Desapegar de roupas, revender ou reciclar peças de vestuário são atitudes que ganham cada vez mais espaço nos grandes centros urbanos. Em Caxias do Sul, essa realidade não é diferente: os brechós impulsionam a economia e garantem acessos a roupas de qualidade a valores acessíveis. Se antes eles eram vistos com desconfiança por parte do público, hoje eles vivem um salto de popularidade.
Basta circular pelo centro da cidade ou dar uma rápida passada nas redes sociais para encontrar postagens de inúmeros brechós. O consumo consciente por si só está cada vez mais na moda e gera um impacto social ainda mais efetivo. Chama ainda mais atenção quando esses voluntários se doam a uma causa. As doações são destinadas a ONGs que ajudam pessoas em vulnerabilidade social, animais, dependentes químicos e demais entidades que atuam em Caxias do Sul.
É quando se forma uma corrente de solidariedade, que une diversos grupos que arrecadam doações, fazem triagem, divulgam e vendem produtos para se doar e fazer o bem ao próximo. Além de arrecadar fundos, os brechós colaboram para aumentar a conscientização no consumo da moda e do bom aproveitamento de cada peça já produzida, pensando na sustentabilidade.
Por amor aos animais
Um dos brechós mais tradicionais e conhecidos de Caxias do Sul está de aniversário nesta terça-feira (25). Há 10 anos, o Brechó Chicão conta com voluntários que doam tempo e trabalho em prol de uma causa. No segundo andar do prédio, localizado na Rua Pio XII, no bairro Pio X, onde funciona o brechó, o que não falta é trabalho. Durante anos, as edições eram realizadas no Centro de Convivência, em parceria com a Universidade de Caxias do Sul (UCS). Em virtude da pandemia, em 2020, a ONG buscou um novo espaço para continuar trabalhando e ajudando o maior número possível de animais carentes.
Há roupas, calçados, eletrodomésticos, brinquedos, livros, CDs e os mais diversos objetos em caixas e prateleiras por todos os lugares. Nos sábados, o grupo realiza a triagem das doações e, durante a semana, de segunda até sexta-feira, limpa o espaço, arruma e coloca os preços nas mercadorias. As edições são realizadas de janeiro a dezembro, em quatro dias, a cada mês. Em meio a todos esses objetos também há alegria e leveza de voluntárias que não apenas se dedicam com amor e carinho à proteção animal. Elas também assumiram a responsabilidade de fazer a diferença para quem tem focinho e quatro patas.
— A causa animal é muito mais do que trabalhar, juntar dinheiro e pagar contas veterinárias ou auxiliar com moradia e alimentação. Nosso objetivo maior é dar dignidade àqueles que não têm voz. Os animais não estão em situação de risco por vontade própria, eles são negligenciados por uma sociedade que ainda não tem a verdadeira capacidade de compreender o bem que eles podem nos proporcionar — ressalta a presidente da entidade, Silvana Mara Procedi.
Ela destaca ainda que esse amor aos animais é o que move o grupo diariamente:
— Quando recebemos uma notícia positiva sobre algum animalzinho que tivemos a oportunidade de fazer a diferença, nosso combustível se renova e a vontade de continuar permanece. Até porque manter o projeto está longe de ser fácil, muitas pessoas acham o trabalho lindo, mas o compromisso sério que temos acaba por selecionar quem realmente ama e abraça essa causa — ressalta ela.
A dedicação e seriedade é tanta que fica praticamente impossível dimensionar o número de animais que a ONG ajudou em uma década. Para se ter uma ideia, em 10 anos foram pagos 22.347 atendimentos a animais sem tutores ou com donos em situação de vulnerabilidade social. A ONG também já doou 263.256 quilos de ração, intermediou 3.267 cirurgias e foi responsável pelo pagamento de 26.097 castrações. A ONG também ajudou na assistência a 3.335 animais em situação de maus-tratos. Atualmente, 32 voluntários atuam no Brechó Chicão e outros quatro na ONG Sem Raça Definida (SRD), a única que atua em casos de maus-tratos no município.
Latidos e Miados
A técnica em enfermagem Silvana Boff se dedica à proteção animal desde pequena. Ela já foi voluntária do Brechó Chicão, uma das idealizadoras do Brechó das Patinhas e, em seguida, do Latidos e Miados. Hoje, ela ajuda protetoras conhecidas na cidade pela seriedade. Em 2023, ela decidiu destinar a maior parte de recursos à única ONG que atua em maus-tratos, que é a SRD.
— Como o espaço é pequeno, optamos por trabalhar com objetos, desde um copo a um quadro decorativo. Tudo o que for vendável, que tu tenhas na tua casa e não quiser mais, aceitamos como doação. Tudo o que temos é doado.
As doações de roupas e sapatos são revertidas para as demais ONGs ou protetores. As roupas também são vendidas online, no perfil Brecholando, que reverte parte da renda para a SRD. Mesmo com o que é doado, sobram mercadorias, que são vendidas em feiras. O Latidos e Miados abre uma vez por mês, em datas previamente agendadas.
— Não é muito o que a gente faz na proporção da necessidade da cidade com relação aos animais abandonados. Tenho muitas atividades e priorizo o voluntariado como uma parte muito significativa da minha vida.
As edições mensais são realizadas na Rua Nestor Moreira, 809, esquina com a Raposo Tavares, no bairro Sagrada Família.
Desapegar
O Brechó Desapego & Cidadania é promovido pelo comitê da ONG Ação da Cidadania de Caxias. A iniciativa é itinerante e foi lançada em 2020, quando começou a pandemia, para reverter os recursos em compras de cestas básicas. Uma das voluntárias, Ruth Ordovás, afirma que a entidade está em busca de um espaço físico, com um valor de aluguel acessível, para que a maior parte do recurso seja revertida a ajudar essas famílias, que geralmente não estão inscritas em nenhum programa social, como o Bolsa Família.
— Essas famílias estão em situação de insegurança alimentar grave. Isso quer dizer que eles não sabem se vão comer mais tarde ou amanhã, eles não têm comida. Já visitamos famílias que as crianças dividem o mesmo prato de comida no almoço sem ter janta ou café da manhã no outro dia — ressalta Ruth.
No brechó, são vendidos itens novos e usados, que são doados pela comunidade. São os voluntários que buscam doações, montam o brechó, vendem as peças e depois guardam os produtos novamente. Além das famílias em situação de vulnerabilidade, há um projeto social que ajuda mais de 420 famílias do bairro Santa Fé.
As cestas básicas também são doadas a pacientes do Rim Viver, pacientes oncológicos e mulheres em situação de violência. Em 2022, mais de 4 mil cestas foram doadas, sendo que cerca de 3,3 mil foram compradas com recursos do brechó e 700 vieram do comitê nacional. Cada cesta pesa em torno de 12 quilos e é composta por alimentos não perecíveis. Para saber mais sobre o trabalho e as peças vendidas, acesse www.instagram.com.br/desapegocidadania.
Mais Brechós
A Pastoral de Apoio ao Toxicômano Nova Aurora (Patna) de Caxias do Sul também mantém um bazar para arrecadar recursos. O horário de atendimento é das 13h30min às 17h30min, de segunda a quinta-feira, na Rua Pinheiro Machado, esquina com a Andrade Neves, na área central:
— É uma via de mão dupla porque ajuda as pessoas que compram um produto bom e com baixo preço e ajuda a Patna a manter o serviço de recuperação de dependentes químicos — ressalta uma das voluntárias da Patna, Maria de Lourdes Grison.
O Brechó Amor de Quatro Patas é realizado uma vez por mês, de maneira itinerante. Uma das idealizadoras, Karoline Vaz, ressalta que são vendidas roupas infantis, masculinas, femininas e calçados, além de outros objetos em bom estado de conservação. Os valores giram em torno de R$ 1 a R$ 20 e os recursos são destinados à causa animal. Para ajudar, basta entrar em contato pelo insta Amordequatropatas824.
— Nosso maior problema é achar um local. Cada vez fazemos (a edição) em um bairro novo, para levar informação para as pessoas e fazer realmente uma troca solidária. Vou pedindo uma casa que está para alugar e está desocupada, uma garagem que dá para uma rua movimentada, mas está cada vez mais difícil — lamenta a voluntária.
A Rim Viver também mantém um brechó na Avenida Rio Branco, 360, na sede da entidade. O atendimento é de segunda a sábado. As peças são vendidas a partir de R$ 1. A renda é revertida à instituição. O telefone é o (54) 3214-1707.
Já o Instituto da Audiovisão (Inav) também conta com um brechó para arrecadar fundos para a entidade. O espaço funciona na Rua Pinheiro Machado, 1.540, entre a Borges de Medeiros e a Alfredo Chaves, no Centro. O horário é das 9h às 17h30min, sem fechar ao meio-dia.