* Carlinhos Santos (interino)
Feito confetes de carnaval, os pequenos recortes do que se fala aqui e acolá dão ideia do que anda pelas cabeças, pelos botecos, "que está na fantasia dos infelizes, que está no dia a dia das meretrizes, no plano dos bandidos, dos desvalidos. Em todos os sentidos." A citação de Chico Buarque excita. Ele próprio, que é um "vai passar" quase unânime, semana passada surpreendeu meio mundo ao dar canja num boteco da Lapa. Do Rio, Chico nos acompanha. Corta para Caxias, num abre alas para as alegorias aqui possíveis.
"... mas é que a Dilma", diz um dos três senhores que caminham todo dia, bem cedo, no Parque dos Macaquinhos. O trio se veste bem, tem cabelos brancos ou quase, e parece ser aposentado. Dois ao menos, pela cor do cabelo e tal, sinalizam mais do que 65 anos. A caminhada segue e, mais adiante, outro recorte da fala cita "... quando o Geisel...". Contrastes, quiçá contradições. Estariam estes cidadãos debatendo os rumos, acertos ou desacertos ".... no tempo dos milicos", citando mais uma das expressões citadas na sequência da caminhada?
A corrupção é outra das alegorias recorrentes do compasso. "Somos todos, quem nunca", provocou um texto, na semana que passou. Sim e não. Sim, mas. Parece que, ao olharmos a fantasia do outro, mais exuberante, somos tomados de uma profunda necessidade de falar (seria contra-atacar?) sobre ostentação, duvidando, inquirindo, regateando. Patrulhas versus petralhas, sugeria o texto. Corrupção, às vezes não se discute só no âmbito da vida pública. Nossa intimidade, nossos egos e veleidades - ora postados e debatidos em redes, ora escamoteados por bem articulados argumentos - às vezes passeiam por turvas regiões do caráter. E, este sim, é o motor que aciona nossa vontade de botar o bloco da ética na rua.
Nisso, nesse nosso desfile - carnavalesco, político, ético, de vontades e vaidades - a cacofonia é proposital. Não é plácida. Pois, ao mesmo tempo que esconde muito, também revela. De onde não se pode esperar nada é daí que não sairá nada mesmo, já ensinou o sábio (e humorado, ufa!) Barão de Itararé. É a impressão que ficou na nova engenharia feita para a folia caxiense: falta de diálogo com a cidadania, desconhecimento de valores acerca de ambientes de preservação patrimonial, distorção do discurso em torno da valorização do nosso samba. E, nesse caso, não dá para ficar só no confete, no repique ou na alegoria: "cada paralelepípedo da velha cidade essa noite vai se arrepiar."
* O colunista Gilberto Blume está em férias.
Opinião
Carlinhos Santos: Nesse nosso desfile a cacofonia é proposital. Não é plácida
Não dá para ficar só no confete, no repique ou na alegoria
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