Entre todas as coisas das quais mais sinto falta nesse momento de pandemia, os abraços estão em primeiro lugar. São eles que provocam reações neuronais de bem-estar, tranquilidade e equilíbrio, inclusive cardiovascular. Eles auxiliam e amplificam a sensação de prazer, e bastou que fôssemos privados deles para entender o quanto precisamos de toques consentidos em nossas vidas. Tenho saudades até de apertos de mãos, gesto que sempre tentei evitar por achar extremamente formal e impessoal.
Talvez por isso, uma das imagens que mais tenha me sensibilizado nesse período seja a da norte-americana Olivia Grant abraçando a avó, Mary Grace Sileo, depois de três meses de afastamento entre elas. O encontro em questão tem sido chamado de “abraço de plástico”, porque um material transparente enorme foi estendido num varal para que elas pudessem entrelaçar os braços, tocar o corpo uma da outra e ainda assim ter uma barreira quase invisível para evitar qualquer risco de contágio pela covid. A expressão de ambas, a busca pelo encaixe e a forma como as mãos envolvem os corpos são bem emocionantes.
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Lembro com carinho do movimento free hug, do qual participei em algum momento, que prometia abraços grátis pelas ruas, para qualquer pessoa que se dispusesse a dizer sim. Sempre achei curioso por que as pessoas abraçariam estranhos — e a interação era sempre linda e especial —, mas agora tudo parece fazer sentido. O abraço meio que nos constitui como sujeitos e costuma carregar uma carga de amor e afeto. E, possivelmente, alguns podem não ter essa sorte por perto.
Na etimologia, que é o estudo da origem das palavras, há a correlação entre abraço e amplexo, que podem ser tomados como sinônimos. Braço vem do latim brachium e é usado na anatomia básica; amplexo vem do latim amplexus, que se forma pelo sufixo ambi (ao redor), mais plectere (dobrar, entrelaçar). Abrir os braços é acolher, receber algo, disponibilizar-se. Plecto exprime a ação de enlaçamento, dobrar-se ao outro. Abraçar é trazer alguém para perto de nós, de forma indissociável, com troca de energia e compartilhamento da respiração e de batimentos cardíacos.
E é sempre é tão bom, né? Seja na pontinha dos pés, com a cabeça aninhada no peito ou com os braços em volta das espaldas alheias: está para nascer um gesto mais completo para expressar a felicidade e a gratidão de ter alguém querido por perto.
Se os abraços ainda não são uma realidade plena, que não nos falte a perspectiva, a vontade e as pessoas por quem desejamos encostar (e acalmar) nosso coração assim que isso tudo passar.
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