Certos diálogos que travamos ao longo da vida não saem tão facilmente da memória. Um deles foi na minha infância. Aos nove anos, perguntei a uma coleguinha se ela também seria doadora de órgãos.
- Eu não. Meus pais disseram que se eu morrer e doar, vou ficar feia no velório. Se não, fica lá, bonitinho.
Perdi o contato com essa amiga e não sei se hoje, aos 25 anos, ela mudou de ideia. Sinceramente, espero que sim. Enquanto você lê essa crônica, por exemplo, 1,1 mil pessoas aguardam por um rim no Rio Grande do Sul. Outras 188 estão na fila esperando por uma córnea. É importante, porém, admitir que há um avanço. A Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO) divulgou que o Brasil cresceu 3% nas doações e transplantes de órgãos em 2014.
Mas é imprescindível lembrar que existem inúmeras pessoas que ainda pensam como essa minha amiga. Eu acreditava que isso acontecia só pela falta de informação.
Muitas famílias não autorizam a doar os órgãos do ente porque não sabiam o desejo dele em vida. Depois, soube que há religiões que aconselham não realizar o ato. Pois bem, a minha vontade, eu declaro aqui: sou doadora. Por quê? Porque um único doador pode salvar, em média, de oito a dez pessoas.
Ok, falar é fácil, difícil é dizer, na hora em que se sabe da morte de alguém tão próximo, que você permite submetê-lo a uma nova cirurgia, agora, sem estar vivo. Mas lembre-se que a vida continua, aqui, do lado de fora, e nada pode ser mais solidário que permitir estender a vida de um familiar no corpo de outra pessoa.
Eu, aos nove anos, já tentava convencer os coleguinhas do colégio a se tornarem doadores porque, bem, entendo sobre o assunto. Naquele ano, uma familiar minha, muito muito próxima, submeteu-se a um transplante de rim. O filho de uma senhora morta disse sim ao médico. Essa atitude permitiu anos felizes à vida dessa minha parente e, por consequência, de quem convive com ela. Dezesseis anos depois, estamos novamente na fila do SUS. E assim como nós, há sempre uma família esperando, ali, ansiosa, a ligação da central de transplantes. E acredite: essa espera é árdua. Por isso, caso você também seja doador, espalhe por aí. Permita que todos saibam o quanto solidário você é.
Opinião
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