Balança tem a função de medir o peso das coisas. É também o mesmo instrumento utilizado pelos economistas para avaliar o termômetro do comércio exterior de um país, do Estado e dos municípios. De um lado da balança está o que se compra do mundo. Do outro, o que vendemos para além das fronteiras.
Em 2024, esse saldo ficou positivo em Caxias do Sul, o chamado superávit. De janeiro a dezembro, a maior cidade da Serra vendeu US$ 172,2 milhões a mais do que comprou. O resultado é 46% menor do que em 2023, quando fechou com saldo de US$ 252 milhões.
Ao todo, Caxias encerrou o último ano com US$ 699,94 milhões exportados (veja mais no gráfico), o equivalente a R$ 4,1 bilhões na conversão atual do câmbio.
Apesar de positiva, as vendas para o Exterior ficaram 3% menor em relação a 2023, quando atingiram R$ 721,5 milhões em negócios, o que representa redução de US$ 30 milhões no montante. Os dados são do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC).
Os números colocam Caxias do Sul como a nona cidade que mais vende para o Exterior no Estado, colaborando com 3,4% das exportações gaúchas, e entre as cem do país. Os dados já foram melhores: em 2018, por exemplo, as vendas para o Exterior atingiram a casa dos US$ 827,5 milhões, o melhor resultado da última década.
A redução no espaço caxiense no mundo traz um alerta, segundo o diretor de Planejamento, Economia e Estatística da Câmara de Indústria, Comércio e Serviços (CIC) de Caxias do Sul, Tarciano Mélo Cardoso. Segundo ele, há barreiras que precisam ser superadas para que a região ganhe mais protagonismo no mercado internacional.
— A perda de mercado exportador é algo que precisa ser melhor analisada. É ser menos competitivo e que nos torna mais improdutivo perante o mundo. Entre os fatores que inibem a exportação está a carga tributária, que é um peso enorme, a produtividade da mão de obra no Brasil, que aqui não é diferente e acaba sendo muito baixa. A própria logística da Serra, que é ruim e acaba refletindo como custo, que vai para o preço do produto final e acabamos sendo menos competitivos que o resto do mundo — exemplifica.
O que chama a atenção, na última década, é o crescimento das importações, que atingiram em 2024 o maior número nos últimos 10 anos. De janeiro a dezembro, Caxias comprou US$ 527,71 milhões, uma alta de 12,5% em relação ao ano passado, figurando entre os sete municípios gaúchos que mais importam produtos no Rio Grande do Sul.
— Não somente para a indústria, mas pensando nas pessoas em casa, cresceram muito as compras vindas da China. As compras online aumentam a cada ano e refletem nesses indicadores — explica Cardoso.
Ainda conforme o especialista, a maior parte das importações é de insumos que não são produzidos no mercado interno.
— As importações crescerem mais que as exportações não é um risco. O empresário vai buscar onde é mais rentável, onde consegue ter uma performance melhor. Se está vindo de fora produto acabado, que vale mais a pena do que comprar interno, pode ser um risco para o mercado local. Mas vem muita matéria-prima, algo que não temos aqui — avalia.
EUA lideram como destino para exportações
Quase 20% do que é produzido em Caxias do Sul é vendido para os Estados Unidos, seguido de Chile e Argentina. Em relação aos dois países vizinhos, o economista Tarciano Cardoso lembra que tanto Chile como Argentina passaram por momentos turbulentos na economia, o que fez com que as vendas caíssem.
— E a gente não conseguiu realocar os nossos produtos em outros locais do mundo. Se for analisar em âmbito de Brasil, o país tem uma pauta exportadora muito grande, mas é de grãos, de matéria-prima, que é algo que Caxias não tem — analisa.
Sobre as importações, a China predomina o mercado, com metade do que é vindo. São máquinas, equipamentos e itens como semicondutores, fundamentais para o andamento da indústria caxiense.
O que é balança comercial?
- A balança comercial é a diferença entre o valor das exportações e das importações de um país.
- O resultado da balança comercial pode ser positivo, quando as exportações são maiores que as importações, ou negativo, quando as importações são maiores que as exportações.
- O resultado positivo é chamado de superávit, e o negativo de déficit.
Como é calculada a balança comercial?
- Para calcular a balança comercial, subtraia o valor das importações do valor das exportações.
Fonte: Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC)
Porto seco movimenta 500 contêineres por mês
Um símbolo do vai e vem de mercadorias internacionais é o Porto Seco da Serra Gaúcha, localizado às margens da RS-122, em Caxias do Sul. Com 54 mil metros quadrados e formado por armazéns e áreas externas, a estrutura movimenta entre 450 e 500 contêineres por mês.
O local é utilizado pelas empresas para importar e exportar cargas – sendo que a maior parte dos clientes vem da Serra. Mais de 90% dos trâmites envolvem a nacionalização de contêineres com matérias-primas trazidas do Exterior pelas companhias de setores como automotivo, metalmecânico, moveleiro e vitivinícola.
O espaço funciona como uma empresa privada que tem a permissão de explorar o serviço até 2045. Os protocolos são seguidos conforme as regras da Receita Federal, que vão desde o acesso restrito até prazos para recebimento e armazenagem dos produtos.
Na prática, passar pelo Porto Seco não é uma obrigatoriedade para as mercadorias que chegam na região, segundo o responsável pelo terminal, Mauro Vencato.
— Somos uma zona secundária, um almoxarifado de terceiros. Na zona primaria, que é a fronteira terrestre, portos ou aeroportos, aí sim é obrigatório. Aqui é um serviço por sermos interior e vendemos esse trabalho.
No pátio, durante um breve passeio da reportagem no local, é possível ver funcionários descarregando contêineres, que chegam, muitos deles, com máquinas e matérias-primas voltadas para a indústria. Ou até mesmo itens inusitados, como carros antigos importados, com placas de outros países, que ficam ali até os proprietários buscarem a Receita Federal e um guincho virem buscá-lo – sair dirigindo do local não é uma opção.
De acordo com Vencato, 80% das mercadorias por contêineres que chegam em Caxias do Sul vem do Porto de Rio Grande, no sul gaúcho, seguido dos portos de Itajaí (SC) e Santos (SP). Para ele, o investimento na construção de um porto em Arroio do Sal, no Litoral norte gaúcho, vai permitir avanços no serviço.
— Temos uma distância muito grande entre os portos. São quase mil quilômetros de ida e volta até Itajaí. Até Rio Grande são 900 quilômetros. De Arroio do Sal, seriam 400 quilômetros. Vai fazer bem para o serviço portuário do Estado. Santa Catarina tem cinco portos em atividade, aqui temos somente um — avalia.
Fornecedora de vidros desenvolve produtos exclusivos para outros países
Em oito anos, as vendas para o Exterior saltaram de 3% para 15% na Vidroforte – fornecedora caxiense de vidros especiais para ônibus, caminhões, agrícolas, trens, entre outros. O objetivo é atingir os 30% nos próximos anos, o que é buscado com a atração de novos mercados.
Com o Chile, Uruguai e Paraguai como principais clientes, a marca chega agora à Espanha e se prepara para atrair clientes no Oriente Médio. Vale até mesmo desenvolver um modelo de produto exclusivo para o continente.
— Estamos pensando em produtos que não temos no Brasil, especialmente para determinadas regiões. Pelo volume de produtos que estamos levando pra lá, vai impulsionar a gente a buscar os 30% de vendas no Exterior. E fornecer para a Europa é um grande certificado de qualidade — aponta o responsável pelo mercado externo da Vidroforte, Carlos Heinen Filho.
Atualmente, o forte da exportação são os para-brisas. Segundo Heinen, 95% dessa linha vendida é para ônibus, justamente por ser um segmento que a empresa consegue ser competitiva e ter preços mais atrativos que marcas chinesas, por exemplo.
— É mais vantajoso mesmo sendo um mercado mais reduzido em quantidade por item. Se tem mais caminhões, por exemplo, do que linhas de ônibus. Mas isso nos dá mais competitividade, podendo atender desde o pequeno ao grande distribuidor, seja no Chile ou na Costa Rica — explica Heinen.
A empresa tem um setor específico para vendas no Exterior, investimento na qualificação da equipe. Ao mesmo tempo, o desafio é competir com o mundo todo na hora de buscar novos clientes pelo planeta.
— Se a gente exporta para determinado país, muitos outros estão vendendo para aquele local. No Brasil, os nossos concorrentes são A, B ou C. Lá fora é muita gente. Por isso, precisamos viajar mais, descobrir as necessidades do cliente. Às vezes preparamos um produto para envio de uma forma porque pra nós é mais fácil, mas quando chega no cliente o descarregamento e a abertura das caixas se torna mais difícil pra ele. Precisamos estar próximos e isso é um grande desafio — detalha o empresário.
Exportar para se proteger
Na Sulcorte Importadora de Ferramentas, localizada no bairro Nossa Senhora da Saúde, em Caxias do Sul, as exportações representam 20% do faturamento da empresa. A marca produz serras circulares para o corte de metais. Ao mesmo tempo, depende da importação de matérias-primas para manter a cadeia produtiva.
— Estamos ano a ano crescendo e tentando trazer mais receitas. Não queremos ficar dependentes da flutuação cambial. O real vem se desvalorizando frente às demais moedas, como o dólar e o euro, que são as principais moedas negociadas no mundo. A exportação vêm pra nós como uma proteção, a gente chama de hedge. Ao mesmo tempo, infelizmente, a gente tem que importar bastante as nossas matérias-primas, que não existem no Brasil — explica o CEO da empresa, Gustavo Spanholi.
Estados Unidos, México, Rússia e Argentina estão entre os principais compradores.
— Investimos bastante em feiras e em viagens, e é um mercado que está mais liberal, que nos aceitou melhor pela qualidade do nosso produto. Dentro do nosso planejamento estratégico, é onde a gente vai dar mais foco, como américas do Norte, Central e do Sul — afirma.
No mercado nacional, a Sulcorte é líder no segmento, segundo Spanholi, e o objetivo é estar na ponta também em âmbito global nos próximos anos. Para atingir a meta, a empresa tem apostado na qualificação dos profissionais e na importação de máquinas mais modernas, grande parte delas vindas do continente europeu.
— Quando se fala em fabricação de serra e é um mercado, vamos dizer assim, internacionalmente falando, pequeno. Não existe interesse de fabricantes nacionais em produzir esse tipo de maquinário. Todas as matérias-primas envolvidas, os aços, os aços de alta liga, com alta resistência mecânica, também são importados. Não tem usinas no Brasil que se interessam em fabricá-lo. Alguns componentes da fabricação da serra, como pastilhas e soldas, também devem ter que ser importados, porque hoje não existe a fabricação nacional.
O CEO explica ainda que os preços de marcas chinesas, muitas vezes, são mais atrativos, mas ainda falta avanços na qualidade do produto.