada e não tem atividades culturais acontecendo, significa que ela se torna uma rua perigosa para a população andar. Se a cultura ocupa as ruas, não há medo, porque ela se torna o palco da convivência coletiva — pontua Dani.
Para ela, articular políticas públicas de outras áreas com a cultura transformará o setor em uma prioridade.
— Outro ponto é você fazer política cultural comparada, e isso conseguem gestores experientes na área da cultura. A maioria das soluções que a gente busca já estão sendo implementadas por outros lugares.
A prioridade das políticas públicas, de acordo com Dani, deve ser os cidadãos. Além do público espectador, também é necessário ter atenção aos produtores culturais.
— A secretaria de cultura deve financiar as atividades artísticas dos artistas para prover aos cidadãos que querem assistir às atividades culturais o direito de assistirem. Como a prefeitura, nem o Estado, nem o país são produtores culturais. Eles precisam financiar as atividades artísticas dos artistas para promover o direito à cultura — resume.
Para Dani, o financiamento dessas atividades culturais e artísticas é responsável por prover direito ao acesso à cultura para todos os cidadãos.
— Se a gente pensar que todo mundo tem o direito de ir e vir e de se comunicar, a cultura está intimamente relacionada a isso. Se você não tem acesso a repertório cultural provido pelas atividades artísticas, você não tem acesso a uma comunicação plena. Você não consegue se comunicar plenamente através da sua língua, por exemplo. Mesmo que a gente tenha país e Estado, é nos municípios que a cultura acontece — justifica.
Para Jorge Piqué, professor de língua e literatura grega, fundador de UrbsNova – Agência de Design Social e Inovação e criador do Distrito Criativo de Porto Alegre, Caxias do Sul tem plena capacidade de criar e manter territórios criativos que fortaleçam o setor cultural e artístico.
— Caxias é uma cidade muito interessante, porque é uma cidade industrial. Minha opinião é que a economia criativa só funciona de verdade como uma camada sobre a atividade industrial. Produtos de economia criativa, arte, cultura, design, gastronomia, funcionam melhor quando você tem já um certo desenvolvimento. E a indústria é que dá esse desenvolvimento — contextualiza.
Piqué, que desenvolve um estudo para tornar Caxias um território criativo, destaca que um dos pontos chaves a ser considerado é a ocupação da Maesa. A Estação Férrea e o centro são outros locais citados pelo pesquisador, que destaca ainda que a proximidade entre eles facilita a criação de um ecossistema criativo.
— A Estação Férrea já está ocupada pela prefeitura e é muito interessante. Na parte da frente, tem vários locais que a gente fez um mapeamento, em que se poderia ter um território criativo importante ali. Tem um caminho relativamente simples para fazer ali. Essa região está muito próxima do centro que, por sua vez, está muito próximo da Maesa. Se pensar no longo prazo, você pode ver toda essa região com galerias de arte, escritórios de arquitetura, escritórios de design, restaurantes, escolas de arte, de dança, de música... — destaca.
Diferentemente de outros municípios, o território criativo que Caxias poderia ter tem muito mais condições de ser mais conhecido e mais acessado pela população, explica Piqué.
— A estratégia é sempre partir do que existe, reunir as qualidades, reconhecer a importância de quem está lá, de quem está trabalhando e dar visibilidade. Não adianta você querer criar um Território Criativo quando não tem nada, você tem que procurar um melhor lugar, e essa região em frente à Estação Férrea é. Um dos nossos valores é o patrimônio cultural, os prédios antigos, as praças e o patrimônio ambiental. Os locais particulares e mesmo atividades da prefeitura podem se somar numa coisa maior — destaca.
O que dizem os candidatos
Adiló Didomenico (PSDB)
Sabemos que a cultura é uma força transformadora da sociedade. Nós reformulamos a Lei do Financiarte, garantindo investimento mínimo de R$ 800 mil e desburocratizamos os editais de fomento, ampliando o acesso. Museus passaram a abrir aos domingos e foi criado o site Agenda Cultura Caxias. Encaminhamos a concessão do Mercado Público da Maesa, com o edital de licitação a ser publicado em breve. A retomada do Carnaval, o Natal na Praça Dante Alighieri e a criação do Coro Sênior Municipal são destaques importantes. Neste governo foi elaborado o novo Plano Municipal de Cultura, atendendo demandas da classe artística. Iniciamos as obras de revitalização do Largo da Estação Férrea, que vai transformar o local. No próximo governo, vamos ampliar investimentos nos mecanismos de fomento, consolidar o programa Caxias Criativa, de economia criativa, e fortalecer a cultura na zona rural. Além disso, será instituída a Lei Municipal de Cultura Viva, que reforça o sistema de cultura no município.
Denise Pessôa (PT)
A cultura é um importante instrumento de transformação de vidas. No nosso governo, vamos resgatar as políticas culturais no município. Para isso, implementaremos a Política Municipal de Cultura Viva, para estabelecer uma rede de atenção básica da cultura, contemplando a inclusão e a diversidade, fortalecendo os Pontos de Cultura já existentes e criando novos em regiões ainda não atendidas. Nesses Pontos nos bairros, vamos oferecer oficinas de teatro, dança, artes visuais e outras áreas culturais. Também vamos fazer da Maesa um grande centro cultural, com muitas alternativas. A Festa da Uva vai ser modernizada, mas mantendo as tradições, sempre em diálogo com a comunidade. É preciso também valorizar o tradicionalismo, fomentando a cultura gaúcha que é muito forte no nosso município e está presente nos bairros e distritos. Vamos aumentar os recursos do Financiarte e desburocratizar o acesso aos recursos. Conosco na prefeitura, Caxias será novamente capital nacional da cultura.
Felipe Gremelmaier (MDB)
A cultura terá muita atenção no meu governo, porque além de trazer mais cor e alegria para a cidade, ela é geradora de emprego e renda, e impacta na educação e na saúde dos cidadãos. Ela afasta jovens da marginalização e contribui na sanidade mental, evitando a depressão, o que é comprovado cientificamente.
Incrementarei o valor do Financiarte para ampliar o acesso, criarei mais oportunidades e potencializarei a geração de emprego e renda nas mais diversas manifestações culturais. Ampliarei os programas de arte e cultura popular e o incentivo à leitura, com reativação de bibliotecas comunitárias nos bairros.
Os mecanismos de fomento dos projetos serão desburocratizados. Valorizarei o artesanato local como gerador de economia e usarei centros comunitários para atividades de cultura popular no contra turno das crianças. Transformarei a Avenida Júlio em corredor cultural.
O Carnaval de Rua, os blocos e os festivais de música, grafite, dança, tradicionalismo e outras atividades terão mais apoio. Caxias retomará o protagonismo de quando teve o selo de Capital Brasileira da Cultura, conquista do governo Sartori.
Maurício Scalco (PL)
Nosso objetivo é criar um ambiente vibrante e inclusivo para a cultura local, alinhando nossas ações ao Plano Municipal de Cultura. Implementaremos iniciativas voltadas para o setor, buscando recursos estaduais e federais que viabilizem novos investimentos. É essencial respeitar as diretrizes desse plano e oferecer espaços culturais acessíveis que incentivem a participação da comunidade.
Executaremos o plano de ocupação da Maesa, transformando o espaço em um polo cultural dinâmico e atraente. A preservação do patrimônio cultural e histórico será uma prioridade, assim como a reforma de espaços que, há anos, carecem de investimento público.
Fomentar a produção artística local é fundamental. Por meio de editais de incentivo e parcerias estratégicas, ampliaremos eventos culturais gratuitos em espaços públicos, democratizando o acesso à cultura.
Na economia criativa, criaremos incubadoras de projetos culturais e estimularemos clubes de mães e artesãos a valorizarem o artesanato local. O Espaço do Artesanato Caxiense será um ponto de comercialização e capacitação, reforçando nossa identidade cultural.