O juiz Rudolf Carlos Reitz, da 3ª Vara Criminal de Caxias do Sul, agendou o interrogatório do vereador caxiense Sandro Fantinel (sem partido) para 28 de agosto. As testemunhas do caso também serão ouvidas durante audiência de instrução neste dia. Fantinel é réu pelo crime de racismo, após falas preconceituosas contra baianos no plenário da Câmara em 28 de fevereiro (relembre o caso abaixo). Os depoimentos estão programados para dois horários: primeiro às 14h, em que serão ouvidas as testemunhas indicadas na denúncia; depois, às 15h30min, para ouvir as testemunhas apontadas pela defesa e para o interrogatório do parlamentar. No despacho, Reitz também decidiu que não irá afastar Fantinel do cargo de vereador, como o Ministério Público (MP) havia solicitado na denúncia oferecida contra o parlamentar em 28 de março.
No despacho, Reitz argumenta que não há evidências de que o vereador esteja de alguma forma tentando evitar uma responsabilização criminal, nem há risco de que o fato seja repetido, como afirmou o MP na denúncia.
"Não há informes no momento que sinalizem risco de reprodução do fato considerado como típico descrito na denúncia ou outras infrações penais durante o andamento do processo, o que legitimaria a aplicação da medida cautelar (que seria o afastamento). Neste sentido, de eventual reprodução do fato, poderá ser de imediato reapreciada a questão atinente à aplicação da medida de afastamento", diz o texto.
Em função disso, a respeito do afastamento ou não, o juiz alega que a decisão deve ocorrer em sentença, "após regular exercício do contraditório e ampla defesa, e com a análise da prova a ser produzida pelas partes". Além disso, ele reforça que há um processo de cassação em andamento na Câmara de Vereadores de Caxias, que também pode culminar na perda do mandato de Fantinel.
Denúncia na Justiça
O vereador Sandro Fantinel foi denunciado pelo MP por crime de racismo. O anúncio foi feito em coletiva de imprensa na Promotoria de Justiça de Caxias do Sul.
— Conduta do denunciado foi enquadrada no crime de racismo, por ter praticado e incitado discriminação e preconceito em nível nacional, causando repulsa e constrangimento a um número indeterminado de pessoas — declarou a promotora Vanessa da Silva, na ocasião.
O MP pediu ao judiciário, na sentença final, que Fantinel seja condenado nas sanções previstas, com prisão pelo crime de racismo; que seja feito pagamento de indenização pelo dano moral coletivo; que seja determinada a perda da função pública.
A denúncia ocorreu após indiciamento de Fantinel por racismo pela Polícia Civil, em 13 de março. O crime de racismo prevê pena de dois a cinco anos de prisão.
Relembre o caso
Declarações preconceituosas na Câmara
- No dia 28 de fevereiro, na tribuna da Câmara de Vereadores de Caxias do Sul, Sandro Fantinel fez discurso se referindo aos trabalhadores baianos resgatados em situação análoga à escravidão em Bento Gonçalves. Na ocasião, ele sugeriu aos produtores locais que "não contratem mais aquela gente lá de cima", e disse que a "única cultura que (os baianos) têm é viver na praia tocando tambor".
Repercussão e abertura de processo de cassação
- As falas repercutiram nacionalmente, e geraram notas de repúdio inclusive dos governadores da Bahia, Jerônimo Rodrigues (PT), e do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB). Além disso, o parlamentar caxiense foi expulso do partido Patriota.
- Por causa das declarações, um processo de cassação contra Fantinel foi aberto na Câmara de Caxias dois dias depois do episódio, em 2 de março. No momento, a Comissão Processante está na fase final do processo, que é a elaboração do relatório com o parecer final favorável ou contrário a cassação. Na fase de instrução, foram ouvidos o próprio vereador Fantinel e a esposa dele, na condição de informante, além de nove testemunhas da defesa.
Três pedidos de indenização
- Há três ações contra Fantinel que pedem indenização do vereador por danos morais coletivos. Um dos processos foi aberto pelo próprio MP, que pede uma reparação no valor de R$ 300 mil, que seria destinado ao Fundo para Reconstituição de Bens Lesados.
- O Ministério Público Federal (MPF) protocolou um pedido de indenização contra Fantinel no valor de R$ 250 mil. Sobre as declarações, o MPF classificou o discurso do vereador como "preconceituoso, odioso, de caráter xenofóbico e discriminatório". Na ação civil pública, o procurador Fabiano de Moraes entendeu que o vereador colocou as vítimas como culpadas da situação em que se encontravam.
- O terceiro pedido de compensação financeira foi feito por quatro ONGs ligadas a movimentos sociais de combate ao racismo e dos direitos humanos. As entidades pedem uma indenização no valor de R$ 1 milhão do parlamentar, com objetivo de obter "reparação de danos morais coletivos e dano social infligidos à população pobre e à população negra do Brasil".
Investigações no MPT e PF
- O Ministério Público do Trabalho (MPT) também oficiou uma investigação contra o parlamentar, porque, na avaliação do órgão, nas falas ele foi xenofóbico e culpou os trabalhadores pela situação análoga à escravidão.
- À Polícia Federal, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, encaminhou para investigação do órgão um discurso de 17 de novembro de 2022 do vereador Fantinel no Legislativo caxiense, no qual ele afirma que "um ministro do Supremo Tribunal participou de uma orgia com crianças fora do Brasil". Para Dino, a fala configura crime contra autoridade federal.
Retorno de Fantinel à Câmara
- Após o episódio, o vereador apresentou atestado e ficou afastado da Câmara durante 21 dias. Ele retornou ao plenário, cabisbaixo, no dia 21 de março, e não se pronunciou na sessão. No dia seguinte, dia 22, Fantinel se inscreveu para participar do Grande Expediente, e teve o espaço de 10 minutos para se pronunciar. Na ocasião, o parlamentar pediu perdão aos baianos pelas declarações, afirmou que "errou porque é humano" e garantiu que vai "aceitar a condenação desde que ela seja feita por quem nunca errou".
- Mesmo com as investigações nas esferas política e criminal, Fantinel segue exercendo normalmente a função de vereador. Ele pode participar das sessões, apresentar projetos e votar. O vereador, inclusive, mesmo investigado na Câmara, foi sorteado para compor a comissão processante de outro parlamentar, Lucas Caregnato (PT), que também é investigado por quebra de decoro.