A oscilação do clima em 2022, com dias de calor atípico, seguido frio extremo e de geada intensa, em alguns dias de agosto, deve trazer perdas significativas para a agricultura na Serra, especialmente, aos produtores de pêssegos e ameixas. Ainda não é possível contabilizar o tamanho do prejuízo, mas os representantes dos agricultores de Caxias do Sul, Bento Gonçalves, Farroupilha e Flores da Cunha que também englobam outras cidades da região já adiantam que as mudanças bruscas de temperatura tiveram impactos na produção.
Uma das soluções para prevenir as perdas e que já está em uso em diversos municípios da Serra é o sistema anti-geada. Ele irriga as plantas para congelar os brotos e frutas e assim preservar a planta até que as temperaturas voltem a ser positivas. No entanto, nem todos os produtores têm como implantar esse sistema porque o custo é elevado.
Os danos só podem ser contabilizados a partir de outubro que é quando começa a maturação dos frutos. Em Farroupilha, dos 200 produtores dessas culturas, 70 já acionaram o custeio, o que significa que já perceberam que terão perdas. Os maiores danos são concentrados nas frutas de caroço, mas há preocupação também com a uva. A previsão ainda indica temperaturas baixas com risco para geadas nesta quarta-feira (31), com mínimas entre 0 e 4°C, o que intensifica a preocupação com novas perdas.
O engenheiro agrônomo Enio Todeschini, extensionista da Emater, explica que as variedades tardias de pessegueiros e ameixeiras estavam nas fases mais críticas, no inicio da formação das frutas, que coincide com a queda das pétalas. Com temperatura de 0 grau, quando a semente, que também é chamada de amêndoa, está em estado líquido e congela fácil, o que faz com que a fruta não amadureça e caia.
— Se ela não cair, o que acontece seguido, a fruta chega até maturar, mas perde o valor comercial porque fica com o caroço aberto e a polpa deformada. Posso citar três variedades de pêssegos que estão bem nessa fase mais crítica: a chiripá, eragil e barbosa. De ameixa, é a variedade fortune.
Todeschini ressalta que haverá sim perdas, mas também é preciso avaliar que quando a intensidade da geada é fraca há benefícios às culturas. O engenheiro agrônomo explica que o frio concentrado em maio e junho, e o calor antecipado em julho e agosto, fez com que a transformação da flor em fruta ocorresse em um índice acima da média:
— Há uma certa seleção da natureza que vai derrubar essa frutinha e isso ajuda porque depois tem que derrubar manualmente e é um serviço bastante oneroso.
Isso é importante para que o fruto seja maior. Na safra passada, segundo ele, os produtores não conseguiram derrubar os frutos, o que sobrecarregou as árvores e as frutas ficaram pequenas, o que impacta no valor de mercado.
Em Caxias, há cerca de 2 mil produtores
Aproximadamente 2 mil agricultores trabalham com plantações de frutas de caroço em Caxias do Sul. A presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Caxias do Sul, Bernardete Boniatti Onsi ressalta que diariamente recebe relatos de produtores das frutas e também de peras e de uvas. Entre eles cresce a apreensão com a possibilidade de geada.
— Temos que torcer para que tenha vento ou fique nublado ao amanhecer para não ter formação de geada nos próximos dias ou teremos mais perdas — afirma.
O secretário de Agricultura de Caxias, Rudimar Menegotto, afirma que há preocupação em relação a geada, depois do calor excessivo que acelerou a brotação em 15 a 20 dias. Ele acredita que terá mais prejuízo nas ameixeiras:
— Muitos agricultores perderam ameixa na parte mais baixa dos pomares por causa da geada — destaca o secretário.
De 200 produtores, 70 acionaram seguro em Farroupilha
Em Farroupilha, dos 200 produtores, 70 acionaram o custeio, que é o seguro agrícola, segundo o presidente do Sindicato dos Agricultores Familiares de Farroupilha, Márcio Ferrari. Ele pontua ainda que é cedo para quantificar as perdas, e que a preocupação agora é com a possibilidade de geada nos próximos dias:
— Estamos na eminência de acontecer outros eventos de frio extremo com geada e que podem ser até maiores do que foi no dia 19 e 20. Todos os produtores estão apreensivos, inclusive, da uva, porque o inverno não acabou ainda e todas as plantas adiantaram a brotação — aponta Ferrari.
Sindicato orienta a acionar seguro e buscar informações para manejo em Flores da Cunha e Nova Pádua
Em Flores da Cunha e Nova Pádua também haverá perdas, especialmente, nas frutas de caroço. O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais das cidades, Olir Schiavenin, orienta os produtores a acionarem o Proago e a monitorar as culturas.
— Acredito que todos que tem fruta de caroço vão acionar o seguro e depois os técnicos do sindicato, das secretárias da Agricultura e até dos bancos vão mapear os prejuízos e fazer vistorias nas propriedades para ter o levantamento dos prejuízos.
Schiavenin destaca também que o produtor pode contatar o sindicato por meio do telefone (54)32927500 para conversas com os técnicos e encontrar melhores maneiras de manejo da produção.
Bento Gonçalves e Pinto Bandeira estão prevendo redução da safra
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Bento Gonçalves Cedenir Postal destaca que há culturas atingidas especialmente, no distrito de São Pedro em Bento Gonçalves e na cidade de Pinto Bandeira, que é um dos maiores produtores de pêssegos do RS.
— Não vamos perder toda a safra, mas terá redução. Claro que temos casos pontuais de alguns produtores dependendo da região que podem perder praticamente tudo, mas parecia que seria ainda pior — destaca Postal.
Sistema anti-geada evitou perdas em propriedade de Caxias
O agricultor Nei Carlo Zanette, que tem propriedade em São Gotardo de Vila Seca, no interior de Caxias do Sul, implantou o sistema anti-geada em 2022 em uma área onde já chegou a perder 80% da produção, nos dois últimos anos. Ele explica que quando você aciona a bomba, os aspersores funcionam para molhar a aérea. Assim se forma o gelo, protegendo o fruto para que a temperatura não baixe de 0 graus.
Para ele, o investimento alto valeu a pena porque ao salvar a produção conseguirá um preço melhor no mercado, uma vez que vai reduzir a quantidade de fruta por causa da geada.
— Com o sistema a gente conseguiu salvar toda a produção. Tem uns galhos que ficaram para fora de onde atingia a água e as frutas estão todas queimadas naquele ponto. Como o aspersor de irrigação gira teve umas pontinhas que ficaram como um tipo de amostras para vermos o que ia acontecer. Se tivesse sem o anti-geada aquela área seria perdida.
Ainda segundo o produtor, a área que não tem o sistema foi atingida, mas ele projeta poucas perdas, especialmente, nas ameixeiras, porque os pomares ficam em locais mais altos. Contudo, se o fenômeno for registrado novamente, há riscos de perder parte da produção.