O reaparecimento de casos de poliomielite no mundo acende alertas a todos os países, especialmente aos que registraram redução na cobertura vacinal contra a doença nos últimos anos, como é o caso do Brasil. Em 2019, a porcentagem de público-alvo vacinado em nível federal estava em torno de 84%. No ano de 2020, com a pandemia, esse número chegou a 76%. Em 2021, a taxa baixou mais ainda, indo a preocupantes 67,6%.
Em Caxias do Sul, o cenário é similar. Dados disponibilizados pela Secretaria Municipal da Saúde (SMS) revelam uma queda significativa na cobertura vacinal contra a doença, considerando o comparativo entre 2020 e 2021. No primeiro ano de pandemia, a cobertura de vacinação se encontrava em 103% (no esquema básico, oferecido aos bebês aos dois, quatro e seis meses de vida). No ano passado houve queda, com percentuais atingindo 86,65% do mesmo público-alvo.
— Felizmente o Brasil não registra casos de poliovírus selvagem (vírus causador da poliomielite) desde a década de 1980, mas isso se deu muito pelo país ter cobertura adequada de vacinação. O que a gente vê é que desde 2015, 2016, houve uma diminuição nas coberturas vacinais no geral, não só para a vacina da polio, como para as demais. E isso se intensificou no ano de 2021 — explica a diretora da Vigilância em Saúde da Secretaria da Saúde de Caxias, Juliana Argenta Calloni.
O esquema completo de vacinação contra a poliomielite prevê a oferta de cinco doses de vacina, sendo disponibilizadas às crianças aos dois, quatro e seis meses (chamado esquema básico) e, após, dois reforços entre 15 e 18 meses e aos quatro anos.
Dados da Vigilância em Saúde de Caxias demonstram ainda que as famílias deixam de completar todo o esquema vacinal, o que diminui a proteção contra a doença. No ano passado, o primeiro reforço (entre 15 e 18 meses) teve cobertura de 82,55% do público-alvo. Já o segundo, a gotinha, aos quatro anos, teve taxa de apenas 66,53%. Um dos motivos, segundo Juliana, é porque no primeiro ano de vida o calendário de consultas é maior, o que facilita a identificação de eventuais atrasos na caderneta de vacinas.
— É preocupante porque temos o risco de reintrodução da poliomielite por ter uma circulação maior do vírus no mundo. Acende um alerta, não só para a polio, como para as outras doenças também. Tanto é que a partir da semana que vem a gente vai ter uma campanha de vacinação contra o sarampo justamente para que a gente possa elevar as coberturas vacinais dessa doença — aponta Juliana.
Para conscientizar as famílias sobre a importância de vacinar as crianças contra a poliomielite, a SMS faz a busca ativa dos não vacinados, principalmente no primeiro ano de vida dos bebês.
— Entramos em contato com a família para informar e fazer o chamamento que a criança está com as vacinas em atrasos. Pedimos que esse pai e essa mãe compareçam à unidade. A vacinação das crianças é obrigatória e isto está previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente. Se há situação muito clara de negligência, encaminhamos para os órgãos de proteção à saúde da criança — detalha a diretora da Vigilância em Saúde da SMS.
Juliana ainda explica que no ano passado, com a pandemia, as equipes de saúde das unidades básicas tiveram que direcionar seus esforços para atendimentos relacionados à covid-19, diminuindo, de certa forma, as ações de busca ativa de não vacinados. Vale ressaltar que a vacina contra a poliomielite é gratuita e pode ser acessada diretamente nas unidades básicas de saúde (UBSs).
Palestrante apela que pais vacinem as crianças
Aos 58 anos, o palestrante e empresário Emilio Finger, natural de Flores da Cunha, busca usar seu exemplo de vida para conscientizar e sensibilizar as famílias sobre a importância da vacinação contra a poliomielite.
Ele contraiu a paralisia infantil, como a doença é popularmente conhecida, aos seis meses de vida. O diagnóstico, contudo, não foi encarado como uma sentença: mesmo em meio às dificuldades e graças a inúmeros tratamentos médicos e ao apoio da família, Emilio aprendeu a surfar, esquiar, mergulhar... E, em 2017, chegou a percorrer o Caminho de Santiago da Compostela, na Espanha. Mas tudo poderia ter sido diferente:
— Foram poucas as crianças que tiveram a oportunidade e conseguiram vencer a paralisia infantil, como eu venci — destaca.
Hoje, Emilio apela para que os pais não deixem de vacinar seus filhos:
— A paralisia infantil tira a oportunidade de a criança viver uma vida saudável. Nós, como pais, não temos o direito de tirar essa chance das crianças. É só levar ao posto de saúde e vacinar. Assim, elas estarão protegidas e não vão correr o risco de passar pelo o que o menino Emilio passou na infância, na juventude e como adulto também.
Sobre a poliomielite
:: Sintomas: febre, mal-estar, dor de cabeça, de garganta e no corpo, vômitos, diarreia, constipação (prisão de ventre), espasmos, rigidez na nuca e até mesmo meningite. Nas formas mais graves, instala-se a flacidez muscular, que afeta, em regra, um dos membros inferiores.
:: Tratamento: não existe tratamento específico. Todas as vítimas de contágio devem ser hospitalizadas, recebendo tratamento dos sintomas, de acordo com o quadro clínico do paciente.
:: Sequelas: as principais são problemas e dores nas articulações; pé torto, em que a pessoa não consegue andar porque o calcanhar não encosta no chão; crescimento diferente das pernas; osteoporose; paralisia de uma das pernas; paralisia dos músculos da fala e da deglutição; dificuldade de falar, entre outras.
:: Prevenção: a vacinação é a única forma de prevenção da poliomielite. Todas as crianças menores de cinco anos de idade devem ser vacinadas conforme esquema de vacinação de rotina e na campanha nacional anual.