Uma moção de contrariedade ao tombamento federal da Maesa, assinada por pelo menos 14 vereadores, será protocolada nesta quinta-feira (13) na Câmara de Caxias do Sul. O texto será apresentado pelo vereador e líder de governo, Lucas Diel (PDT). No documento, os parlamentares argumentam que o processo de tornar o complexo em patrimônio histórico nacional retardaria em 10 a 20 anos a ocupação dos prédios pelo município, que atualmente tem projeto em debate para uma parceria público-privada (PPP) reformar e reabrir a Maesa ao público.
A movimentação na Câmara ocorre após a deputada federal Denise Pessôa (PT) ter formalizado pedido, no Ministério da Cultura e no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), para tombamento federal da Maesa como patrimônio histórico nacional. Ela teve encontros com o secretário executivo do ministério, Márcio Tavares, no dia 22 de março, e com o presidente do Iphan, Leandro Grass, na véspera.
A moção se divide em três aspectos principais. O primeiro se apoia no fator técnico, no qual os vereadores afirmam não haver necessidade de um reconhecimento nacional, já que a Maesa teria um valor histórico muito maior para Caxias do Sul e região do que para o país. Além disso, por já ser um patrimônio histórico do município, o complexo já foi avaliado por autoridades e órgãos da região, o que descarta a necessidade de uma nova avaliação por auditores estaduais e nacionais.
O segundo aspecto levantado pelos vereadores é histórico, no qual são recordados outros prédios de Caxias do Sul que passaram pelo processo de tombamento federal e que "retratam a burocracia que acomete as relações de trato público, mesmo que o mérito da ação seja importante". Eles recordam que o Complexo da antiga Cantina Antunes foi incorporado à União em 1984 e todo o projeto de ocupação da área foi concluído em 2001, onde atualmente é o Centro Municipal de Cultura Dr. Henrique Ordovás Filho.
"O tempo corrói o patrimônio físico e as lembranças que já existiram, dificultando situações que poderiam ter encaminhamentos mais simples, com ajuda da iniciativa privada, desde que respeitados alguns limites e observações dos órgãos fiscalizadores", diz o documento.
O terceiro e último fator apontado pelos vereadores se refere ao caráter político. No texto da moção, os parlamentares questionam o porquê da necessidade do tombamento federal neste momento em que se discute o projeto de ocupação da prefeitura de Caxias, que se encontra em período de consulta pública. Na avaliação deles, o pedido de tombamento junto ao Iphan e Ministério da Cultura é "repleto de oportunismo político e midiático".
Reconhecimento histórico e recursos da União
Segundo o Iphan, o processo de tombamento começa pelo pedido de abertura de processo. Após avaliação técnica preliminar, é submetido à deliberação dos órgãos responsáveis pela preservação. Caso seja aprovada a intenção de proteger um bem cultural ou natural, é expedida uma notificação ao seu proprietário. A partir disso, o bem já se encontra protegido legalmente contra destruições ou descaracterizações, até que seja tomada a decisão final. Ainda de acordo com o instituto, não existe um prazo determinado para a deliberação final de um processo de tombamento.
"Por se tratar de uma decisão importante e criteriosa, muitos estudos devem ser realizados para instrução do processo e, conforme sua complexidade, cada caso demandará prazos diferenciados", afirma o Iphan em seu site.
O superintendente do Iphan no Rio Grande do Sul, Rafael dos Passos, explica que o instituto pode fazer o tombamento provisório após reconhecimento e análise do protocolo. Depois, o processo vai para discussão de todos os critérios e para a fase de instrução, para então se tornar um tombamento permanente.
— Houve um documento protocolado com um primeiro pedido de tombamento, mas ainda não chegou para análise técnica. O Iphan, reconhecendo a importância, faz o tombamento provisório para depois elaborar a instrução. Nisso entra um ente importante que é a União, através do Iphan, para contribuir para um aprimoramento do projeto, seja concessão, ou para discutir outra forma de gestão do conjunto. Pode trazer uma diversidade de usos, que privilegiem a atividade cultural, por exemplo. Como tem um viés importante da própria indústria metalúrgica no Estado, seria necessário que o espaço tivesse um local de referência dessa história. Mas o tombamento provisório já começa a proteger o bem — destaca.
Além disso, o superintendente esclarece que o tombamento possibilita a destinação de recursos da União para aplicação no complexo, além de que o governo federal, através do instituto e do Ministério da Cultura, podem participar dos debates sobre uso e ocupação.
— Um tombamento nacional, do ponto de vista simbólico, vai reconhecer a importância da arquitetura e da história da indústria. O que deve ser trazido à tona é a importância da Eberle como uma das pioneiras na indústria metalúrgica do Rio Grande do Sul, quiçá do país. Do ponto de vista prático, traz possibilidades maiores de buscar recursos. Abre possibilidades de o Estado, o município e eventualmente até os concessionários buscarem recursos da União para restauro e conservação do edifício — detalha Rafael.
O que disseram
Para reconhecer a história de um prédio que marca o desenvolvimento não só de Caxias, mas a história da indústria no Brasil.
Denise Pessôa (PT-RS), deputada federal: "O pedido (de tombamento) é para reconhecer a história de um prédio que marca o desenvolvimento não só de Caxias, mas a história da indústria no Brasil. Sabemos de todo o valor histórico e arquitetônico do prédio da Maesa. A partir do tombamento nacional, conseguimos acessar recursos que apenas esses bens conseguem, é uma forma de facilitar e abrir portas para que a gente consiga implementar um dos maiores equipamentos culturais da nossa região. Sabemos a dificuldade de acessar recurso para implementar um equipamento cultural desta magnitude, então (o tombamento nacional) é uma forma de auxiliar a viabilizar este projeto (da prefeitura)."
A gente vê como um atraso, vai estancar qualquer processo de ocupação. Esse tombamento federal vem na contra mão.
Lucas Diel (PDT), vereador de Caxias do Sul: "Nós entendemos que é um momento muito inoportuno para este tombamento. Agora seria para esquecer a Maesa. É uma desvalorização de tudo o que foi feito pelo Conselho do Patrimônio Histórico de Caxias (Compahc). Já existe um tombamento municipal desde 2015, o que garante a preservação do patrimônio. Me parece que isso não está sendo levado em consideração por quem está propondo (o tombamento federal). A gente vê como um atraso, vai estancar qualquer processo de ocupação. Qualquer intervenção teria que passar por avaliações e isso demora muito tempo. A justificativa de que vão ser angariados recursos federais não procede porque se demora muito pra tombar, ainda mais para vir verbas. Esse tombamento vem na contramão."