Médico e político experiente, agora Pepe Vargas (PT) também é profundo conhecedor da agricultura familiar brasileira. Após dois anos, ele retorna à Câmara Federal na próxima segunda-feira, deixando o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) sob os cuidados do também petista Miguel Rossetto. A troca, necessária para que Pepe possa disputar a eleição em outubro, estava prevista para esta sexta-feira, mas, devido à agenda da presidente Dilma Rousseff (PT), foi transferida para o início da semana que vem. Na semana passada, quando permaneceu em Caxias para se recuperar de um resfriado, o também médico e ex-prefeito conversou com o Pioneiro. Além de avaliar a gestão no MDA, falou sobre eleições e Copa.
Confira alguns trechos da conversa e leia a entrevista no Pioneiro desta sexta-feira.
Pioneiro: O que o senhor não sabia do Brasil rural e que muito o surpreendeu positivamente?
Pepe: 74% da mão de obra no meio rural brasileiro é ocupado pela agricultura familiar. Estamos falando de uma cadeia produtiva que tem 12 milhões de pessoas. Por exemplo, temos um universo grande de extrativistas na Amazônia que sempre ficaram esquecidos, para quem tivemos políticas públicas nos últimos dez anos, mas elas não foram suficientes. A mesma coisa para a agroecologia, para quem lançamos um plano nacional de produção orgânica e agroecológica, que o Brasil nunca tinha lançado. Eu sabia desses desafios, mas conhecia em tese, sem muita prática, que é sempre muito mais instigante. Outra coisa que salta aos olhos e é pouco conhecida pela população brasileira é a profunda ligação da agricultura familiar com o emprego na cidade. Essa turma não só produz o alimento, mas também gera de emprego na cidade, seja na indústria de frango, de carnes, laticínios, beneficiamento de arroz, ou qualquer outro processamento. Tem também toda a indústria de insumos, fertilizantes, controle biológico de pragas, agroquímicos, isso gera muito emprego. Também a indústria de máquinas e equipamentos, tratores, implementos agrícolas, são milhões de empregos. Boa parte da indústria metalmecânica no Brasil está voltada para a agropecuária. Aqui no Estado, são 65%.
Pioneiro: E a surpresa negativa?
Pepe: Não vou dizer negativamente, mas é um esforço que a gente ainda tem que ter perante alguns movimentos sociais do campo para eles assumirem mais decididamente a pauta econômica, do desenvolvimento. Os movimentos sociais ligados ao campo, inclusive o próprio Movimento Sem Terra, ficaram durante muitos anos numa pauta de direitos sociais, que é importantíssima. É muito fácil encontrar o dirigente do movimento social que é especialista, dá aula de direitos sociais, mas quando chega na hora de ir para o desenvolvimento econômico, tem dificuldades de formulação. A gente vê que há um descompasso entre nós que estamos no governo querendo fazer mais desenvolvimento econômico e o movimento - não podemos generalizar, a gente encontra excelentes quadros com capacidade de formular desenvolvimento econômico - mas em outros a gente não encontra e isso gera uma dificuldade. O Congresso começou agora a discutir um novo conceito de reforma agrária popular que diz exatamente isso. Ficaram muito centrados só na luta pela terra.
Pioneiro: A rotina do senhor em Brasília mudou muito ao trocar o Congresso pela Esplanada dos Ministérios?
Pepe: A rotina do ministério é completamente diferente. Tem que fazer a gestão, tem que gerir um orçamento grande, tem que circular pelo Brasil. A rotina é de gestão, administração, uma rotina mais para prefeito do que para deputado, mas muito mais complexa do que a de prefeito, com um orçamento muito maior, muito mais pesado, uma rotina muito dura. Começa sempre de manhã muito cedo e termina sempre muito tarde da noite. Quando as pessoas me perguntam como está Brasília, eu brinco que eu não sei. O meu caminho é do meu apartamento para o ministério e do ministério para o meu apartamento. Nunca fico no fim de semana lá.
Pioneiro: O senhor prefere a rotina de parlamentar ou de Executivo?
Pepe: Eu prefiro o Executivo ao Legislativo, mas acho a atividade legislativa extremamente importante. No Legislativo, tu tem que ir atrás do trabalho. No Executivo, o trabalho vem atrás de ti. Quando digo ir atrás do trabalho, quero dizer se envolver nos temas, entrar para dentro do debate, estudar muito. Eu procurei entrar em alguns temas, acredito até que a Dilma já me conhecia da minha gestão na prefeitura, mas eu fui um parlamentar que o governo pedia para eu relatar determinadas matérias porque tinha confiança em mim, eu entrava em alguns temas principalmente na Comissão de Finanças e Tributação, e o pessoal via que era um parlamentar diferenciado, que não ficava no lugar comum.
Entrevista
"Prefiro o Executivo ao Legislativo, mas acho a atividade legislativa extremamente importante", diz ex-prefeito de Caxias do Sul Pepe Vargas
Ele deixa o Ministério do Movimento Agrário na próxima segunda-feira após dois anos no governo federal
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