Na semana do Dia da Consciência Negra, os vereadores de Caxias do Sul aprovaram por unanimidade — com ausência justificada da vereadora Tatiane Frizzo (PSDB) — o projeto de lei que cria o dossiê da violência contra a população negra do município. A ideia do vereador Lucas Caregnato (PT), autor da proposta, é fazer um levantamento de dados que possam resultar em políticas públicas e novas leis para combater o racismo. O texto segue para sanção e regulamentação do prefeito Adiló Didomenico (PSDB).
Com inspiração em um projeto da vereadora do Rio de Janeiro assassinada em 2018, Marielle Franco, Caregnato explicou no plenário, durante a votação, que o próprio crime cometido contra a parlamentar carioca é um exemplo que justifica a necessidade da criação deste dossiê. Em relação a Caxias, o petista contextualiza que o racismo estrutural está enraizado no município desde a fundação. Por isso, o levantamento de dados proposto deve reunir dados de todos os tipos de violência (física, sexual, psicológica, moral, social e econômica) contra a população negra da cidade.
— É um desafio grande. Falta informação para que as pessoas afrodescendentes, ao sofrerem algum tipo de violência, enquadrá-las como racismo. Talvez, ao juntar todas as informações, o município perceba que não temos nenhum caso de racismo, e aí poderemos chegar à conclusão de que essa realidade não visibiliza efetivamente o que acontece, pela falta de informação, e das pessoas não conseguirem compreender que aquilo que elas sofreram foi efetivamente racismo. É um processo longo, mas que nós precisamos construir — explica Caregnato.
A elaboração de dossiê ficará definida na regulamentação, que deve ser feita pelo Poder Executivo caso sancionado o projeto de lei. O que fica definido, no texto da proposta, é que serão feitos levantamentos estatísticos, de um período máximo dos últimos 12 meses, sobre casos de racismo, injúria racial, intolerância religiosa contra religiões de matriz africana, cachinas e mortes violentas cujas vítimas sejam negras. As informações deverão ser divulgadas no site da prefeitura para acesso de qualquer cidadão.
— Cabe ao poder Executivo regulamentar a legislação, estabelecendo as formas de aplicá-la. Os dados serão provenientes das secretarias da Saúde, de Segurança Pública e da Fundação de Assistência Social (FAS). Aí o prefeito, na regulamentação, vai ter que especificar de onde serão esses dados, e se essas secretarias eventualmente vão ter que buscar de outros órgãos, como Guarda Municipal ou Brigada Militar, ou falar com as pessoas. Vamos aguardar a regulamentação do prefeito e vamos fiscalizar a organização e a publicidade desses dados — afirma o vereador.
Outros dossiês já existem
Um projeto semelhante que já existe em Caxias é o Dossiê da Mulher Caxiense, proposto pela então vereadora (atualmente deputada federal) Denise Pessôa (PT) e aprovado na Câmara em agosto de 2021. Em setembro de 2022, a prefeitura publicou decreto que regulamenta o dossiê, que prevê a publicação de informações sobre os atendimentos ofertados e realizados às mulheres em situação de violência no município, além de dados percentuais sobre os tipos de violência identificados nos atendimentos.
A divulgação é feita semestralmente com gráficos, a partir do trabalho realizado pelas secretarias de Segurança Pública e da Saúde, além da Coordenadoria da Mulher, Centro de Referência da Mulher (CRM) e da FAS. À época da regulamentação, o prefeito Adiló avaliou que este trabalho "tem papel fundamental para a sociedade".
É um processo longo, mas que nós precisamos construir.
LUCAS CAREGNATO
Vereador de Caxias do Sul pelo PT
Em agosto, o prefeito sancionou a criação de outro dossiê, o da violência contra a população LGBT+ em Caxias, também de autoria de Caregnato. A proposta é a mesma: realizar levantamentos estatísticos sobre vítimas de violência física, sexual, psicológica, moral ou patrimonial em função de gênero ou orientação sexual.
Combate à intolerância
Na última segunda-feira (20), data que marca o Dia da Consciência Negra no Brasil, a Câmara realizou solenidade para entrega da Medalha Zumbi dos Palmares para José Moreira da Rosa (titular da Coordenadoria de Promoção da Igualdade Étnico-Racial de Caxias do Sul e membro do Conselho Municipal da Comunidade Negra, o Comune), Patrícia Daniela da Silva (técnica de enfermagem do Hospital Geral e militante do Movimento Negro Unificado) e Viviane Carla da Cruz Andrade (atuante das causas sociais e comunitárias)
A honraria é concedida a cada dois anos aos caxienses que se destacam na defesa dos direitos humanos e da cidadania, no combate à discriminação e ao preconceito, na defesa da promoção da vida, na defesa das garantias individuais e da dignidade humana, na defesa da transformação e da evolução das relações de trabalho e na sociedade, e na inclusão social.
Ainda nesta semana, a Câmara deve votar o projeto de lei do vereador Caregnato que institui o Dia Municipal de Combate à Intolerância a Religiões de Matriz Africana. A primeira discussão do texto ocorreu nesta terça-feira (21), e a pauta deve retornar para segunda discussão e votação na sessão ordinária da próxima quinta (23). Se aprovada, a data deverá ser comemorada no dia 20 de janeiro.