
Marisa Toigo da Costa, 60, auxiliar de cozinha no Sesc, também imaginava que ao chegar à idade da aposentadoria estaria mais tranquila financeiramente. Mas a realidade é que ela mantém as despesas da casa sozinha, porque o marido está desempregado. No início deste ano, ela e o marido resolveram fechar o restaurante que administravam, por causa da crise. Há oito meses, ela conseguiu essa vaga na cozinha do Sesc, mas o marido segue à procura de trabalho.
– Eu já encaminhei a minha aposentadoria, a advogada me disse que até o final do ano deve sair. Mas eu não vou poder deixar de trabalhar, porque vou receber apenas um salário mínimo de benefício – revela.
Marisa pensou que ao chegar o tempo da aposentadoria poderia descansar em sua casa própria. No entanto, um dos pontos que fará com que ela não deixe de trabalhar é justamente a moradia, porque uma das maiores despesas é o aluguel.
– Como vamos viver com um salário mínimo, em dois e com tantas despesas? – questiona.
A resposta é nada filosófica, mas pragmática: aposentada, mas trabalhando.

Panorama a respeito das mudanças
Aposentado que ainda trabalha contribui para a Previdência? Essa é uma das perguntas que a maioria tem receio de ouvir a resposta.
– Sim, todas as pessoas que trabalham são obrigadas a contribuir, mesmo que sejam aposentadas – afirma Anderson de Tomasi Ribeiro, advogado previdenciário.
No entanto, complementa Ribeiro, esse valor a mais investido na Previdência por pessoas que se aposentaram e seguem trabalhando com carteira assinada não pode ser utilizado para aumentar o rendimento. Esse recurso, chamado de “desaposentação”, foi barrado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
– A nossa seguridade social observa o modelo de repartição simples, de caráter obrigatório e contributivo, baseado no princípio da solidariedade. Ou seja, todos contribuem para as próximas gerações. Há algum tempo, tentamos entrar com o processo de desaposentação, para que, quanto mais tempo de contribuição houvesse, mais a pessoa pudesse ganhar. Mas não pode. O aposentado não pode usar isso como revisão da aposentadoria – explica.

Mas afinal de contas, o que vai mudar com as novas regras da aposentadoria no Brasil? Ribeiro divide a resposta em duas partes. Primeiro, com relação às pessoas que estão para se aposentar, seja por idade ou por tempo de contribuição. Quem estiver a até dois anos de se aposentar, quando da promulgação da PEC, deverá pagar uma espécie de pedágio.
– Por exemplo, terão de pagar um pedágio de 50% sobre o tempo de contribuição que falta, pelas regras atuais, para poder se aposentar. Ou seja, se faltar um ano para se aposentar, após a reforma será preciso trabalhar por mais seis meses para requerer o benefício – explica.
Um outro caso, mais particular, se refere às aposentadorias especiais. No caso, de enfermeiros, médicos, metalúrgicos ou eletricistas, entro outros, exemplifica Ribeiro. Ou seja, trabalhadores que comprovam pelo menos 25 anos de atividade em contato habitual e permanente com agentes perigosos ou que fazem mal a saúde.
– Na nossa região, há várias pessoas nessas situações. Porque muitos metalúrgicos, por exemplo, têm se aposentado, mas permanecem na mesma função. Se isso pode ou não, o STF vai decidir. Esse processo está no Supremo e saiu de pauta duas vezes já este ano. Não sabemos qual vai ser a posição do STF. Pode ser que venham a decidir pela ilegalidade da atividade e isso pode trazer sérias consequências para a região – observa.

Ribeiro chama a atenção para um outro detalhe importante. Uma das justificativas da reforma da Previdência é ajustar as contas e buscar um equilíbrio futuro. No entanto, a proposta de orçamento de 2020 contempla uma estimativa de déficit do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) de R$ 244,2 bilhões. Segundo o governo, a previsão para o ano que vem é de que as receitas do INSS somem R$ 438,489 bilhões e as despesas, R$ 682,689 bilhões. E para os anos seguintes esse déficit pode ser ainda maior. A explicação de Ribeiro é simples.
– O cálculo da reforma vai baixar os valores das aposentadorias. Então, as pessoas vão ganhar menos. Como o tempo mínimo de contribuição para a aposentadoria será, de modo geral, 15 anos (para mulheres) e 20 anos (para homens), assim que as pessoas alcançarem essa marca vão deixar de contribuir. O funcionário de uma empresa não poderá deixar de contribuir, mas quem é autônomo, pode ser que entenda que não terá vantagem se contribuir por mais anos do que o mínimo. Pode ser que isso ocorra, porque essa pessoa não vê perspectiva a curto prazo – sintetiza Ribeiro, que é advogado especialista em direito previdenciário.
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