
O majestoso estádio Baixada Rubra foi a casa do Flamengo de 1951 até 1975. Construído de madeira, o espaço era amplo para a época e com direito à camarotes. Perto do campo, a visão era privilegiada para receber os cavalheiros e as senhoritas.
O asfalto ainda estava longe de mudar o cenário das ruas no entorno da Baixada Rubra. O espaço era rodeado de árvores e com vias de chão batido.
— Tinha uma escolinha municipal, num canto do terreno, tinha pavilhão, depois veio a parte de concreto, na parte reta do campo, que inclusive o Maneca fez muita campanha de vidro, latinhas, para conseguir construir. Então, olha a maneira que eles trabalhavam para conseguir recursos, para construir um estádio. E todo mundo colaborando, torcedor trazendo tijolo, dando cimento, vidro, latinhas e assim construíram. Eu lembro que quando reformaram esse gramado, eu ajudei a demarcar ele. Sabia de cabeça as medidas dos campos — lembrou o ex-goleiro Bagatini.
O primeiro passo para a grande reformulação do estádio foi dado em 1965, quando iniciou a construção de arquibancadas de concreto, do lado oposto ao pavilhão. Do lado direito do setor, havia uma meia-lua feita de pedras.
SURGE O TEMPLO GRENÁ
Após a fusão entre Flamengo e Juventude ser desfeita, os dirigentes do Flamengo decidem voltar com o nome de Sociedade Esportiva e Recreativa Caxias do Sul, mantendo as cores do clube, mas valorizando a força local com o nome. Assim, a Associação Caxias de Futebol chegava ao fim em 1975. No mesmo ano, o agora Caxias pleiteou uma vaga no Campeonato Brasileiro da temporada seguinte. A Confederação Brasileira de Desportos condicionou à vaga a uma condição:
— Estávamos num jantar na chácara do Francisco Stedile, na época era o Heleno Nunes o presidente da CBD, e houve a proposição do Francisco para disputar o Campeonato Brasileiro. E houve a promessa do Heleno Nunes: se construísse um estádio para 30 mil pessoas, estaria dentro do Campeonato Brasileiro — afirmou o ex-goleiro Bagatini.
Diversas mãos se uniram para tirar do papel o projeto. João Carlos Pratavieira, conselheiro do clube, participou da comissão de obras.
— Foi um trabalho maravilhoso que o Francisco Stedile fez. Quando começou a desmontar o velho pavilhão, eu me dirigi ao senhor Francisco. Falei para ele parar, desmontar o pavilhão em partes e construir gradativamente. O senhor Francisco, com aquela sabedoria, me disse: "meu filho, quem desmonta é porque vai construir" — recordou João Carlos Prataviera.

Uma alternativa para construir o estádio foi contar com a força das empresas da Serra. Stedile pegou sua pastinha, colocou embaixo do braço e saiu para visitar colegas empresários. Ele conseguiu o apoio de 63 empresas. Elas contribuíram com Cr$ 2.000 por mês durante dois anos. Assim, os recursos estavam encaminhados para pagar a obra.
— Eu conheci a antiga Baixada Rubra e ainda acompanhei a construção do novo estádio diariamente, porque como morava perto. A gente vinha toda hora aqui para ver como estava, era uma felicidade quando subia, quando se montava mais um bloco, mais uma parte. A torcida era muito grande para ver o estádio terminado e construído, porque tinha um objetivo, que era participar do Brasileiro — comentou o atual presidente do Caxias, Roberto de Vargas.
Com um gigante estádio gravado no interior do estado, o clube ainda precisava de recursos. Acostumado a entrar em campo com a camisa do clube, o goleiro Bagatini também ajudou fora das quatro linhas. Ele vendeu cadeiras da nova casa para angariar recursos e, assim como no campo, foi um sucesso.
— A minha negociação com o senhor Francisco, então presidente da Associação Caxias do Futebol, era que na hora de renovar o contrato, eu usaria o meu conhecimento com os empresários e tentaria ajudar a vender as cadeiras. Eu vendi 150. Até que chegou o momento que ele disse: "olha, Bagatini, tudo bem, pode parar de vender as cadeiras, agora vamos jogar futebol só" — descreveu o ex-camisa 1.
Nesse jogo contra o Inter eu fiz a minha maior defesa da história
BAGATINI
Ex-goleiro do Caxias
A inauguração do Estádio Centenário ocorreu em 1976, no dia 12 de setembro, quando o Caxias recebeu o Inter pelo Brasileirão. A partida terminou com vitória Grená pelo placar de 2 a 1, com gols de Osmar e Bebeto. Três dias depois da inauguração houve a utilização dos novos refletores na partida contra o Palmeiras, que terminou empatada sem gols.
— Nesse jogo contra o Inter eu fiz a minha maior defesa da história. Num lançamento, num chute do Valdomiro, onde lançaram a bola para o Escurinho e eu saí contra o Escurinho para diminuir o ângulo. Ele cruzou na frente da área para o Valdomiro e ele chutou. E eu saí correndo e fiz a defesa. Essa eu considero a maior defesa que eu fiz num jogo de futebol — destacou Bagatini.
BRASILEIRÃO 1976

O Campeonato Brasileiro de 1976 foi inchado pela política militar. Naquele tempo, a influência era grande e 54 times jogaram à elite. O campeonato era bem diferente do atual Brasileirão. Na primeira fase, os clubes foram divididos em seis chaves, em turno único, com nove clubes em cada. Passavam para a segunda etapa os quatro primeiros colocados de cada grupo, sendo que os demais clubes classificavam-se para a repescagem.
— O Caxias foi o primeiro clube do interior do estado a participar do Campeonato Nacional de Futebol. O jogo de estreia foi contra o Santos, no dia 1º de setembro. Perdemos por 2 a 1, e aqui na inauguração do estádio foi uma noite festiva, bonita, tinha muita gente — contou João Carlos Prataviera.
Caxias do Sul mesmo começou a ser conhecida no Brasil a partir daquele momento
BAGATINI
Ex-goleiro do Caxias
No Brasileiro, o Caxias integrou o Grupo 1, com Grêmio, Inter, Santos, Palmeiras, Avaí, Desportiva Ferroviária, Figueirense e Rio Branco-ES. O Grená foi o primeiro fora do G-4, foi para repescagem e avançou como líder do grupo com cinco times. Na terceira fase, novamente um grupo com nove times e só o líder passava. O Caxias foi eliminado em sexto. Na classificação geral, entre 54 clubes, o Caxias ficou em 15º. O título ficou com o Inter.
— Eu diria que a cidade de Caxias do Sul mesmo, com todo o potencial que tinha, começou a ser conhecida no Brasil a partir daquele momento — relembrou Bagatini.
No ano seguinte, o time grená voltou a ter um bom rendimento, ficando em 23º lugar entre 62 equipes.
— Acompanhei aquele time como membro do departamento médico, no primeiro jogo do Campeonato Nacional de 1976, eu tive a oportunidade de acompanhar o grupo diretivo na cidade de São Paulo — João Carlos Prataviera.
UMA FORÇA QUASE CENTENÁRIA

A casa do Caxias leva a alcunha de Francisco Stedile em homenagem ao patrono da construção do gigante de concreto. O nome popular de Centenário veio devido ao período em que houve a construção. No ano de 1975, a Serra celebrava um século da imigração italiana.
A casa grená também recebeu a bênção do Rei do Futebol. O então ministro extraordinário dos Esportes, Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, visitou o município de Caxias do Sul em 17 de julho de 1995, em busca de apoio para incentivar e massificar o esporte. O ex-jogador esteve na Casa da Cultura e nos estádios Centenário e Alfredo Jaconi. No Caxias, Pelé assinou uma flâmula do clube. O objeto é guardado com muito cuidado pelo funcionário Jorge Roth, que trabalha no setor administrativo desde 1997.

A grande conquista da história do Centenário veio somente na virada do século. Em 2000, o time comandado pelo técnico Tite surpreendeu o Rio Grande do Sul. A conquista do Gauchão foi o ápice diante da força da Capital. Na final, o Grená encarou o Grêmio. O jogo de ida, com amplo domínio no Centenário, terminou com 3 a 0 para o Caxias. A volta foi em Porto Alegre. O título veio com um empate sem gols.
— Quando nós entramos em campo aqui em Caxias e que o time jogou como jogou, não tem o que dizer. O time foi perfeito. O resultado foi de três, mas se fosse seis, sete, não seria uma zebra. Naquele momento eu disse "nós somos campeões". E um dirigente do Grêmio, quando saiu do camarote, olhou pra mim e disse assim: "D'Arriguinho, pela amizade, ainda bem que foi só três. Porque a gente consegue reverter lá". Eu botei a mão no ombro dele e disse: "Vocês vão ter que fazer muito pra reverter esses três" — comentou Nelson D'Arrigo, presidente do Caxias, campeão Gaúcho de 2000.
NO TERCEIRO EPISÓDIO...
A última parte da série "Ser Grená - 90 anos de uma Paixão" irá trazer os honradores deste amor incondicional. Pessoas que fizeram história, marcaram o seu nome e vibram na arquibancada com o Caxias.