Rodrigo Beltrão (PSB) teve um ano político bastante conturbado. Após enfim deixar o Partido dos Trabalhadores (PT) depois de anos de ensaio, ele se envolveu em polêmicas pela relação conturbada que criou com o ex-partido, cujo distanciamento se fortaleceu no segundo turno das eleições, após Beltrão declarar apoio a Adiló Didomenico (PSDB), adversário de Pepe Vargas na disputa à majoritária. Ao Pioneiro, o vereador comentou a respeito das polêmicas e falou sobre o processo eleitoral no qual acabou não sendo reeleito para o Legislativo.
Pioneiro: Neste ano o senhor mudou de partido, gerou uma crise nessa relação com o PT e não se reelegeu. Politicamente, foi um ano ruim?
Rodrigo Beltrão: Não, não foi ruim politicamente, até porque ainda em 2016 eu já tinha me manifestado de que seria meu último mandato como vereador. Eu sempre tive na prática, e não só no discurso, a premissa e a ideia de renovar. Então, desde 2016 eu fui me posicionando para participar da chapa majoritária, e uma semana antes de começar as eleições, eu tinha expectativa de compor a chapa majoritária. Não logrando êxito, eu me organizei de última hora para concorrer a vereador e cumprir esse papel. Então eu entendo que não ter sido eleito não torne o ano político ruim, até porque não existe só espaço de vereador para fazer política. Eu não nasci vereador.
O senhor diz que não pretendia voltar a ser vereador, então por que colocou seu nome à disposição para a disputa?
Porque foi uma situação sui generis, eu já tinha acordos pré-alinhavados que eu ia compor a majoritária, seja como vice ou eventualmente até candidato a prefeito. O meu partido, o PSB, foi o último a se definir (optou por apoiar, para a eleição majoritária, Carlos Búrigo, do MDB, na cabeça de chapa) e poucos dias antes de começar a campanha é que comecei a me organizar (para concorrer à Câmara), pois vinha me projetando em outro sentido. E pra mim ficou comprovado que eleição para vereador não depende de trabalho, depende de como você lida com as emoções, se tem habilidade para ser youtuber, enfim, a política teve modificação muito rápida. Eu estou tranquilo, agradeço a participação nesta eleição, já estava desapegado no sentido de me colocar à disposição de outros desafios.
Já se sentia desanimado do exercício da vereança?
Não é, é que eu sempre tive essa premissa de renovar, inclusive acho muito errado esses caras que fazem da deputação ou da vereança uma profissão, eu nunca fiz isso. Acho que depois de 12 anos, depois de muita contribuição que dei no parlamento, poderia dar contribuição em outro espaço e me coloquei, me postei para isso. Infelizmente não deu, coisas da vida.
O senhor criticava muito o MDB nos seus pronunciamentos na Câmara. Acabou que o seu partido, o PSB, apoiou o candidato do MDB na majoritária. O que achou da escolha do partido e o que pensa sobre o MDB hoje?
Primeiro que, com a ascensão de uma veia de extrema direita (no país), o MDB se coloca hoje mais no centro. Inclusive, eu já há muitos anos vinha disputando a ideia de acabar com a visão de que existe só um partido que é dono da luta social e que só ele defende os trabalhadores, e os demais são contra saúde e educação. Isso não é verdade na prática. Se a gente pegar os próprios governos do MDB, mesmo nas ocasiões que fui oposição, o investimento na saúde e na educação foi alto. Se pegar o atual governo (Flávio) Cassina (do PTB), o investimento na saúde é o dobro do mínimo constitucional. Então não tenho essa visão que a esquerda conservadora tradicional difunde de maniqueísmo, de que quem está deste lado, mesmo que não ajude uma senhora atravessar a rua durante os quatro anos, é só eles que defendem a saúde e a educação na eleição. Não tenho mais essa visão romântica de que só existe bem e mal. Nesse aspecto, o MDB é um partido que foi colocado no centro e que tem que ter diálogo. Agora, a aliança com o MDB neste momento me prejudicou? Me prejudicou, isso foi inegável.
Em que sentido?
Do eleitor tentar entender uma movimentação tão rápida. Com o advento do bolsonarismo, mudou a correlação de forças. Não tenho problema nenhum com MDB, pois tenho visto, na atual conjuntura, que o MDB é partido de centro. No entanto, dentro dessa visão romântica que a esquerda conservadora constrói ambiente ilusório de bem e mal, isso me prejudicou sim.
O senhor falou que estava mais ou menos encaminhado para ser nome da majoritária. Em que momento deu errado?
Eu só tenho a agradecer ao PSB, ocorre que trabalhamos meses e eu estava indo para o PSB para construir aliança nacional com o PDT. Passamos alguns meses na possibilidade dessa aliança e, na última hora, o PDT optou pelo PP como vice, o que eu respeito. Mas eu entendo que se nós tivéssemos reproduzido a aliança nacional em Caxias do Sul, nesse novo arranjo político que é PSB, PDT, Rede e PV, talvez o resultado da eleição teria sido outro. Mas eu entendo que faz parte.
O senhor foi chamado de traidor por parte da militância do PT. O que pensa sobre isso?
É normal, porque hoje esse partido se organiza com a mística de uma religião materialista, onde possui um deus com d minúsculo, possui sacerdote, missa, hinos. Toda essa ideia romântica que se constrói, a esquerda conservadora vai cada vez mais para o isolamento, porque ou você é da esquerda conservadora ou ninguém mais presta. Isso não cabe mais na política, essa visão da autoproclamação da verdade. Um partido que quando foi governo federal fez aliança até com o diabo e quando está na oposição assume um puritanismo que não é bem a imagem do partido. Mas eu respeito e acho que essas pessoas que falam "traidor", elas falam do que o coração delas está cheio, falam delas próprias. Até porque eu tive 24 anos de préstimos, sem um processo ético, sem um arranhão defendendo esse partido, só que agora, a hora que a pessoa decide sair, alguns acham que havia algum pacto de sangue que jamais houve, eu apenas sou um democrata. Antes de qualquer princípio, existem princípios que temos de valorizar, e um deles é a liberdade, e eu tenho a liberdade de me filiar e defender a candidatura que eu quiser, e a esquerda conservadora que cuide do seu caminho. Não bebo água das orelhas de ninguém para ficar me dizendo se eu devo estar filiado aqui ou ali.
E sobre seu futuro político?
Não tenho nenhum apego a cargos políticos, sempre fiz política, desde a adolescência, e política se faz em cargo eletivo ou fora dele. Objetivamente, a contribuição que eu posso dar no aspecto mais partidário é a construção dessa aliança, PSB e PDT. Tenho a profissão, sou advogado, vou trabalhar com maior afinco nela e se, eventualmente lá na frente, tiver alguma oportunidade, junto com meu coletivo vamos conversar e avaliar.
Mas vereador dificilmente?
Não, certamente que não, já havia tomado decisão em 2016 de não concorrer mais. Eu tenho criticado muito essa ideia de vereador profissional, deputado profissional, acho que a rotatividade é necessária e outros espaços podem nos motivar mais. Eu adquiri um longo conhecimento, estou na gestão pública desde 2000 e adquiri muito conhecimento. Mas hoje minha vida está organizada para seguir advogando, cuidar da minha família.
Como avalia a sua votação. Em 2016 conquistou mais de 2 mil votos e agora menos de 1 mil. Claro que teve a organização às pressas que mencionou, mas ao que você atribui à perda do volume eleitoral?
Primeiro, foi essa questão da organização tardia, segundo, eu tenho certeza que minha campanha foi a mais barata entre os eleitos e os que concorreram à reeleição. E terceiro, fui o único candidato a vereador da cidade que enfrentou a oposição de um partido todo. O que aconteceu: no final da campanha, os gafanhotos vieram na lavoura e levaram muito voto. Justamente com essa fala perversa de que eu não poderia ter mudado de partido, trabalhando as minhas listas. Mas eu respeito que o partido tenha tido essa visão e tenha se organizado pra isso com toda a máquina que possuía.
Lembro do senhor em algumas ocasiões criticar o PT dizendo que o partido em Caxias vivia uma "eterna 'Era Vargas' (referência a Pepe)". Acha que faltou apoio ao longo de sua trajetória?
Sobre as críticas que teci no passado, essas já foram colocadas e não preciso requentar, mas o que entendo é que o partido, com um ódio nunca antes visto na história, fez uma opção ferrenha porque entende que quem já foi filiado no PT precisa permanecer pro resto da sua vida. Não entendo por que essa afronta às liberdades. No maior tempo de crise do PT, quem defendia o PT era eu. Na hora que dava pau, iam lá para a Câmara, quem dava a cara a bater praticamente sozinho era eu.
O senhor declarou apoio ao Adiló publicamente. Por que fez questão de se manifestar? Porque foi a partir daí que os ânimos mais acirraram nessa relação sua com o partido...
Primeiro, que essa militância ocorre no meio virtual, na vida real as pessoas trabalham, conversam e não vejo nenhum ataque, só no virtual, porque tem pessoas, como eu disse, que não ajudam uma senhora a atravessar a rua, não fazem um trabalho relevante na sociedade, mas são muito verborrágicos nas redes sociais. Esse ambiente não permeio porque é nocivo, são pessoas desqualificadas e odiosas, então não considero críticas de redes sociais. Segunda questão, o apoio ao Adiló, quero voltar à ideia inicial, de que tem de parar com essa ideia de que um candidato a favor do SUS e da educação e o outro que era bolsonarista. Isso não existiu. Eu conheço o Adiló, e nos últimos anos que convivi com ele, o que ele caminha no bairro sozinho é mais do que todo o adversário caminhou num bom período. Adiló tem uma vida comunitária forte, jamais foi privatista, inclusive fortaleceu a Codeca quando esteve lá. E não tinha nenhum vínculo com a veia bolsonarista, então tínhamos dois candidatos que poderiam, sim, fazer um bom trabalho social para Caxias do Sul, o problema é que um tem o partido como dono e o Adiló é uma coligação que possibilita um processo de conversação, de construção em torno de um programa para a cidade. Enquanto que o outro candidato estava preocupado em fazer oposição ao governo federal e acumular forças para a eleição seguinte. Eu tenho orgulho de ter coragem de apoiar o candidato que achei que deveria apoiar e comemorei muito que ganhou.