A menos de um mês no cargo, Matheus Neres da Rocha assumiu a Secretaria de Parcerias Estratégicas no início de um mês decisivo para o futuro do complexo da Maesa, o principal projeto atualmente sob responsabilidade da pasta. É no dia 28 de abril que se encerra o período de consulta pública sobre o projeto de concessão patrocinada, uma parceria público-privada, apresentado pela prefeitura de Caxias do Sul para uso e gestão da edificação. A proposta foi divulgada no final de fevereiro, quando Rocha ainda não era secretário.
Desde sua chegada, ele participou das três audiências públicas realizadas sobre o tema da Maesa — a primeira como mero espectador, pois ainda não havia assumido a função. Nestes primeiros cerca de 20 dias na função, Matheus já pôde sentir o calor que cerca o debate do complexo, a partir de críticas e considerações sobre o projeto e o próprio Executivo. Contrários ao projeto da prefeitura defendem a criação de uma fundação pública de direito privado para gestão da Maesa, além de terem judicializado o projeto de PPP através de representação protocolada no Ministério Público e ação popular na Justiça, sob o argumento de que a lei que doou o empreendimento ao município não estaria sendo respeitada.
Em entrevista ao Pioneiro, o secretário de Parcerias discorre sobre as alternativas, fala do diálogo e ainda sobre os ataques que recebe por não ser de Caxias do Sul e, portanto, não conhecer a história e representatividade do complexo para a comunidade.
Confira a entrevista
Na audiência do dia 14 de abril, o senhor disse que o debate não se encerra com o fim da consulta pública. Como seguirá?
Matheus Neres da Rocha: Independente de qual seja o formato, qual seja o trabalho realizado ou qual gestão, todas tiveram ao menos um ponto em comum: a restauração dos blocos e dar uso, ocupação, levar a população a utilizar este local. Passado esse período (de consulta pública), o município tem a obrigação de responder a todas as considerações apresentadas, publicar ata das audiências públicas realizadas e elaborar um relatório. A municipalidade se debruça sobre este projeto e trabalha com todas as manifestações que foram feitas. Por que eu digo que o debate não se encerra? Porque ainda temos algumas etapas a serem percorridas, tanto no âmbito interno da administração, como também em instâncias como o poder Legislativo e o Tribunal de Contas do Estado. Nossa intenção é tentar contemplar uma multiplicidade de interesses dentro de um projeto como esse, arrendondar e deixar o projeto o mais adequado possível à política pública que se pretende executar, e aí sim trabalhamos com o projeto na Câmara.
Como vão avaliar e incorporar as sugestões?
Rocha: Já temos algumas ideias para tentar trabalhar em cima desse projeto. Na audiência do dia 18, foi apresentada... Não vou chamar de manifestação, de consideração, mas precisaria olhar com mais atenção o teor desses documentos. Ainda não os conheço, tive acesso somente à apresentação que foi feita (na audiência do dia 18 de abril). Mas seria mais uma proposta, que deve ser analisada com atenção, com respeito e com cuidado pela administração pública, e ter o endereçamento dessas análises explicitado, assim como todas as demais oriundas da audiência e da consulta.
Os críticos à proposta da prefeitura afirmam que a prefeitura não reconhece o projeto deles como uma proposta viável. Como a Secretaria de Parcerias avalia a situação?
Rocha: Não tinha conhecimento de um outro projeto, se ele existia ou não, ao menos aqui no Escritório de Parcerias a gente nunca teve conhecimento ou contato com um outro projeto. Eu digo projeto, de fato, com a formatação de todas as etapas. Como deve ser realizado, contratado, qual o prazo de execução, todas as etapas a serem percorridas. A gente entende que o modelo fundacional não entregaria a concepção das premissas que nós entendemos por necessárias lá no início do projeto. Existem pessoas que entendem que esse formato pode entregar um valor histórico-cultural e de desenvolvimento econômico, por determinado custo, melhor do que aquele que está sendo proposto. Nos cabe analisar o que se tem, para entendermos se de fato o que nós elaboramos produz menos valor do que essa outra opção, e, se assim o for, não há por que a gente não seguir por outro modelo. Dentro da nossa análise, na estruturação preliminar deste projeto, entendemos que esse formato de contratação (por meio de fundação pública de direito privado) não entregaria o mesmo valor e eficiência administrativa que a gente deseja para a restauração, ocupação e desenvolvimento desse projeto e da Maesa.
Qual a viabilidade de uma fundação para gestão da Maesa?
Rocha: A fundação trabalha com patrimônio incorporado, e o seu financiamento, a sua estrutura de alavancagem e de realização das obras, talvez viria somente de parcerias junto a entidades privadas e programas de incentivo à cultura. Até mesmo se fala em um eventual tombamento federal, que poderia facilitar a obtenção de recursos. Qual é a projeção disso? A gente entende que há uma série de incertezas com uma série de questões que encontramos num outro formato que nos dá uma viabilidade de implementação no restauro e ocupação do espaço. Isso é como nós analisamos o tema, então é importante entender o que é trazido dentro deste projeto, como foram feitas essas análises, que podem demonstrar eventual equívoco de nossa parte.
A conversa é muito boa para alguns esclarecimentos, não teria qualquer problema. Gostaria de uma conversa.
MATHEUS NERES DA ROCHA
Sobre conversar sobre alternativas com entidades comunitárias
Qual a vantagem de uma PPP em vez de uma fundação?
Rocha: O formato de contratação via PPP tem um alinhamento de incentivos muito interessante, o que não quer dizer que isso predomina sobre o fundacional. Quem executa o restauro e quem mantém o equipamento é a mesma pessoa. Então o parceiro tem o maior interesse do mundo em realizar o restauro de melhor qualidade, já que ele será obrigado a mantê-lo durante o período de contrato. É um aliamento de interesses que se trabalha nesse tipo de contrato e que produz eficiência. Não vejo que a estrutura fundacional garanta qualquer arcabouço de resguardo do patrimônio além do que já se tem. O que resguarda hoje é o tombamento municipal, órgãos de controle, como o Ministério Público, e os órgãos de acompanhamento do patrimônio histórico e cultural do município. Nada disso é afetado pelo formato da contratação que se escolhe, pelo formato de execução. Em qualquer um dos dois, todas essas instituições de controle e acompanhamento seguirão existindo. Então não seria propriamente um ou outro, ao meu ver.
Em uma reunião entre Executivo e entidades comunitárias, no dia 15 de março, foi acordado que a prefeitura iria convocar a ex-secretária de Cultura, Rúbia Frizzo, para apresentar a proposta alternativa à da prefeitura. Há previsão deste encontro?
Rocha: "Desconheço esse encontro. Mas eu não me oponho a conversar com eles (UAB e AMaesa), não tenho problema de participar dessas conversas, de ouvir, de trabalhar em conjunto. Eu não tenho envolvimento político-partidário, tenho alguma experiência no tema, que me afeiçoa trabalhar. Eu gosto de falar sobre o tema e exaurir tecnicamente alguns pontos. De forma alguma estou dizendo que uma forma se sobrepõe à outra, que uma é melhor que a outra. Com maior prazer, quando tivermos a formalização dos documentos que foram apresentados pelo ex-vice-prefeito Elói (Frizzo, na audiência pública na Câmara em 18 de abril), vou analisar. Se entendermos por necessário, vamos conversar com eles. A conversa é muito boa para obter alguns esclarecimentos, não teria qualquer problema. Hoje não temos isso planejado de forma alguma, mas gostaria de uma conversa.
O Executivo está decidido a respeito do modelo de gestão?
Rocha: Até o presente momento, a partir de tudo que estudamos e analisamos, estamos convictos de que aquilo que foi exposto é o que temos como melhor modelo. Mas ninguém sabe tudo, ninguém conhece tudo e, se alguém apresentar algo que é melhor do que o que há, seria ignorância da nossa parte rejeitar. Mas tem que ser analisado sob o ponto de vista técnico de como será realizado.
A prefeitura busca obter um certo consenso a respeito do projeto? Uma rejeição alta pode inviabilizar o negócio?
Rocha: O objetivo é que o projeto possa considerar um pouco de todos. Isso é importante, é o que a gente almeja. O "consenso" seria o projeto conseguir lidar com as situações que foram levantadas. Sabemos que vai haver um limite para isso, mas a gente tem que, nesse momento posterior à consulta pública, estressar esse limite. Não consigo responder, hoje, se é possível a ideia A, B, C, D ou E. Eu tenho uma ideia de que, se eu mexer em determinado ponto, vou ter que mexer em outro para compensar e a equação compensar. Um quadro extremo (de não aceitação pública do projeto) poderia inviabilizar (o negócio). Todas as situações podem ser risco de inviabilidade de um projeto. Tudo é avaliado, toda a aceitação da sociedade, como o projeto foi concebido, quais foram as etapas, as instituições envolvidas, as esferas de validação ou invalidação. Tudo isso é apreciado, aos olhos de quem tem interesse de participar de um processo como esse, como certeza ou incerteza.
Muitas pessoas o criticam por não ser de Caxias do Sul, o que o impediria de ter conhecimento histórico e cultural sobre o município e a própria Maesa. Como recebe esses comentários?
Rocha: Eu sou uma pessoa tranquila, mas acho muito injusto esse tipo de crítica. Não nasci em Porto Alegre, mas fui para lá, vivi em outras cidades, e agora estou aqui em Caxias. Reforço que estou aqui por uma vontade minha, quis vir para essa situação. Pedi demissão de onde eu estava para aceitar essa posição, porque gosto e tenho muito apreço pelo tema. Acho que não é propriamente de onde eu vim ou se futuramente vou para outro lugar que não me faria executar o melhor trabalho possível em qualquer projeto. Aí eu acho que estaríamos trabalhando a minha índole, se ela é ou não profissional. Vim com os melhores objetivos e muito motivado, quero desenvolver os projetos e estou aqui pra isso. Não me oponho a ouvir toda e qualquer pessoa que saiba mais que eu ou que queira falar sobre o tema, muito pelo contrário. Sou muito receptivo e sempre serei. Me desculpem as pessoas, mas ninguém nasceu sabendo tudo. Ninguém pode vir de outro local e desenvolver um trabalho em outra cidade só porque não conhece propriamente toda a história ou funcionamento social daquela localidade? Acho que não é bem por aí. Confio no meu conhecimento técnico e na minha experiência profissional.
Na audiência pública realizada pela prefeitura, as pessoas tinham 2 minutos para se manifestar e então o microfone era cortado. Isso foi muito criticado. Será mantido na próxima audiência, do dia 25 de abril?
Rocha: Se isso (cortar o microfone) de alguma forma machucou ou ofendeu alguém, peço desculpas em consideração a isso. A intenção era dar algum nível de limite ao tempo, mas de fato o procedimento não foi o mais adequado, não se quer tirar o direito de fala de qualquer um. Minha postura não é de evitar o diálogo. O erro foi de procedimento.