O prefeito eleito de Caxias do Sul, Adiló Didomenico (PSDB), concedeu entrevista à Rádio Gaúcha, na tarde desta quinta-feira (31), véspera de sua posse no comando do Executivo, quando fez uma abordagem geral sobre vários aspectos envolvendo o município. Ele ressaltou grande preocupação no que se refere à pandemia e disse que sua primeira medida será a licitação do transporte coletivo urbano, que definiu como "à beira do caos". Confira a seguir os principais trechos.
_ O que nos aguarda é bastante preocupante, principalmente no que se refere à pandemia _ começou dizendo Adiló, para em seguida falar da situação de ocupação de UTIs.
_ A rede privada está com 70% de ocupação das UTIs, mas esse índice não é para comemorar, tivemos muitos óbitos nesta semana, lamentavelmente. Perdemos muitos caxienses, não houve uma liberação de leitos de UTI. O setor público com 88%, estava ontem (quarta-feira, 30) à noite. Agora, imagina o retorno de todos esses feriados, que nos preocupa demais, inclusive pela ausência do decreto de calamidade que vai criar algumas dificuldades a mais para as prefeituras, não só para Caxias. Não foi prorrogado o decreto de calamidade e nós vamos enfrentar seguramente aí um aumento de casos nos próximos dias. Isso nos preocupa muito.
Que impacto tem a não prorrogação do decreto de calamidade no dia a dia da administração?
Tem impacto na alocação de recursos, nós tínhamos até então uma cobrança de taxa d'água reduzida, tarifa social com 50% de desconto. A partir da não renovação do decreto a tarifa volta a ser cobrada no valor integral. Então, vai causar sempre um impacto para as famílias de baixa renda, que já estão com enorme dificuldade, o término dos repasses do recurso federal, que ajudou muito, a gente tem que reconhecer, isso ajudou bastante as pessoas, e a partir de agora também cessam os repasses. Caxias está hoje com em torno de 35, 36 mil postos de trabalho fechados. Uma situação jamais vista na história de Caxias do Sul.
Qual vai ser a sua primeira medida, tomando posse o que pretende fazer de imediato?
Vamos tocar adiante a licitação do transporte coletivo que está à beira do caos em Caxias do Sul. Nós estamos desde maio com contrato precário, que vence em maio agora do próximo ano. Em 2010, tínhamos 300 mil passageiros por dia, no início da pandemia, em março deste ano, já estava em 150 mil por conta da concorrência dos aplicativos e também do desemprego, da crise econômica, e hoje tem 65 mil passageiros utilizando o transporte coletivo. Isso não mantém o sistema funcionando e corremos um risco muito sério de ter o transporte coletivo em colapso em Caxias do Sul.
O prefeito Daniel Guerra, que foi apeado da prefeitura por um impeachment, teve uma briga aberta, feroz, contra a única empresa de ônibus que tem o contrato que faz o transporte em Caxias do Sul há muito tempo, que é a Visate. A tendência é que fique essa empresa, porque ela que tem a expertise, tem na mão o transporte público na cidade?
Tão logo a gente tiver esse edital, vamos fazer uma ampla discussão com a sociedade, porque nós temos que rever uma série de gratuidades, roteiros, nós já estamos conversando com o secretário de Trânsito para contratar um plano de mobilidade, mas além de tudo isso nós vamos procurar empresas que tenham porte nesta área, vendendo a ideia de Caxias do Sul para essas empresas para que venham participar do certame. Nós temos interesse que o maior número de empresas participe do certame. Inclusive, a licitação prevê a possibilidade de consórcio. O fato de ser uma ou mais empresas não é o problema. O problema é que essa licitação é muito antiga, a lei que regeu essa licitação é de 1957. Coincidentemente, o plano catalisou a legislação do transporte coletivo e mobilidade de Caxias do Sul, de autoria da nossa vice-prefeita (Paula Ioris) e minha. Então, nós temos hoje uma lei atualizada, moderna, que prevê ônibus elétrico, uma série de melhorias e atualização. Imagina que de 1957 para hoje a realidade é muito diferente. Então, a ideia de duas ou mais empresas foi construída de forma maldosa, porque tu ilude o passageiro imaginando que ele vai ficar no ponto de ônibus esperando aquele que tenha a oferta de menor preço. Não é assim que funciona. Na Capital, onde tem várias empresas a tarifa é única. E a tendência, inclusive, quando tem mais de uma empresa é aumentar o custo, porque são mais centros administrativos, tem que criar uma câmara de compensação dessas tarifas, que eleva elas seguramente em torno de 5%.
Para o senhor não faria sentido ter mais de uma empresa? Seria mais adequado ter uma empresa apenas?
Uma ou várias empresas consorciadas. Mas mantendo pelo tamanho de Caxias do Sul, uma central, um setor administrativo, uma estrutura de oficina, porque isso reduz custo. Historicamente, frotas abaixo de 400 ônibus é recomendado apenas uma estrutura. Com mais de 400 ônibus, ok, aí pode dividir a cidade em bacias, que economicamente se torna interessante. Para Caxias, ainda não estamos nesse [...] e ainda mais com a redução de passageiros. Imagina 65 mil usuários dividir para duas empresas. E números tu não combate com discurso, números tu combate com atitude, com projetos, com planos de mobilidade, com custo reduzido. Nós vamos ter que baixar o custo da passagem para tornar o transporte novamente competitivo e atraente, além da qualidade, evidente. Hoje a passagem é R$ 4,65, a pessoa precisa pegar dois ônibus, ela vai para o aplicativo, ela abandona o transporte coletivo. Foi o que aconteceu. O prefeito que saiu (Guerra) teve todo o tempo do mundo para encaminhar uma licitação, construir um trabalho com diálogo a comunidade, com a sociedade, ele não fez isso. Ele usou o tempo para brigar com a empresa e inclusive deixou uma herança de duas ações judiciais muito pesadas contra a prefeitura. Ações milionárias que a empresa está questionando o município por atitudes que foram tomadas, não reajustando a passagem quando o conselho (de Trânsito) havia feito um levantamento e orientado o reajuste da passagem. Essa diferença a empresa está buscando na Justiça.
Na rede municipal, qual a ideia de retorno das aulas, é possível em março?
Eu sempre defendi desde o início o retorno gradativo e opcional das aulas nas escolas. Entendo que as crianças na mão dos professores elas ficam muito bem cuidadas, com todos os protocolos de saúde e à medida que retornaram as aulas em Caxias não tivemos aumento de índice. Os aumentos estão comprovados nos feriadões, nas festas clandestinas, então eu defendo a retomada das aulas e eu acredito que nós vamos ter daqui para frente um modelo híbrido, presencial e também através dos aplicativos. Acredito que esse é o modelo que vai se consolidar daqui para a frente.
Qual a situação financeira da prefeitura, cofre raspado ou tem um dinheirinho para gastar?
Cofre raspado e seguramente correndo atrás da máquina. Como vereador fiz parte durante os dois últimos anos da comissão de Desenvolvimento Econômico que fiscaliza e aprova o orçamento do município, então, para mim não é uma novidade. A gente veio acompanhando isso desde o Governo Guerra, aonde na questão financeira não cabe nenhuma crítica, ele tinha uma secretária que foi muito zelosa, muito cuidadosa, mas já apontava para um déficit que aconteceu em 2019, aconteceu em 2020, a prefeitura teve muita dificuldade para pagar o salário de dezembro. A atividade econômica decresceu, muitas empresas foram embora por falta de ambiente, por falta de segurança jurídica, burocracia, demora no licenciamento, tratou muito mal os investidores tanto na área da construção civil, quanto noutros segmentos e isso está refletindo, a pandemia veio atingindo as finanças da grande maioria dos municípios. Vamos enfrentar uma situação de aperto, mas isso não é uma novidade, sabíamos disso e não vamos ficar nos lamentando. Vamos ter que encontrar fórmulas para superar e enfrentar essa situação. Mas são desafios enormes que nós vamos ter que conviver, tendo uma das companhias que é o braço direito da prefeitura, que eu fui administrador dela de 2005 a 2012, que é a companhia de desenvolvimento, que cuida da coleta de lixo, aterro sanitário, varrição, capina, pavimentação asfáltica, numa situação pré-falimentar com R$ 23, 25 milhões de prejuízo acumulado nesses últimos três, quatro anos. Então, além da dificuldade financeira da prefeitura, tem seu principal parceiro, que é essa companhia de desenvolvimento, também numa situação muito difícil.
Tem uma preocupação de prefeitos eleitos e reeleitos em relação a procedimentos represados na saúde. Em razão da covid, muitos procedimentos ficaram para depois, exames de rotina, cirurgias, consultas. Como está isso em Caxias? É um problema, o senhor está preocupado com isso?
Sim, nós temos aí consultas represadas um absurdo, cirurgias eletivas e exames também. Vamos, à medida do possível, contratar na iniciativa privada, com todas as dificuldades financeiras, mas nós vamos ter que lançar mão disso. A saúde em Caxias, ela muitos anos foi aumentando o índice, que obrigatório seria 15% (da receita), hoje está em 24%, e não atende à demanda porque Caxias tem a questão do SUS, que atende a 49 municípios. Vamos ter que trabalhar muito a parceria com essas prefeituras da região para nós nos ajudarmos. Caxias sozinha tem dificuldade de bancar essa estrutura toda, porque em torno de 40% dos atendimentos são feitos para municípios da região.