A coleta de resíduos em Caxias do Sul, que já foi modelo para outras cidades gaúchas e de outros Estados, virou motivo de críticas por parte da população e dos representantes do povo. As queixas dos moradores são de acúmulo e não recolhimento de todo o lixo, onde ele é feito de forma manual, e de transbordamento em contêineres e falta de limpeza no entorno das caixas coletoras, onde o processo é mecanizado. Os problemas teriam aumentado nos últimos dois a três anos.
Já os vereadores relatam precariedade estrutural da responsável pelos serviços, a Companhia de Desenvolvimento de Caxias (Codeca), como falta de materiais e veículos sem operação.
No dia 12 deste mês, a vereadora Denise Pessôa (PT) trouxe relatos durante a sessão da Câmara de Vereadores, que no dia anterior houve atraso na saída das equipes da capina porque faltou fio e combustível para as roçadeiras e que cerca de 90 funcionários do Departamento de Construção Civil (DCC) ficaram parados por um ou dois dias por falta de caminhões e de asfalto, já que a usina não estava funcionando.
— Tem caminhão que está parado por R$ 90, R$ 150. Qual o prejuízo disso? Uma equipe ficar parada, ganhando (salário) porque falta uma peça para um caminhão. Acho que estamos com um problema muito sério na Codeca. Estamos com problema nas obras, na capina, na coleta. Então, o que está funcionando? A varrição, que depende do trabalhador e uma vassoura? — criticou a parlamentar.
O vereador Zé Dambrós (PSB) informou que apenas uma carreta estava levando o lixo orgânico do pavilhão em São Giácomo até o aterro sanitário no Rincão das Flores, na localidade do Apanhador. Isso porque as outras três estavam estragadas. Com isso, os caminhões da coleta, que normalmente levam os resíduos até o pavilhão, estavam tendo que fazer o trajeto até o Apanhador, aumentando o tempo de viagem e o gasto com combustível. Ainda disse que há veículos circulando com pneus bastante desgastados. Ele também mencionou que o Serviço Autônomo Municipal de Água e Esgoto (Samae) notificaria a Codeca por 107 pontos em que a autarquia fez conserto na rede de água e esgoto e a companhia não fez os reparos por falta de material para recompor o asfalto. O Samae confirmou a existência dos 107 pontos que necessitam de reparo e disse que o setor jurídico da autarquia analisa se notificará ou não a companhia.
— Isso é um absurdo. Chegou no fundo do poço — declarou Dambrós.
Crise financeira levou ao sucateamento
A explicação para as dificuldades relatadas, segundo a presidente da Codeca, Helen Machado, está na situação em que a empresa chegou de déficit financeiro, falta ou ineficiência em processos e de problemas de gestão. Desde que foi criada, em 1975, a Codeca teve o foco voltado para a inovação. Em 1981, começou a atuar na construção civil. Dez anos depois, na coleta seletiva e, em 2007, foi precursora no país na coleta mecanizada. As ações fizeram com que, durante anos, Caxias figurasse entre as 10 cidades mais limpas do Brasil, até 2017, quando ocupou o quinto lugar. Nesse ano, a empresa já começava a aumentar o déficit financeiro que, no ano anterior, era de R$ 549.067, para R$ 7.301.303. A partir daí, o município desapareceu do ranking.
Para a gestora, um dos principais causadores da situação deficitária foi a empresa ter perdido receitas importantes e de forma drástica em 2017, com corte de R$ 20,5 milhões. Depois, segundo avaliação dela, só houve um crescimento vegetativo da receita e não ampliação do negócio, que segue a lógica de qualquer empresa: se tem prejuízo, não investe e, não investindo, não cresce. Atualmente, o prejuízo acumulado, desde 2016, é de R$ 29.741.250,00. O valor seria suficiente, por exemplo, para comprar cerca de 60 caminhões, que representaria a renovação de 70% da frota destinada a fazer a coleta manual e mecanizada na cidade.
— O que aconteceu conosco nos últimos anos? Não somos sustentáveis nem inovadores. A situação em que a empresa se encontra hoje não tem como resolver com um simples ato de gestão. Precisamos de um choque de gestão. E isso começa desde o processo mais primário até a estratégia do negócio. Hoje, a Codeca não precisa que façamos o básico. Ela precisa que façamos o extraordinário — disse, durante a apresentação do plano de gestão da empresa na Câmara de Vereadores.
Para tentar tirar a empresa da crise e torná-la economicamente viável, foram elencadas diversas ações no plano de gestão. Entre os novos processos que foram implementados neste ano está o monitoramento de veículos que necessitam de manutenção, algo que não era feito até então. Em fevereiro, quando começou o controle, eram 55 veículos; em março, 75 e, em abril, 35 (19 pesados e 16 leves). De acordo com a diretora, em 90% dos casos eles estavam estragados porque a empresa não tinha contrato de licitação para os consertos.
— Se hoje eu não tenho carro para colocar na rua é porque eu não tenho contrato vigente — disse Helen.
De janeiro até março foram feitos 146 termos para licitação de manutenção. No plano de ação da empresa está prevista a manutenção preventiva, o estudo de viabilidade de investimento na conteinerização e para ampliação da coleta mecanizada, entre outros.
— Temos que pensar tanto na questão dos contêineres quanto da coleta mecanizada para o futuro da Codeca, porque a cidade cresceu. Não tem como continuar atendendo como atendia há 10 anos, que é o que fazemos hoje — declarou a gestora.
A Codeca em números:
:: Caxias do Sul produz cerca de 450 toneladas diárias de lixo doméstico (360 toneladas de lixo orgânico e 90 toneladas de resíduos seletivos)
:: O trabalho envolve 314 funcionários ativos e 83 caminhões (16 deles mecanizados) e é realizado em quatro turnos de seis horas cada
:: A coleta de resíduos orgânicos e seletivos abrange 100% do município
:: Há um total de 1.216 funcionários nas áreas de limpeza urbana, pavimentação e obras
:: A receita de 2020 foi de R$ 109.328.427
:: Os gastos com avarias e seguros em 2020 foi de R$ 398.601
:: Os gastos com funções gratificadas em 2020 foi de R$ 1.609.921
:: Horas extras em 2020 - 66.481, num total de R$ 1.361.699 no ano
:: 108.212 horas de atestados em 2020, num total de R$ 1.458.182 no ano (com os encargos na folha de pagamento, ficou em R$ 2.216.437). Como se tivesse 50 funcionários a menos por mês (considerando que a jornada mensal é de 180 horas) ou 601 funcionários a menos no ano trabalhando.
:: Gasto de R$ 4.119.684 em 2020 com periculosidade e insalubridade, num total de R$ 6.261.920 com os encargos no ano. Isso representa 5,73% da receita.
:: Processos trabalhistas chegam no acumulado a R$ 7.845.840, o que representa 7% da receita anual.
:: Processos cíveis acumulados são de R$ 352 mil.
*Fonte: Codeca
Sobre os problemas relatados:
:: Acúmulo e não recolhimento de todo o lixo: segundo o diretor Operacional da Codeca, Rafael Tregansin, nos últimos anos houve envelhecimento da frota e um grande volume de manutenções a serem feitas. Se algum roteiro não ficou coberto em um dia, a empresa dá prioridade para que no dia seguinte seja feito.
:: Transbordamento em contêineres e falta de limpeza no entorno: os funcionários da Codeca devem recolher. Informações devem ser passadas pelo Alô Codeca 54 3224 8000.
:: Carretas (que fazem o transbordo) estragadas: em razão do envelhecimento e uso cotidiano, tiveram problemas técnicos. Duas (das quatro) já estão novamente em operação e outra aguarda processo de licitação para compra de peças e retífica de motor. Atualmente, os resíduos são transportados pelas duas carretas. Quando há necessidade, outros caminhões da empresa podem ser utilizados. A distância percorrida ao aterro é de cerca de 40 km. Quando necessário o deslocamento, aumenta a despesa com o diesel. A coleta não foi prejudicada.
:: Sobre a falta de fio e combustível para roçadeiras, falta de caminhões e de material para a equipe do DCC, usina inoperante, não recomposição do asfalto em pontos de conserto do Samae e pneus desgastados, a presidente da Codeca diz que: "A Codeca tem tido problemas com fornecedores em virtude da crise financeira de conhecimento de todos, agravada há cinco anos, com um déficit de R$ 30 milhões. Infelizmente, este ano, esta será a realidade da empresa. Enquanto não tiver capital para investimentos e capital de giro, a situação tende a se agravar".