O governador Eduardo Leite classificou como "xenófobo e nojento" o discurso do vereador Sandro Fantinel (Patriota) no Legislativo de Caxias do Sul em sessão na terça-feira (28). Ao comentar o resgate de trabalhadores em situação análoga à escravidão em Bento Gonçalves, Fantinel sugeriu que os agricultores, produtores e empresas agrícolas da região "não contratem mais aquela gente lá de cima", em referência ao Nordeste, de onde vinham muitas das vítimas. O vereador argumentou que a cultura do povo baiano é "viver na praia tocando tambor".
O repúdio de Leite foi externado por meio do Twitter. O governador ainda enfatizou que a fala "não representa o povo do Rio Grande do Sul". "Não admitiremos esse ódio, intolerância e desrespeito na política e na sociedade", disse. Leite ainda escreveu na rede social que buscará autoridades baianas para que venham ao Estado acompanhar medidas para "banir o preconceito".
Em nota conjunta, as defensorias públicas do Rio Grande do Sul e da Bahia também reagiram às falas de Sandro Fantinel, classificando o discursos como um caso de injúria e difamação (leia a íntegra abaixo).
"Traindo o mandato que exerce em nome do povo em sua pluralidade, nesta terça, 28 de fevereiro, o referido vereador valeu-se do púlpito da Câmara da cidade gaúcha para injuriar e difamar justamente os cidadãos a quem deveria bem representar", diz o comunicado.
"O vereador também parece julgar-se maior que o tempo e a história, ao tentar condenar o futuro de nosso país a um passado de privilégios e preconceitos que já não encontram lugar entre nós", acrescenta a nota.
A fala também gerou reações na própria Câmara de Vereadores de Caxias, no momento em que foi proferida, e de outros atores políticos e entidades. O governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues (PT), se manifestou nas redes sociais. "É desumano, vergonhoso e inadmissível ver que há brasileiros capazes de defender a crueldade humana", avaliou. Rodrigues afirma também ter determinado a adoção de medidas cabíveis para que Fantinel seja responsabilizado pelo discurso.
O deputado estadual Leonel Radde (PT) afirmou, em publicação nas redes sociais, que registrou um boletim de ocorrência na polícia contra o vereador Fantinel, e disse que "o Rio Grande do Sul e o Brasil não são lugares para racistas, escravocratas". O senador Humberto Costa (PT) também se manifestou e afirmou que entrou com uma representação junto ao Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS), para apurar "crime de racismo cometido pelo vereador bolsonarista Sandro Fantinel".
"Além disso, também estou entrando com uma representação junto ao MPT (Ministério Público do Trabalho) por danos morais coletivos. O Nordeste merece respeito! Não vamos permitir que tamanha agressão fique impune", declarou o senador petista no Twitter.
Em nota divulgada pelo PSOL, a sigla afirmou que irá solicitar ao MP a prisão de Fantinel, devido ao "discurso racista e xenófobo proferido pelo parlamentar". A deputada estadual e presidente do partido no Rio Grande do Sul, Luciana Genro, informa que o partido irá apresentar um pedido de cassação do mandato do parlamentar. "Precisa ser preso e ter seu mandato cassado, e nós vamos lutar por isso", afirmou Luciana.
Leia a nota das defensorias públicas na íntegra:
Contra a normalização do autoritarismo por meio de discursos de ódio, cumprindo a missão constitucional de zelar pelos fundamentos de nossa República Federativa, as Defensorias do Povo do Rio Grande do Sul e da Bahia unem-se para publicizar a presente nota de repúdio face às declarações do vereador Sandro Fantinel, da cidade de Caxias do Sul.
Traindo o mandato que exerce em nome do povo em sua pluralidade, nesta terça, 28 de fevereiro, o referido vereador valeu-se do púlpito da Câmara da cidade gaúcha para injuriar e difamar justamente os cidadãos a quem deveria bem representar, os quais, em seu conjunto, constituem o povo brasileiro, que é um só, independente de sua origem ou cor. Mais: traiu a Constituição à qual está submetido ao vilipendiar os fundamentos da República, que incluem a promoção do bem de todos; a construção de uma sociedade livre, justa e solidária; a redução das desigualdades sociais e regionais.
O referido cidadão portou-se como se fosse maior que a ordem jurídica e que o próprio povo que, ao fim e ao cabo, legitimam o mandato que precariamente detém, mas que não lhe pertence; como se fosse maior que a própria Casa Legislativa que envergonha aos olhos do mundo, submetendo-a ao risco de ver-se reduzida ao tamanho de seu ofensor caso não responda proporcionalmente ao ultraje que pelas palavras deste lhe é imposto.
Confiante de que a liberdade é direito absoluto ao ponto de compreender o abuso e a ilegalidade que esmagam o direito de seus iguais em brasilidade, o vereador também parece julgar-se maior que o tempo e a história, ao tentar condenar o futuro de nosso país a um passado de privilégios e preconceitos que já não encontram lugar entre nós. Ao passado o que é do passado porque o futuro pede passagem e a pavimentação de seus caminhos exige a efetiva reparação dos danos que lhe impõem aqueles que buscam impor sua intolerância à liberdade e à igualdade alheias.
Nesse sentido, em cumprimento à sua missão constitucional e a favor de um futuro de dignidade e justiça para todos, como exigem os ideais civilizatórios, por esta nota as Defensorias da BA e do RS publicizam seu repúdio ao discurso do vereador Sandro Fantinel.