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A Comissão Processante da Câmara de Vereadores de Caxias do Sul se reuniu às 11h desta quinta-feira (9) para tratar do processo de cassação do mandato de Sandro Fantinel (sem partido). Segundo a assessoria de comunicação da Casa, o encontro ocorreu somente para analisar a necessidade de algum posicionamento a respeito do processo, o que não foi o caso. O grupo aguarda a defesa prévia de Fantinel, que tem até o dia 15 de março para entregar seu parecer. Como ele foi notificado na noite de sexta-feira (3), o prazo de 10 dias para apresentar suas argumentações começou a contar no primeiro dia útil após a notificação, ou seja, dia 6 de março.
Desde o dia 1º de março Fantinel não comparece às sessões na Câmara de Vereadores. O advogado do vereador, Vinicius de Figueiredo, afirma que Fantinel está abalado e procurou avaliação psiquiátrica, que apontou um "estresse agudo pós-traumático". Por isso, ele deverá permanecer afastado do trabalho, com atestado, por 10 dias (a contar do dia 6 de março). Como ele não comparece à Câmara desde o dia 1º, os dias anteriores ao atestado (1, 2 e 3 de março) serão descontados do salário do parlamentar, segundo a assessoria de comunicação da Câmara de Vereadores.
Na tarde de quinta-feira (8), o vereador prestou depoimento na Polícia Civil. Ele é investigado por crime de racismo, pelas suas declarações no plenário da Câmara, em processo que foi instaurado no dia 28 de fevereiro, mesma data dos pronunciamentos de Fantinel. Ele foi ouvido pelo delegado Rafael Keller, que respondia interinamente pela 1ª Delegacia de Polícia. Na tarde desta quinta, sem dar detalhes, o delegado disse que o inquérito está na fase final, agora apenas sendo necessário remetê-lo à Justiça. Segundo o advogado do parlamentar, Vinícius de Figueiredo, em depoimento, o vereador admitiu aos policiais o erro e pediu desculpas.
Confira a nota enviada pela defesa de Fantinel:
" Ontem (8/3), o vereador Sandro Fantinel depôs na Polícia Civil. O depoimento durou 1h. Abalado psicologicamente, admitiu o erro, pedindo desculpas. Esclareceu que iniciou falando sobre a escassez de mão-de-obra nas lavouras, e de improviso estendeu a fala com relação aos trabalhadores resgatados em condição análoga a de escravo. Assim que encerrou sua fala da tribuna, percebendo o erro, conforme previsão no regimento interno da Câmara, solicitou que as palavras fossem suprimidas dos anais da sessão, demonstrando estar arrependido, disse que aquela fala não lhe representa. Esclareceu que criou o projeto Agrofraterno, com o qual contribui de seu próprio provento todos os meses e atende 22 bairros carentes de Caxias do Sul, alimentando aproximadamente 2,5 mil pessoas, dentre estas muitas que provém de diferentes regiões do país, e até de outros países, sem distinção. Assim, aguarda acusação formal, e responderá à sociedade perante a Justiça, com todas as garantias processuais asseguradas”.
Processo de cassação
No dia 2, a Câmara de Vereadores decidiu pela abertura de processo de cassação do vereador Fantinel. A partir de então, são 90 dias para os parlamentares concluírem os trâmites. A comissão processante, que irá comandar o processo no Legislativo, é formada pelos vereadores Tatiane Frizzo (PSDB), presidente; Edi Carlos Pereira de Souza (PSB), relator; e Felipe Gremelmaier (MDB), vogal.
A comissão coleta subsídios materiais, ouve testemunhas e dá espaço para a defesa do vereador Fantinel. Depois disso, a comissão avalia e emite parecer, informando a Casa se decide pela cassação ou absolvição. O caso, então, vai para apreciação e votação do plenário da Câmara. Sandro Fantinel segue no exercício como vereador durante o processo. Por estar sem partido, ele perde os direitos da bancada, como os dois assessores e a declaração de líder.
Passo a passo dos trâmites
- A comissão processante teve cinco dias a partir da quinta (2) para notificar Fantinel, com cópia da denúncia e documentos. A notificação foi realizada na noite de sexta-feira (3).
- Após ser notificado, o vereador tem o prazo de 10 dias (que começou a contar do primeiro dia útil após a notificação, no dia 6 de março) para a apresentação de defesa prévia, por escrito.
- Após a apresentação da defesa prévia, a comissão processante emite parecer prévio no prazo de cinco dias, opinando pelo prosseguimento ou arquivamento da denúncia.
- Em caso de arquivamento, o parecer será submetido ao plenário, que poderá confirmá-lo ou rejeitá-lo.
- Em caso de prosseguimento, o presidente da comissão processante dá início à instrução e determinará os atos, diligências e audiências que se fizerem necessários.
- Encerrada a fase de instrução, Fantinel terá o prazo de cinco dias para apresentar razões escritas.
- Depois da apresentação das razões escritas, a comissão processante emite parecer final, pela procedência ou improcedência da acusação, e solicitará ao presidente da Câmara, Zé Dambrós (PSB), a convocação de sessão para julgamento.
- Na sessão de julgamento, os vereadores poderão se manifestar pelo tempo máximo de 15 minutos cada um. Fantinel ou o seu procurador tem o prazo máximo de 2 horas para defesa oral. Concluída a defesa, serão feitas votações nominais de acordo com a quantidade de infrações contidas na denúncia. Fantinel é afastado do cargo se houver voto favorável para cassação de dois terços dos parlamentares.
- Concluído o julgamento, o presidente da Câmara informa o resultado e, se houver condenação, expedirá o decreto legislativo de cassação do mandato de vereador. Se o resultado da votação for pela absolvição, Dambrós determinará o arquivamento do processo. Em qualquer caso, o resultado é comunicado à Justiça Eleitoral.
Relembre o caso
Na sessão do dia 28 de fevereiro, o vereador Sandro Fantinel afirmou que "com os baianos, que a única cultura que têm é viver na praia tocando tambor, era normal que fosse ter esse tipo de problema", em referência aos trabalhadores resgatados em situação análoga à escravidão em Bento Gonçalves. Ele também sugeriu a agricultores, produtores e empresas agrícolas da Serra gaúcha para dar preferência a argentinos, que seriam "limpos, trabalhadores, corretos". Na ocasião, ele afirmou ser contra qualquer tipo de maus-tratos a funcionários de qualquer área e que, em função da situação em Bento, que chamou de "exagerada e midiática", visitou um alojamento próximo de Caxias depois de ser convidado por um produtor.
As falas tiveram grande repercussão nacional e geraram manifestações dos governadores da Bahia, Jerônimo Rodrigues (PT), e do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB). Depois da polêmica, a Câmara de Vereadores de Caxias divulgou uma nota de repúdio às falas de Fantinel, assinada pelos outros 22 parlamentares da Casa, e um pedido de cassação foi protocolado pelo ex-vice-prefeito de Caxias do Sul, Ricardo Fabris de Abreu, e aberto pela Câmara no dia 2 de março. Fantinel é acusado de quebra de decoro. As declarações preconceituosas também levaram à expulsão de Fantinel do partido Patriota, que comunicou a decisão ao vereador no dia 1º de março.
O Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS) também ajuizou, na última segunda (6/3), uma ação civil pública contra o vereador caxiense. A ação pede que o parlamentar seja condenado ao pagamento de R$ 300 mil por danos morais coletivos. O valor seria destinado ao Fundo para Reconstituição de Bens Lesados. No dia 3, o Ministério Público Federal protocolou um pedido de indenização contra Fantinel, no valor de R$ 250 mil. Há também um pedido de condenação no 2º juizado da 3ª Vara Cível de Caxias do Sul, protocolado por quatro ONGs ligadas aos direitos humanos e combate ao racismo contra o vereador, que pedem o pagamento de R$ 1 milhão.